Começou a participar em missões humanitárias aos 19 anos, ainda enquanto estudante de Engenharia Mecânica da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e membro – fundador – do G.A.S. Porto -, a “escola” onde diz ter aprendido “a olhar para o mundo com mais amor”. Mas seria o convite para integrar a maior organização humanitária do mundo ligada ao combate à fome – o World Food Programme (WFP) da Organização das Nações Unidas (ONU) –  que levaria Sérgio Guedes Silva a mudar-se para Roma há mais de uma década.

Licenciado e mestre pela FEUP,  já participou ativamente em mais de três dezenas de missões de apoio a crises humanitárias em países como Moçambique, Síria, Sudão do Sul e Etiópia. Pelo caminho, contribuiu para duas conquistas importantes do WFP: o Prémio Nobel da Paz, em 2020, e, já em 2021, o Prémio Franz Edelman, o mais importante galardão do mundo na área de análise avançada, pesquisa e otimização de operações e ciências de gestão.

Mas o prémios que movem Sérgio Guedes Silva são outros: “Em mais de 30 missões que fiz nos últimos 20 anos, aprendo sempre a compreender melhor o mundo. Cada missão transformou-me sempre um bocadinho. Estou muito grato por cada oportunidade de servir”, diz o também membro do Conselho Geral da U.Porto.

A viver na capital italiana há mais de uma década, Sérgio Guedes Silva elogia “a cultura, a beleza natural, a história que se sente em cada rua” de uma cidade que convida a “simplesmente saborear”. Argumentos que não minimizam as saudades que sente “do nosso querido Porto”.

Sérgio Guedes Silva, que o responsável pela equipa de planeamento estratégico e otimização no departamento operacional do WFP. (Foto: DR)

– Como surgiu esta oportunidade de trabalhar no WFP?

Surgiu com um estágio, quando terminava o mestrado em Engenharia Mecânica na FEUP (com sub-especialização em gestão industrial), onde procurei aplicar os conhecimentos de engenharia e gestão na área humanitária. Era um projeto experimental, para propor formas de otimizar as operações da World Food Program (WFP). Perante os resultados fui convidado a ficar e aqui estou. De um projeto, passou a unidade e é agora uma “especialidade” dentro da WFP.

– Participou já em missões humanitárias em locais como Cabo Verde, Timor-Leste, Uganda, Etiópia, Bangladesh e mais recentemente na Síria e Mocambique. Principais experiências neste tipo de missão?

As minhas primeiras missões foram pelo Grupo de Ação Social do Porto  – o GASPorto. Aí aprendi o que sei hoje sobre servir. O GASPorto é uma escola que nos ensina a olhar para o mundo com mais amor. Aprendi a importância das pessoas. Que tudo o que fazemos é para elas e com elas. Aprendi o que significa servir com qualidade e com a paixão. É esta paixão que ainda tenho hoje. Com a WFP, as minhas missões foram sempre mais técnicas. Trata-se de chegar, analisar, e melhorar. Tudo muito intenso e em grande escala. Às vezes fico mais tempo como na crise dos refugiados no Bangladesh ou nas cheias de Moçambique. E aí tenho mais tempo para estar com as pessoas o que traz uma experiência diferente. Em mais de 30 missões que fiz nos últimos 20 anos (sim, comecei com 19 anos), aprendo sempre a compreender melhor o mundo. Cada missão transformou-me sempre um bocadinho. Estou muito grato por cada oportunidade de servir.

O alumnus da FEUP já participou em mais de 30 missões nos últimos 20 anos. (Foto: DR)

– De que forma a Universidade do Porto teve impacto neste processo?

A Universidade do Porto, e em particular a Faculdade de Engenharia, foram e são algo marcante na minha vida.  Temos uma cultura (de universidade e de cidade) de raça, de garra. Uma raça que é de trabalho, inteligência e paixão. A Faculdade, pela exigência que tem, ajudou-me a crescer, a ser estruturado e a estar mais preparado para lidar com pressão e exigência ao mais alto nível. Deu-me também conhecimento técnico. Mas acima de tudo, aquilo que nos distingue, é o equilíbrio que temos entre qualidade técnica e atitude. E isso é algo que me faz ter muito orgulho no Porto, na FEUP e na nossa universidade de forma geral.

– O que o motivou a ir para fora? 

Preferia estar quase sempre em Portugal. Divido muito o meu tempo entre Portugal, Roma e outros sítios de missão. O estar fora, surge simplesmente porque temos que trabalhar com pessoas que estão noutros locais, ou porque temos trabalho a fazer nesses sítios. Temos que ir estando onde é mais preciso…

– Há quanto tempo está fora de Portugal?

A primeira missão que fiz, tinha 19 anos. Desde aí, tenho feito missões todos os anos. O ter “casa” fora de Portugal começou em 2008.

– Como foi a adaptação a Roma?

Foi ótima, tirando as saudades da família e do GASPorto. Somos muito parecidos enquanto povo. Mas quando estou em Roma, há duas realidades: a cidade, Roma, a cultura e o povo de Roma, mas depois há o trabalho, em que temos pessoas de todos os países do mundo. Na minha equipa, por exemplo, temos mais de 15 nacionalidades diferentes. E isso é uma riqueza mesmo muito grande.

– O que gosta mais na cidade? E menos?

Mais, é a cultura, a beleza natural da cidade, a história que se sente em cada rua. A arte, a comida, o vinho, a paixão e vida que existe na cidade e nas pessoas. O menos, a desorganização e a limpeza.

– Um conselho para quem visita Roma?

Simplesmente saborear. Andar pelas ruas e sentir cada pormenor. Sentir a cidade, as pessoas, o cheiro de uma pizza ou de um café na rua, o sabor de um gelado italiano, os costumes dos italianos num domingo de manhã num bairro típico.

– De que sente mais falta? Pensa em voltar a Portugal?

Sinto falta de estar com mais calma em casa, do nosso querido Porto, de estar a 100% com a família, com o GASPorto e amigos.