Equipa liderada por Helder Maiato conseguiu manipular reação que leva à morte de células cancerigenas.

O segredo está na manipulação genética de um pequeno componente de ligação de duas proteínas (PLK1 à CLASP2), que perturba a divisão das células tumorais, conduzindo à sua morte. A descoberta deste novo mecanismo de regulação molecular é assinada por uma equipa de investigadores do Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) da Universidade do Porto na última edição do Journal of Cell Biology e pode abrir novos caminhos no tratamento do cancro.

Para chegarem ao conjunto de imagens inéditas do fim de células cancerígenas imortais (porque, ao contrário das células normais, têm a capacidade de se dividir infinitamente), os investigadores utilizaram uma linha tumoral imortalizada – células Hela – que tem servido de modelo para muitos estudos desde 1951, ano em que foi isolada pela primeira vez. “Ao impedir a ligação destas proteínas, impedimos que ocorresse uma reação química simples de fosforilação da CLASP2 e o resultado é a morte das células afetadas”, explica Hélder Maiato, coordenador da equipa. “É interessante perceber que controlar uma simples reação de fosforilação pode levar a um evento tão dramático para uma célula”, acrescenta o investigador.

Células Hela em plena divisão. A azul os cromossomas, a verde a proteína alterada, a vermelho o fuso mitótico. Esta célula apresenta uma estrutura monopolar que impossibilitará a divisão e acabará por morrer

Apesar do modelo explicativo ser simples, impedir uma reação química num local tão específico da célula envolve grande complexidade técnica. Os investigadores tiveram que provar que ao impossibilitar a fosforilação da CLASP pela Plk1 o fuso mitótico bipolar, essencial à divisão das células, não podia ser mantido.

Segundo Rita Maia, primeira autora do artigo, “durante a divisão as células formam um fuso para garantir a distribuição igual do material genético entre as duas células filhas”, tratando-se de um processo “muito coordenado de forma a evitar a produção de erros genéticos, no qual a CLASP2 tem um papel fundamental”. Quando se impede a ligação da Plk1 à CLASP2 a coordenação do processo é afectada, compromete-se a estrutura bipolar do fuso, e as células simplesmente morrem. “Em vez de duas, nenhuma!”, adianta.

E é precisamente o momento de arranjo anómalo do fuso mitótico que se oferece às câmaras dos investigadores em imagens comparáveis a eventos da astronomia e do cosmos, como se vê na figura do lado. “Talvez as imagens sejam espetaculares para muitos mas, para nós, o mais importante são as perspectivas que este estudo abre”, afirma Hélder Maiato. Para a equipa envolvida, o grande avanço conseguido neste estudo é “a excitante possibilidade de administrar substratos da Plk1 geneticamente modificados, que conduzam à morte de células tumorais e possam ser usados como como alternativa terapêutica para certos cancros”.

Levar a descoberta do laboratório para o tratamento efetivo do cancro é por isso o grande  desafio que se coloca aos cientistas. Por enquanto, o estudo já permitiu a elaboração de um pedido de patente relativamente à administração de CLASP2 modificada com vista a fins terapêuticos.