A Galeria da Biodiversidade – Centro Ciência Viva do Museu de História Natural e da Ciência da Universidade do Porto (MHNC-UP) acolhe, até ao próximo dia 27 de junhoPlant Data, um projeto colaborativo que envolve Mariana Sottomayor, professora de Biologia Celular da Faculdade de Ciências da U.Porto (FCUP) , o artista Yota Ayaan, o músico Stefaan Van Leuven, investigadores da Universidade de Ghent e mais de cem plantas.

É A floresta que teima em entrar na casa que foi de Sophia de Mello Breyner Andresen. A fazer lembrar o conto que herdou, precisamente, esse nome. Se visse agora este grande átrio, Isabel, a protagonista, já não precisava de ir para o jardim, procurar árvores e raízes para construir uma casa para anões. Seria tão mais fácil. As arvores estão, agora, cá dentro e a sua madeira é muito apreciada pela resistência e elasticidade. Costuma ser utilizada na marcenaria e até no fabrico de instrumentos musicais. Agora, é destes ramos que resulta a música que ouvimos, mal colocamos um pé no átrio da Galeria da Biodiversidade. E a música vai aumentando de volume, à medida que nos aproximamos das horas da tarde. Quer saber porquê?

Estas árvores não são provenientes do Jardim Botânico da Universidade do Porto. Vêm das margens dos rios, estes Freixos que se erguem em direção à luz da claraboia, contornando o esqueleto da baleia que o mar salgado deu à costa e que foi também desaguar a outro conto da escritora que aqui viveu. Mas que diálogo é este, então, que os Freixos estabelecem com a água e os raios de luz?

O impacto da falta de água nas plantas

Foi num dia de imenso calor que fomos encontrar Mariana Sottomayor a regar mais de uma centena de vasos desta planta nativa do território português. A professora de Biologia Celular da FCUP, e investigadora em Biologia de Plantas no CIBIO – Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos da U.Porto, explica que o Plant Data é um projeto que “interpreta dados, obtidos das plantas, em som”.

Os dados de emissão de ultrassons por freixos são provenientes de um grupo de investigadores da Universidade de Ghent “que tem equipamento de última geração e é um dos expoentes máximos no estudo dos ultrassons emitidos por plantas”. Estes ultrassons são, na verdade, explica a investigadora, originados por “embolismos” que ocorrem nos “vasos condutores da água”. Ou seja, quando há “embolismos”, originados pelo surgimento de “bolhinhas de ar que se acumulam e que podem bloquear os vasos”, ocorre também a “emissão de ultrassons”.

O objetivo desta investigação é estudar o impacto da falta de água na sobrevivência da planta. “Perceber como é que a planta resiste à seca, como recupera e como faz a condução da água”. E o que ouvimos aqui, explica a professora é “um processo que ocorre continuamente”. Esses fenómenos “de ocorrência de embolias nos vasos condutores da água ocorrem continuamente”, a grande questão científica que se coloca é: “se serão, ou não, reversíveis”, concluiu.

O diário de uma planta

Mariana Sottomayor explica que “a subida da água nas plantas tem a ver com a luz. A planta só abre os seus estomas (pequenas aberturas ou poros) nas folhas quando há luz, e é essa abertura dos estomas que vai levar à transpiração da água. Tudo está relacionado com a luz”.

O que podemos ouvir no átrio da Galeria da Biodiversidade é o ciclo de vida, ou, como nos diz a investigadora, “o diário de uma planta”. Se, durante a noite, “a condução da água é muito baixa”, durante o dia, e à medida que o sol vai ficando mais forte, “há mais evaporação de água nas folhas, há mais subida de água nos vasos condutores e há mais fenómenos desses que acontecem”. Daí que o som, da parte da tarde, quando o sol está bem alto, seja bem mais intenso. Vai diminuindo com o final do dia.

Neste projeto em que arte e ciência se contagiam, os dados foram facilitados ao artista neozelandês  Yota AYaan que, no âmbito de uma residência artística, e com a ajuda do músico Stefaan Van Leuven, os transformou em sons. Foi ele quem escolheu as plantas que crescem junto aos rios para este projeto, precisamente porque “os dados utilizados para esta experiência foram medidos em freixos”.

Agora resta “perder-se” nesta Floresta que, graças a um sistema de altifalantes colocado entre as plantas, vibra, vinte e quatro horas por dia, tendo por base dados numéricos obtidos das “emissões acústicas” de freixos, ou, dito de outra forma, no diário de uma planta.

O espírito das plantas

Não se esqueça de espreitar, numa das salas contíguas, o Plant Spirit. Trata-se de uma instalação multimédia que se assemelha a um qualquer escritório, que se tem em casa, mas dentro de uma estrutura de estufa. Fique para assistir aos vídeo. Vai ouvir quatro palestras realizadas em zoom que oferecem histórias pessoais e introspeções do ancião sundance Miguel Riveira, da investigadora e ecóloga evolutiva Monica Gagliano, do curandeiro e xamã Mark Jensen e da escultora e ativista alimentar indígena Roxanne Swentzell.

Pode visitar o novo “jardim” do  átrio da Galeria da Biodiversidade de terça-feira a domingo, das 10h00 às 13h00 e das 14h00 às 18h00 (último acesso: 17h30).

A entrada é gratuita e limitada à lotação do espaço.