São estudos promissores no combate ao cancro e vão ser liderados, ao longo do próximo ano, por jovens investigadoras da Universidade do Porto. É esse o traço comum a cinco dos 13 projetos distinguidos este an0 com as bolsas de investigação científica em oncologia atribuídas pela Liga Portuguesa Contra o Cancro – Núcleo Regional do Norte (LPCC-NRN).

Destinadas a jovens investigadores de instituições científicas da Região Norte, estas bolsas têm como objetivo apoiar projetos de investigação inovadores na área da oncologia, através de um financiamento individual de 12 mil euros. Do “bolo” total de 156 mil euros atribuídos pela LPCC-NRR, 60 mil servirão assim para financiar projetos da U.Porto.

Dos projetos distinguidos, três estão sediados no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da U.Porto (i3S). Dois deles, liderados por Catarina Esquível e Inês Sousa Conde, focam-se em cancro da mama metastático, e o terceiro, que será desenvolvido pela investigadora Nicole Viveiros, em cancro hepatocelular.

As restantes bolsas foram atribuídas a Joana Loureiro, investigadora do LAQV/REQUIMTE e estudante de doutoramento da Faculdade de Farmácia da U.Porto (FFUP), e a Júlia Gomes, investigadora da Unidade Multidisciplinar de Investigação Biomédica, do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (UMIB-ICBAS), e vão apoiar os respetivos trabalhos nas áreas do cancro pancreático e cancro do pulmão.

Estudar a agressividade do cancro da mama

A Transição Epitélio-Mesenquimal (EMT) é o processo através do qual as células neoplásicas perdem características epiteliais (E) e adquirem caraterísticas mesenquimais (M), contribuindo para a progressão e agressividade do tumor. Atualmente, sabe-se que as células tumorais em circulação de doentes com cancro da mama avançado mantêm essas duas características – epiteliais e mesenquimais – e que é isso que lhes confere uma maior agressividade e um pior prognóstico para as doentes. A investigadora Catarina Esquível pretende estudar este processo de transição de células tumorais, nomeadamente avaliar a influência da molécula de adesão celular P-caderina, associada a mau prognóstico, metastização e resistência à terapia em doentes com cancro da mama.

O projeto, que será desenvolvido no grupo «Cancer Metastasis» do i3S, liderado por Joana Paredes, tem também como objetivos perceber se a adesão entre células tumorais mediada pela P-caderina promove e estabiliza a presença simultânea de características epiteliais e mesenquimais em células de cancro da mama e avaliar o potencial valor diagnóstico da expressão da P-caderina na deteção de células tumorais em circulação.

“Ver o meu trabalho reconhecido pela Liga Portuguesa Contra o Cancro foi, sem dúvida, um dos momentos mais marcantes para mim profissionalmente. Ter a oportunidade de trabalhar no que gosto e na área onde me imagino a continuar no futuro é um sonho tornado realidade”, sustenta Catarina Esquível. Além disso, acrescenta, “é muito gratificante ver que grandes nomes desta área acreditam no meu trabalho e no seu potencial”.

Um biomarcador de células estaminais de cancro

A proposta apresentada por Inês Sousa Conde, também do grupo Cancer Metastasis, centra-se no cancro da mama metastático, mais especificamente na identificação de biomarcadores associados às propriedades estaminais das células tumorais que possam ser traduzidos para a clínica como fatores de prognóstico ou alvos terapêuticos.

O objetivo deste trabalho, nas palavras da investigadora, “consiste em avaliar o potencial de uma proteína já identificada pelo nosso grupo como um biomarcador de estaminalidade associado a cancro da mama metastático. Para isso, vamos avaliar de que forma a inibição desta proteína afeta as propriedades estaminais de células de cancro da mama metastáticas e estudar a associação deste biomarcador com a progressão tumoral”.

Para a jovem investigador, a atribuição desta bolsa “foi, sem dúvida, algo marcante na minha carreira como investigadora, porque representa o reconhecimento do esforço e do trabalho desenvolvido.  O facto de ser o segundo ano que recebo esta bolsa motiva-me para trabalhar mais e melhor todos os dias. Deixa-me muito feliz perceber que realmente acreditam no potencial deste projeto e na importância que ele poderá representar no futuro para as doentes com cancro da mama metastático”, conclui Inês Sousa COnde

O papel de uma proteína no carcinoma hepatocelular

Nicole Viveiros, que irá desenvolver o seu trabalho no grupo «Hematopoiesis and Microenvironments», liderado por Delfim Duarte, em colaboração com o grupo Basic & Clinical Research on Iron Biology (Tiago Duarte), pretende estudar o papel de uma proteína – FLVCR1 -no desenvolvimento do carcinoma hepatocelular, com recurso a modelos animais e celulares.

O projeto, explica, “pressupõe que as células malignas exploram o FLVCR, enquanto regulador de ferro no organismo, para promover a invasão e metastização, com severas implicações no prognóstico dos pacientes. A compreensão detalhada da função do FLVCR1 poderá abrir portas a potenciais novas terapias para os doentes com carcinoma hepatocelular”.

Para a investigadora, a bolsa atribuída pela LPCC representa “um forte incentivo para o desenvolvimento deste trabalho”, mas também “um importante reconhecimento público do valor do nosso projeto”. Receber este apoio, acrescenta, “é uma honra e uma oportunidade para ganhar experiência na área em que pretendo desenvolver a minha carreira científica, com a ambição de contribuir para a melhoria das perspetivas terapêuticas dos doentes oncológicos”.

Catarina Esquível, Inês Sousa Conde e Nicole Viveiro com o presidente da LPCC-NRN, Vítor Veloso. (Foto: DR)

Novas  terapêuticas para o cancro do pulmão

Já o trabalho que Júlia Gomes vai conduzir nos laboratórios da UMIB-ICBAS tem como objetivo avaliar o efeito imunoterapêutico de dois medicamentos – o Nivolumab e o Pembrolizumab – no desenvolvimento do cancro do pulmão, uma das doenças mais incidentes e mortais a nível global.

“O trabalho foca-se, essencialmente, em avaliar o efeito de dois agentes imuno-terapêuticos, tanto ao nível do microambiente tumoral como no desenvolvimento do cancro do pulmão. Estes fármacos têm mostrado, em vários estudos, respostas imunológicas anti-tumorais e, por isso, torna-se fundamental compreender as reações desencadeadas no tumor e no sistema imunológico do hospedeiro”, explica António Araújo, Professor Catedrático do ICBAS, Diretor do Serviço de Oncologia Médica no CHUP e orientador do projeto.

De futuro, espera-se que o projeto possa contribuir e fundamentar novas visões sobre o tratamento do cancro, em geral, e do cancro pulmão, em particular. “Continua a ser um grande desafio o tratamento destes doentes e, por essa razão, considera-se crucial a procura constante de biomarcadores passíveis de intervenção terapêutica e desenvolver o entendimento sobre as relações que se estabelecem entre o cancro, o seu microambiente, e o sistema imunológico do doente”, refere Júlia Gomes.

Para a investigadora, “ter ganho esta bolsa da Liga Portuguesa Contra o Cancro vem acrescentar novas oportunidades e trabalhar com uma área que estimo bastante. Sinto muita gratidão por ter sido umas das escolhidas e poder fazer parte de um grupo de jovens inovadores”.

Júlia Gomes (Foto: DR)

Um composto contra cancros muito resistentes

Por fim, Joana Loureiro (LAQV/REQUIMTE – FFUP) foi distinguida por um projeto que visa o estudo do potencial terapêutico de um composto – designado por BBIT20 – em tipos de cancro muito resistentes à terapêutica, como é exemplo o cancro pancreático.

“Desde o meu mestrado que o foco do meu trabalho científico passou por explorar estratégias farmacológicas alvo dirigidas para o tratamento do cancro”, destaca a jovem investigadora. A frequentar atualmente o 4º ano do Doutoramento em Ciências Farmacêuticas da FFUP, Joana tem focado o seu trabalho na “modulação farmacológica da proteína supressora tumoral p53 como estratégia de prevenção e tratamento para o cancro da pele”.

O projeto de Joana Loureiro será desenvolvido no seio do grupo de investigação coordenado por Lucília Saraiva (FFUP/LAQV/REQUIMTE), o qual se em destacado na “exploração de compostos que inibem a reparação de danos no DNA, nomeadamente através da inibição da recombinação homóloga, como uma estratégia terapêutica contra tumores de difícil tratamento”. Foi daí que resultou a identificação do composto BBIT20 como “o primeiro agente supressor da recombinação homóloga através da regulação da atividade da proteína BRCA1”.

Joana Loureiro (Foto: FFUP)