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Segundo o estudo da FDUP, em metade dos casos de homicídio conjugal em Portugal existiam já registos de violência doméstica entre o casal.

Em metade dos casos de homicídios conjugais ocorridos em Portugal existiam já registos de violência anterior e continuada entre agressor e vítima. Esta é uma das principais conclusões retiradas do livro “Homicídios Conjugais: Estudo Avaliativo das Decisões Judiciais”, apresentado publicamente na Faculdade de Direito da Universidade do Porto (FDUP) no dia 14 de junho.

A obra tem por base um estudo realizado por investigadores da Escola de Criminologia da FDUP – no âmbito do V Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência Doméstica e de Género elaborado pela Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género –, que analisou 197 decisões judiciais proferidas em Portugal entre 2007 e 2012 sobre homicídios, consumados e tentados, em que o/a agressor/a é cônjuge, companheiro/a ou vivia em alguma outra situação de intimidade relacional com a vítima.

Com base na análise das decisões, o estudo conclui que cerca de 90% das vítimas são mulheres, mantendo-se a relação no momento da prática do crime em cerca de metade das situações, a qual ocorre com particular incidência nos primeiros anos da relação de proximidade. As motivações imediatas e os fatores que despoletam os delitos são diversos, sendo no entanto, de destacar a não-aceitação do fim da relação como motivo mais apontado (39,4%). A premeditação acontece em aproximadamente um quarto dos casos. Em 85%, existiam filhos, metade dos quais em regime de coabitação.

As decisões foram proferidas, em mais de metade dos processos, em menos de um ano. O homicídio consumado foi punido com uma pena média de 18 anos e meio, quando qualificado, e em cerca de 11 anos na sua forma simples. Quanto à tentativa, o delito simples foi sancionado, em média, com privação de liberdade de 4 anos e meio, ainda que em metade deles exista suspensão da pena. No homicídio qualificado tentado, a pena média foi de 6 anos e meio.

As medidas sancionatórias são tendencialmente inferiores para as mulheres, significativamente maiores na presença de violência anterior e de premeditação, mas não variam, na substância, com a idade dos condenados, nem em função da situação de coabitação, da existência de filhos/as em tal estado, ou do tempo de duração da relação de proximidade.

Tendo em conta os dados apurados, a equipa coordenada por Cândido Agra que teve como investigadores principais Jorge Quintas, Pedro Sousa e André Lamas Leite, elaborou um conjunto de recomendações com vista à promoção da investigação e intervenção criminológicas, e da intervenção do sistema de justiça e das restantes instituições sobre o fenómeno do homicídio em contexto conjugal.

Do ponto de vista político-criminal, os autores não verificam a necessidade de uma sensível alteração dos quadros penal e processual penal vigentes, nem a criação de um tipo legal de crime autónomo, ao invés do que sucede em alguns países da América Latina.

Porém, tendo em conta o facto de em cerca de metade destes casos existir um histórico de violência anterior ao homicídio, os investigadores da FDUP recomendam uma urgente melhoria das condições de prevenção e repressão da violência doméstica e uma especial atenção do sistema de justiça, do sistema de saúde e das redes de apoio às vítimas de violência doméstica.

Na opinião dos autores, este estudo vem demonstrar a necessidade de os magistrados e os órgãos de polícia criminal continuarem a desenvolver esforços de acompanhamento dos processos de violência doméstica denunciados, nomeadamente no que concerne, quando aplicável, às medidas de coação processual de afastamento do instigador, fomentando-se ainda a apresentação de queixa por parte de outras vítimas e, sempre que necessário, a promoção do tratamento do agressor.