Podemos recorrer a Inteligência Artificial (IA) para fazer poesia? Qual seria o resultado? E se partirmos de um conceito de abdução, que cenários poderemos desenvolver? A Casa Comum (à Reitoria) da Universidade do Porto apresenta as últimas obras do artista, escritor e investigador americano Mark Amerika, realizadas em colaboração com IA. Experimentar Realidades Abduzidas é entrar num ambiente “pós-humano”. Como assim? Vamos por partes. A primeira é ler este texto. A seguinte é não faltar à exposição, aos workshops, à performance e à mesa redonda. Tudo isto acontece de 17 de abril a 13 de maio , com direito a entrada livre.

Simbioses entre o humano e a máquina

Quando entrar na Casa Comum, vai confrontar-se com uma “cabeça falante”. É uma peça que se poderia chamar PPP porque é uma performance que é poesia e que é também uma palestra. Esta “cabeça falante” não é nem mais, nem menos do que um avatar de Mark Amerika.

Admirador confesso da obra de Fernando Pessoa (de quem está, de momento, a ler O Livro do Desassossego), Mark America cria várias personagens (ou será que lhe poderemos chamar heterónimos?) … Vamos conhecer um desses “heterónimos” que nos questiona, e se questiona a si próprio, afinal, quem é esta “identidade? Sou eu, Mark Amerika? Ou os milhões de utilizadores que contribuíram para a apresentação deste poema, criado por mim, em colaboração com IA?”

Explorando a forma como humanos e máquinas evoluem, o artista americano lança mão de ferramentas digitais como extensões criativas. Depois de um longo percurso de investigação, exploração e materialização de resultados, Amerika acede a um novo patamar através da criação de microficções. São textos gerados em colaboração com IA, ou “simbioses criativas entre humano e máquina”.

Com curadoria de Ana Carvalho e Diogo Marques, a iniciativa é composta por narrativas microficcionais distintas e microvídeos em loops, com imagens vibrantes e surrealistas que nos situam entre o real e o imaginário, ou nos dividem entre o que consideramos ser o consciente e o que será do domínio do onírico. Neste recurso a ferramentas de IA, o artista deixa a pergunta: “Somos nós que estamos a usar a IA a nosso favor, ou será esta uma nova forma de inteligência, uma espécie de nova identidade, que se está a usar de nós para descobrir o seu próprio potencial criativo?”

Centrifugação entre o natural e o artificial

Espelhando uma realidade tecnológica em constante mudança, Mark Amerika convida os visitantes de “Realidades Abduzidas” a mergulhar num vórtice de novas dimensões. Uma espécie de centrifugação entre o natural e o artificial, criando uma sensação de desorientação e de incerteza. São microficções que se vão desdobrando e nos vão fazendo ultrapassar as barreiras entre o familiar e o desconhecido.

Nos écrans que integram a exposição há um conceito fundamental que, de resto, Mark Amerika já explorou em trabalhos anteriores, como The Kafka Chronicles (1993), Immobilité (2007-2009) filme criado com um telemóvel, e Grammatron (2007), um dos primeiros exemplos de net art. E essa ideia base é: abdução.

Retirado de “Vortices”. (Foto: DR)

As implicações da IA na sociedade

Em paralelo com a exposição, terá lugar, no dia 18 de abril, pelas 16h00, uma palestra que será também uma performance, conduzida pelo artista (ou um heterónimo de). Já no dia 2 de maio, às 15h30, a proposta inclui um workshop que promete ser uma real incursão pelo processo de criação do artista. Vamos perceber como fazer um poema recorrendo também ao resultado das instruções fornecidas à IA. Nesta, chamemos-lhe “experiência”, o artista vai levantar o véu ao contexto cultural mais amplo em que a obra reside.

Do programa faz ainda parte uma Mesa Redonda, que contará com a presença de personalidades ligadas a diferentes áreas para debaterem as implicações da IA na sociedade.

Todos os eventos são de entrada livre, ainda que limitada à lotação do espaço.

Mark Amerika. (Foto: DR)

Sobre Mark Amerika

Docente na Universidade do Colorado em Boulder, Mark Amerika é diretor fundador do Programa Doutoral em Arte Intermédia, Escrita e Performance, na Faculdade de Média, Comunicação e Informação e professor de Arte e História da Arte.

Já expôs em locais como a Whitney Biennial of American Art, o Museu de Arte de Denver, o Instituto de Arte Contemporânea em Londres, o Walker Art, o Museu Nacional de Arte Contemporânea de Atenas, entre outros.

Em 2009, lançou Immobilité, considerada a primeira longa-metragem artística gravada com telemóvel.