Nota: Por motivos relacionados com as condições atmosféricas, a exposição não ficará patente a partir do dia 28 de setembro, conforme inicialmente anunciado. O dia e hora da inauguração serão brevemente anunciados.

Ouvimos falar de doações e doadores. Quem são e o que fazem chegar até nós? O que fazemos com as doações? Maravilhário é uma exposição de fotografia com histórias para contar. Mais concretamente, são 22 histórias, entre tantas outras, de pessoas e objetos que contribuíram para que o Museu de História Natural e da Ciência da Universidade do Porto (MHNC-UP) seja o que hoje é.

Até 4 de dezembro, quem passar pelo Campo Mártires da Pátria (ao Jardim da Cordoaria), junto à entrada para o Polo Central do MHNC-UP, irá então deparar-se com esta exposição fotográfica que celebra e reconhece o ato de doar como peça fundamental na construção, consolidação e ampliação do património da Universidade, nomeadamente do acervo museológico e das coleções do MHNC-UP.

A seleção de 22 objetos  foi feita de um universo de: 160 000 insetos; 1650 objetos etnográficos; 1550 objetos arqueológicos; 198 mamíferos; 1150 fósseis; 300 rochas e minerais; 39000 espécimes de herbário. Na base da escolha estiveram a curiosidade da história, a raridade do objeto, e a forma como chegou até ao Museu.

Da Anacã  ao Macaco Nu

A lantejoula azul, laranja ou verde fica a flamejar na memória muito depois da porta se fechar. Talvez até voe nos sonhos. É um palmo de luz e cor que nos faz parar. Falamos da Anacã (Deroptyus accipitrinus) e do galo-da-serra (Rupicola rupícola). Chegaram até nós em 1928. A coleção foi organizada por José Teixeira da Silva Braga Júnior (1844?-1904), Vice-Cônsul do Brasil no Porto e associado provincial da Academia Real das Ciências de Lisboa.

Inicialmente, estima-se, a coleção incluiria 3800 aves e ninhos, mais de 45000 invertebrados, 120 mamíferos, 20 répteis, 5 peixes e 300 minerais.

Para além das aves, o MHNC-UP guarda ainda insetos (borboletas e escaravelhos sul-americanos), mamíferos, répteis e minerais. A doação foi feita por familiares.

A Anacã (Deroptyus accipitrinus) e o galo-da-serra (Rupicola rupícola) foram cedidos à U.Porto há quase um século, por familiares de José Teixeira da Silva Braga Júnior. (Foto: U.Porto)

Comungam da leveza. Partilham da impermanência a roçar a fantasia do que não pertence ao “mundo real”. No Maravilhário, é possível apreciar de perto a beleza efémera de uma Callimorpha dominula, fêmea, adulta, com cerca de quatro centímetros de comprimento.

Esta é apenas uma das mais de 25 000 exemplares de borboletas diurnas e noturnas de Portugal continental que integram o espólio do Museu. A estas juntam-se ainda algumas centenas de exemplares de outras proveniências, nomeadamente África, América e Ásia.

A coleção foi constituída por Maria Amélia Chambers de Sousa da Silva Cruz (1896-1978) e doada pelos seus herdeiros na década de 1980.

A “Callimorpha dominula” integra a coleção doada ao MHNC-UP pelos herdeiros de Maria Amélia Chambers de Sousa da Silva Cruz. (Foto: U.Porto)

Agora mudamos de escala. Era um macho, media 13,80 m do focinho até à cauda. Desviado do seu habitat natural, o “monstro marinho” veio dar à costa a, sensivelmente, cinco quilómetros de Leixões, mais precisamente à Praia do Paraíso, em Matosinhos.

Em 19 de novembro de 1937, milhares de pessoas puderam admirar o monstro na praia, alguns munidos de folhas de eucalipto para melhor poderem suportar o cheiro do animal já em putrefação. “Não há memória de uma coisa assim” dizem os jornais da época. Arrematou o baleote o Sr. A. Abecassis para aproveitamento industrial do óleo e restantes despojos. Compreendendo o interesse já manifestado, prontamente doou o esqueleto do animal ao Instituto de Zoologia “Dr. Augusto Nobre”, da Faculdade de Ciências da U.Porto (FCUP).

O esqueleto foi originalmente montado, em 1941, na Sala das Coleções Gerais do Museu, ao edifício histórico da Reitoria, até depois, passar para o sitio onde se encontra hoje, na Galeria da Biodiversidade – Centro de Ciência Viva. Materializava-se assim o desejo de Sophia de Mello Breyner Andresen que, no conto A Saga, em Histórias da Terra e do Mar,  imagina que no átrio desta casa se poderia armar o esqueleto da baleia que pertencia ao Instituto de Zoologia. Em maio de 2016, a “estrela” da Galeria da Biodiversidade ficou acessível a todos.

Balaenoptera da Praia da Paraíso, esqueleto de baleia, Galeria da Biodiversidade

O esqueleto de baleia que dá as boas-vindas à Galeria da Biodiversidade também está ilustrado no Maravilhário. (Foto: U.Porto)

Da baleia damos a mão ao macaco e um salto de 30 anos para a frente. Se a anterior doação chegou em forma de esqueleto, este vem nu. De que falamos? Do dactiloscrito de O Macaco Nu (The Naked Ape), escrito em 1967 pelo zoólogo, etólogo e pintor surrealista inglês Desmond Morris.

A obra, listada no top 100 dos livros mais vendidos de sempre, é uma nova forma de olhar o animal humano. Permite-nos, por exemplo, ver alguém que trabalha na bolsa de Wall Street como se de um macaco com gravata se tratasse.

O livro foi reeditado em português pelo MHNC-UP (Arte e Ciência), em 2018, e está integrado no seu vasto arquivo científico, juntamente com registos e notas de investigação, correspondência, coleções de revistas científicas, todos os seus livros publicados, artigos científicos, coleções de fotografias e de negativos, e gravações vídeo e áudio, doado integralmente ao MHNC-UP em 2014.

Em 1956, como chefe da Unidade de Cinema e TV Granada da Sociedade Zoológica de Londres, Desmond Morris estudou as habilidades dos macacos para fazerem filmes, criou programas para cinema e televisão sobre comportamento animal e apresentou o programa semanal Zoo Time da Granada TV até 1959, com 500 programas e 100 episódios do programa Life in the Animal World para a BBC. Em 2014, Desmond Morris doou ainda ao MHNC-UP o seu arquivo científico.

Dactiloscrito de “O Macaco Nu” (The Naked Ape), escrito em 1967 pelo zoólogo, etólogo e pintor surrealista inglês Desmond Morris. (Foto: U.Porto)

Um Museu em crescimento

Esta é uma ínfima fração da diversidade de doações que o MHNC-UP tem recebido. O crescimento do património do MHNC-UP faz-se através de doações de objetos e coleções privadas, mas também de coleções de instituições de ensino, investigação ou outras, tantas vezes decorrentes de colheitas feitas no contexto de expedições e trabalho de investigação.

São ainda relevantes as incorporações realizadas diretamente pelos membros da equipa do MHNC-UP, transferências feitas por outros museus e mesmo pelo Estado.

O Maravilhário é inaugurado às 18h00 do dia 28 de setembro. Depois disso, pode ser visitado até 4 de dezembro de 2022, no Campo dos Mártires da Pátria, junto à entrada para o MHNC-UP.

As reservas do Museu de História Natural e da Ciência também estão abertas para visitas. Mais informações aqui.