A investigadora Joana Xavier, investigadora do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR) participou recentemente numa expedição científica de um mês, realizada a bordo do navio de investigação RV Dr. Fridtjof Nansen no âmbito do programa EAF-Nansen, da Food and Agriculture Organization (FAO) das Nações Unidas, com a missão de estudar habitats de mar profundo ao largo da Serra Leoa.

A expedição organizada pela FAO em colaboração com o Institute of Marine Research (IMR) da Noruega, tinha como principal objetivo fornecer novos dados sobre os habitats de profundidade e a distribuição de ecossistemas marinhos vulneráveis num conjunto de montanhas submarinas ao largo da Serra Leoa. Entre estes ecossistemas estão agregações de esponjas, recifes ou jardins de corais, e campos de xenofióforos.

Tina Kutti, investigadora do IMR e líder da expedição, explica que “as montanhas submarinas da Elevação da Serra Leoa ainda não estavam mapeadas ou estudadas.” Assim, o objetivo primordial do estudo foi desenvolver uma base de conhecimento para melhorar a compreensão da biodiversidade dos ecossistemas oceânicos do Atlântico Central.

“O mapeamento dos montes submarinos nesta área pouco conhecida permitirá obter mais informações sobre as espécies que formam Ecossistemas Marinhos Vulneráveis, que é crucial para garantir o uso sustentável na região”, acrescenta.

A expedição, que terminou no passado dia 18 de fevereiro, contou com a participação de uma equipa multidisciplinar e internacional com investigadores e técnicos de sete países Europeus e da África ocidental (Cabo Verde, Senegal, Mauritânia, e Guiné, Portugal, Espanha e Noruega).     

“Como parte dos esforços de capacitação – o foco do Programa EAF-Nansen – os cientistas locais que participam nas expedições recebem formação na recolha e processamento de amostras e dados, e identificação de espécies.”, sublinha Tina Kutti.

As tecnologias utilizadas a bordo incluíram sondas multi-feixe de alta resolução, um sistema de amostragem vídeo-assistida remotamente operado (o VAMS), e sistemas de amostragem de água. “Com estes equipamentos, e atividades a decorrer 24h por dia, foi possível mapear cinco montanhas submarinas, obter cerca de 70h de vídeos subaquáticos feitos entre os 200-1500 m de profundidade, e algumas centenas de amostras biológicas e de água, bem como ADN ambiental para trabalhos de deteção de espécies por métodos moleculares” explica Joana Xavier.

A informação recolhida permitirá um estudo aprofundado do ambiente físico e químico, bem como das espécies e ecossistemas destas montanhas submarinas. “Mas a maior parte do trabalho continuará agora em terra, alicerçado na colaboração e sinergias estabelecidas entre os participantes da expedição e as instituições que representam” acrescenta a investigadora do CIIMAR.

Jardim de Coral Negro. © EAF Nansen programme, IMR/FAO

O conhecimento como base para a conservação da biodiversidade

Nos últimos anos, as áreas fora da jurisdição nacional (sigla inglesa ABNJ) têm recebido crescente atenção global devido à identificação de valiosos recursos biológicos e minerais, e à vulnerabilidade dos seus ecossistemas marinhos.

“Na Década das Nações Unidas das Ciências do Oceano para o Desenvolvimento Sustentável (2021-2030) em curso, expedições como esta a locais que ficam fora da jurisdição nacional de qualquer país são fundamentais para gerar conhecimento e apoiar a gestão sustentável daquele que é o maior bioma do planeta e a mais preciosa herança comum da humanidade – o mar profundo. Mas este é um desafio enorme que só será alcançado com uma abordagem científica verdadeiramente inclusiva, colaborativa e transformativa que permita reverter as tendências atuais de degradação do oceano” diz Joana Xavier.

Os dados e amostras obtidos permitirão agora descrever estes habitats, e investigar os fatores evolutivos e ambientais que promovem a sua formação. “Por se localizarem bastante longe de costa e sobre fundos de topografia muito complexa, alguns destes habitats aparentam estar em condições quase pristinas. São exemplo disso “algumas “florestas” dominadas por corais negros e esponjas de grandes dimensões que se estimam ser centenárias ou até milenares”.

Segundo a investigadora do CIIMAR, “o conhecimento gerado com esta expedição permitirá informar várias agências bem como convenções e tratados internacionais de gestão de recursos marinhos e conservação da biodiversidade”. Entre elas incluem-se o Comité das Pescas do Atlântico Centro-Oriental ( CECAF), a Convenção para a Diversidade Biológica (CBD) e as Nações Unidas, que com base nestas descobertas, poderão adotar futuras medidas e instrumentos de gestão e conservação apropriadas no sentido de assegurar uma trajetória positiva e sustentada desta biodiversidade para gerações futuras.