Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), foi uma das instituições com mais projetos aprovados – cinco – na segunda edição da iniciativa “RESEARCH 4 COVID-19”, a linha de financiamento criada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) para apoiar projetos de I&D capazes de melhorar a resposta dos sistemas de saúde nacionais ao impacto da COVID-19.

As soluções propostas pelo i3S incluem a identificação dos marcadores genéticos que predispõem a suscetibilidade dos seres humanos à infeção pelo SARS-CoV-2, a identificação precoce dos doentes em maior risco, com base no seu perfil de ferro, até ao desenvolvimento de um novo estudo sorológico para detetar anticorpos específicos para o SARS-CoV-2.

O “bolo” de cerca de 186 mil euros de financiamento será ainda aplicado em projetos para avaliar o impacto do novo coronavírus em doentes com cancro e para tentar perceber se o mesmo está associado a disfunções na glândula tiróide (hipotiroidismo).

Risco de infeção elevado ou baixo?

Entre os trabalhos apoiados pela FCT inclui-se o da investigadora Luísa Pereira, que foi financiada com 40 mil euros para desenvolver o «Estudo genómico de associação para avaliar a susceptibilidade humana à infeção por SARS-CoV-2, com vista à implementação de um score de risco poligénico».

Neste projeto, que tem como parceiro a ARS Norte, “vamos identificar marcadores genéticos que predispõem os seres humanos a serem suscetiveis ou resistentes à infeção pelo SARS-CoV-2. Para tal, vamos caracterizar um array contendo um milhão de marcadores genéticos em mil indivíduos do Norte de Portugal com confirmação molecular positiva de infeção, versus mil pessoas do Norte de Portugal com confirmação molecular negativa de infeção (mas que estiveram em risco de contágio direto)”, explica a investigadora.

A identificação de marcadores genéticos (na ordem das dezenas), sublinha Luísa Pereira, “permitirá o estabelecimento de uma ferramenta de previsão de risco poligénico para Covid-19, a ser usada no futuro para identificar indivíduos com risco elevado ou baixo de infeção”.

Detetar anticorpos anti-SARS-CoV-2

Financiado em 37.500 euros, e a ser desenvolvido em parceria com o Banco de Sangue do Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia| Espinho (CHVNG/E), o Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra (CHUC) e o Instituto de Saúde Publica da Universidade do Porto (ISPUP), o projeto liderado pela investigadora Anabela Cordeiro da Silva denomina-se «Combinação de perfil serológico e de citocinas para avaliação da exposição a SARS-CoV-2».

Os estudos sorológicos para detetar anticorpos específicos para SARS-CoV-2 são ferramentas essenciais para estimar o número real de infeções e a possibilidade de imunidade, por isso, explica a líder do grupo “Parasite Disease”, “propomo-nos realizar um estudo de soroprevalência no banco de sangue com deteção de anticorpos anti-SARS-CoV-2 por ELISA usando um protocolo publicado pelo Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos”.

Além disso, acrescenta Anabela Cordeiro da Silva, “o perfil de citocinas produzidas pelas células do sangue periférico quando reestimuladas com vários péptidos da proteína Spike do SARS-CoV-2 será realizado em pacientes com sorologia duvidosa como abordagem complementar para exposição viral. O perfil obtido será comparado com o de pacientes que foram infetados e recuperaram (tanto sintomáticos como assintomáticos )”.

Impacto no tratamento do cancro

O investigador Fernando Schmitt, por seu lado, vai estudar o «Impacto do Covid-19 no tratamento dos doentes com cancro», tendo sido financiado pela FCT com 38.600 euros.

Sabemos que o SARS-CoV 2 infeta as células humanas através do recetor ACE, presente na membrana célular, e que a interação entre o vírus e este recetor é um fator potencial da sua capacidade infeciosa. Sabemos também que este recetor ACE está sobre-expresso em diferentes tipos de cancro, por isso, o nosso objetivo é avaliar a possibilidade do vírus infetar diretamente células neoplásicas usando este mesmo recetor e alterar a biologia da célula neoplásica”, explica.

“Como já demonstrado para outros vírus, a presença do Covid-19 pode modificar características relevantes das células tumorais com possível impacto nas opções terapêuticas”, sublinha ainda Fernando Schmitt.

Para este estudo da expressão do vírus, do seu recetor e das proteínas que podem contribuir para esta interação serão analisados vários casos de neoplasias que foram operadas em doentes infetados pelo Covid-19. O investigador do i3S vai trabalhar em colaboração com o Centro Hospitalar Universitário de São João (Porto), a Universidade de São Paulo (Brasil) e a Universidade de Trakya (Turquia).

Prever a gravidade com base no perfil de ferro

«Ironing COVID-19 – Procurando no perfil de ferro do indivíduo uma assinatura para prever a gravidade da doença» é o nome do projeto liderado por Maria Salomé Gomes, em colaboração com o ICBAS e o Centro Hospitalar Universitário São João.  Segundo explica a investigadora, “a gravidade da COVID-19 é altamente variável e claramente relacionada com o estado de saúde prévio do indivíduo afetado. Além disso, o metabolismo do ferro é crítico para a progressão das doenças infecciosas em geral, pelo que será de admitir que também tenha um papel importante na progressão da infeção por SARS-CoV-2”.

Neste projeto, que obteve um financiamento de 30 mil euros, a equipa irá “analisar amostras de sangue colhidas dos doentes de COVID-19 no momento do diagnóstico, verificar marcadores relacionados com o metabolismo do ferro, e depois acompanhar a progressão da doença e a sua relação com o ferro.” O objetivo, sustenta Maria Salomé Gomes, “será identificar marcadores que possam posteriormente ser usados noutros doentes como preditores da gravidade da doença. Dessa forma, o projeto contribuirá para uma identificação precoce dos doentes em maior risco e para uma melhor gestão dos recursos disponíveis para o seu tratamento eficaz”.

Para além disso, o projeto “fornecerá informação fundamental para melhor compreendermos o papel do ferro na interação entre SARS-CoV e os indivíduos infetados”.

O SARS-CoV-2 e a tireoide

No projeto liderado por Paula Soares, denominado «A glândula tireoide é alvo da infeção por SARS-CoV-2? Identificação precoce e acompanhamento da disfunção tireoideia em pacientes com COVID-19», a equipa de investigadores vai utilizar o financiamento da FCT, no valor de 40 mil euros, para investigar se as células da tireoide são suscetíveis à infeção por SARS-CoV-2, induzindo lesões celulares que resultam em hipotireoidismo nos doentes recuperados de Covid-19.

Para isso, explica a investigadora, “propomos o seguimento de doentes recuperados de Covid-19, avaliando os níveis de T3, T4, TSH e calcitonina, para determinar se há alguma indicação de disfunção da tireoide (participação do Centro Hospitalar Universitário S. João e Centro Hospitalar Lisboa-Norte).

Para este projeto, acrescenta Paula Soares, estabelecemos também uma colaboração com o Hospital de São Paulo, Brasil, e o Centro Hospitalar Universitário São João, que nos permitirá estudar uma série única de tireoides de autópsia de doentes infetados com SARS-CoV-2, e com a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto para estudar as alterações tecidulares e celulares e caracterizar a resposta imune».

No total, esta segunda edição da iniciativa RESEARCH 4 COVID-19 distinguiu 55 projetos, 12 dos quais liderados por investigadores da Universidade do Porto .