Dois projetos de investigação liderados por cientistas do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), e direcionados para a melhoria do fabrico de vacinas contra a Covid-19 e para a proteção das mulheres de gravidezes não desejadas e da infeção pelo vírus VIH/SIDA, estão entre os vencedores da edição deste ano do Programa Gilead Génese, promovido pela GIlead Sciences, com o apoio do jornal Expresso.

O projeto «iCoV2PLUS – Increased Production Levels Universal Sequence in SARS-CoV-2 vaccines», coordenado pela investigadora Alexandra Moreira, tem como objetivo melhorar o processo de fabrico das vacinas de RNA e DNA contra as várias variantes do SARS-CoV-2, o vírus causador da Covid-19

Para a líder do grupo de investigação «Gene Regulation» do i3S e Investigadora Principal do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), o financiamento de 33 mil euros agora conquistado permitirá à equipa “fazer experiências de prova de conceito”. Para o efeito, adianta Alexandra Moreira, “vamos usar uma pequena sequência de nucleotidos não codificantes para aumentar a estabilidade do RNA nas vacinas de RNA, e aumentar a produção das vacinas de DNA recombinante, com grandes benefícios para a sociedade”.

Atualmente, “existem mais de 100 vacinas a serem desenvolvidas contra a Covid-19 e mais de 30 destas vacinas são de RNA ou DNA”. Mas “um dos principais desafios nas vacinas de RNA consiste em tornar o mRNA mais estável e nas vacinas de DNA é melhorar a eficiência da sua produção», explica Alexandra Moreira.

“Durante os últimos anos a nossa equipa dedicou-se a estudar o iPLUS, uma pequena sequência genética que faz aumentar a estabilidade do RNA e aumenta a produção de proteínas recombinantes. Estabelecemos também parcerias estratégicas industriais para mostrar que o iPLUS aumenta a produção de um anticorpo monoclonal utilizado em imunoterapia para tratar cancro”, sublinha.

Neste projeto, salienta a investigadora do i3S e do ICBAS, “vamos aplicar o iPLUS na melhoria da produção de vacinas de DNA e mRNA para a Covid-19 com o objetivo de contribuir para debelar a pandemia. Forneceremos a prova de conceito de que o iPLUS aumenta a estabilidade do mRNA e aumenta a produção da proteína Spike em cinco variantes virais: original (Wuhan-Hu-1), indiana (Delta), UK (Alfa), Manaus (Gamma) e África do Sul (Beta).

O objetivo final, garante Alexandra Moreira, “é melhorar o processo de fabrico das vacinas de RNA e DNA contra estas cinco variantes do vírus. O iCoV2PLUS terá, deste modo, um forte impacto na sociedade, porque pode diminuir os custos de produção e beneficiar a população em geral, e porque torna os processos industriais mais eficientes em conformidade com as boas práticas ambientais e diminui a pegada de carbono”.

A equipa de Alexandra Moreira (a 5.ª a contar da esq.) quer melhorar a produção de vacinas de DNA e mRNA para a Covid-19 “com o objetivo de contribuir para debelar a pandemia”. (Foto: i3S)

No início da pandemia, a equipa de Alexandra Moreira esteve ativamente envolvida na task-force do i3S para fazer testes de PCR, em colaboração com Hospitais e Centros de Saúde. Também por isso, ” foi uma honra receber o prémio do Programa Gilead Génese porque nos permite aplicar o nosso conhecimento para impulsionar a tecnologia de vacinas de RNA e DNA para várias variantes do SARS-CoV-2″, destaca a investigadora.

O Programa Gilead Génese, acrescenta ainda ALexandra Moreira, “é fundamental para o sucesso do nosso projeto, porque nos vai permitir comprar reagentes dispendiosos e fazer as experiências de prova de conceito, que não conseguiríamos fazer de outra forma. Ao mesmo tempo, permitirá traduzir o nosso conhecimento científico para as indústrias de vacinas de mRNA e de DNA, com benefício da sociedade em geral”.

Um novo DIU com dois fármacos para proteger as mulheres

Já o projeto «Duo-DIU» que foi distinguido pelo Programa Gilead Génese com 35 mil euros, é liderado por José das Neves, investigador no grupo «Nanomedicines & Translational Drug Delivery» do i3S, e “pretende desenvolver um novo medicamento profilático capaz de proteger as mulheres, de forma simultânea, da gravidez não planeada e da infeção pelo VIH-1”.

Estas situações, sublinha o investigador, constituem “duas das maiores preocupações das mulheres em termos de sexualidade e saúde». No entanto, nota José das Neves, o “desenvolvimento deste medicamento não é fácil. Apesar de altamente eficazes enquanto contracetivos, os dispositivos intrauterinos (vulgarmente conhecidos pela sigla DIU) de natureza hormonal disponíveis no mercado baseiam-se em tecnologias que apenas permitem a libertação de fármacos diretamente no útero e, em relação à infeção pelo VIH-1, sabe-se que alguns fármacos antiretrovirais são eficazes na proteção das mulheres contra a transmissão sexual do vírus, mas apenas quando diretamente administrados na vagina”.

Assim, o objetivo deste projeto passa por “desenvolver um novo DIU – denominado Duo-DIU – que contém dois fármacos: uma hormona anticoncecional (levonorgestrel) e um antiretroviral (dapivirina). A grande inovação prende-se com o seu design que permite que os fármacos sejam libertados simultaneamente e apenas no local anatómico onde são necessários”, aponta José das Neces.

De acordo com o investigador, o Duo-DIU será avaliado em laboratório quanto à sua capacidade para libertar os dois fármacos de forma prolongada (ao longo de pelo menos um ano). Para o efeito, “a libertação diferencial do levonorgestrel no útero e da dapivirina na vagina será aferida através da utilização de um dispositivo artificial que permite simular, em ambiente laboratorial, os espaços uterino e vaginal”.

O projeto durará dois anos e espera-se que os resultados obtidos sirvam de suporte para a realização dos primeiros ensaios clínicos. O Duo-DIU pretende ser um método cómodo (necessita apenas de colocação única com substituição anual), seguro e eficaz de proteger as mulheres da gravidez não planeada e da infeção pelo VIH-1.

O Duo-DIU desenvolvido pela equipa de José das Neves (o 2.ª a contar da esq.) pretende ser um método cómodo seguro e eficaz de prevenir, simultaneamente, as gravidezes indesejadas e o risco de infeção pelo vírus VIH/Sida. (Foto: i3S)

Para além da importância que o prémio monetário representa para a execução deste projeto em particular, «trata-se de mais um reconhecimento público da excelência do trabalho que temos vindo a desenvolver no i3S na área da prevenção da infeção pelo VIH/SIDA”, remata José das Neves.

No total, o Programa Gilead GÉNESE premiou este ano seis projetos de investigação e sete de intervenção comunitária. O evento público de distinção decorreu esta quarta-feira, 20 de outubro, no Salão Nobre da Reitoria da Universidade de Lisboa.

Sobre o Programa Gilead GÉNESE

Criado em 2013, o Programa Gilead GÉNESE tem como objetivos incentivar a investigação, a produção e a partilha de conhecimento científico e viabilizar iniciativas que conduzam à implementação de boas práticas no acompanhamento dos doentes.

À edição deste ano candidataram-se 72 projetos nacionais, 49 de investigação e 23 de intervenção comunitária, submetidos por diversas entidades da área da saúde, instituições académicas e da sociedade civil, representando um incremento significativo no número de candidaturas dos anos anteriores. Foram selecionados seis projetos de investigação e sete de intervenção comunitária.

“Na Gilead, temos a convicção de que o conhecimento gerado através dos projetos apoiados pelo Programa Gilead GÉNESE tem contribuído para a melhoria da prestação de cuidados de saúde em Portugal. É com muita satisfação que registamos o interesse crescente de um leque cada vez mais alargado de entidades, quer na vertente de investigação, quer na vertente de comunidade, que se distinguem pela qualidade dos projetos apresentados”, afirma Cláudia Delgado, Diretora Médica da Gilead e responsável pelo Programa.

Na sua componente Investigação, o Programa Gilead GÉNESE tem como áreas de projeto resultados em saúde, investigação com aplicação clínica e tecnologia ao serviço da saúde. Na vertente Comunidade, o Programa acolhe projetos nas áreas da qualidade de vida, diagnóstico e participação cívica e cidadania.