Os aspetos organizacionais e administrativos ligados à atividade policial são aqueles que mais contribuem para situações de burnout nos polícias. A conclusão consta de um estudo internacional que acaba de ser publicado no Journal of Affective Disorders, e que contou com a participação de Lucas Alves, estudante de Mestrado de Medicina Legal do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto (ICBAS), e da sua orientadora, Mariana Pinto da Costa.

Numa época em que se fala cada vez mais em Saúde Mental, a dupla do ICBAS juntou-se a investigadores de Espanha e do Reino Unido com o propósito de identificar os fatores que podem estar relacionados com o burnout nos polícias, compilando, através de uma revisão sistemática da literatura, os vários estudos desenvolvidos em todo o mundo sobre este tema.

De entre os fatores psicossociais de risco e de proteção que estabeleciam uma associação estatisticamente significativa com o burnout, os autores do estudo verificaram um claro destaque para os fatores relacionados com aspetos organizacionais e administrativos.

Desta forma, para muitos profissionais de policia, as tarefas associadas ao seu tipo de trabalho, como a constante vigilância, a frequente exposição a cenários violentos e traumáticos, tornam-se desgastantes e debilitantes. Além disso, têm de lidar com aspetos organizacionais que, muitas vezes, por serem percecionados como opressivos e desnecessários, representam uma grande fonte de stress.

Segundo Lucas Alves, “os fatores do tipo organizacional foram os mais presentes para o burnout nos agentes da polícia. Mas estes encontram-se também presentes nos estudos sobre burnout noutros profissionais”. Ainda assim, “o burnout não se limita apenas a este tipo de fatores e não devemos, de todo, descurar fatores sociais, demográficos ou variáveis relacionadas com a personalidade do indivíduo”, alerta o primeiro autor do artigo.

Já Mariana Pinto da Costa explica que “a nossa revisão sistemática da literatura identificou os fatores organizacionais e operacionais como os fatores mais significativos para o burnout em polícias. Um facto que, para a professora auxiliar do ICBAS, orientadora e coautora do estudo, evidencia “a necessidade de investir em estratégias para mitigar os fatores de risco e maximizar os fatores protetores de forma a apoiar a saúde mental dos polícias, com impacto na população em geral”.

A importância de zelar pela saúde mental nos polícias

Os resultados deste estudo têm um impacto relevante ao alertar e sensibilizar os decisores políticos e a tutela dos vários departamentos de polícia, para a criação de estratégias de prevenção e intervenções que possam aumentar o bem-estar dos profissionais da polícia no seu local de trabalho.

“Na sociedade, a polícia detém o poder e o dever de fazer cumprir as leis, preservar a paz, prevenir a prática de crimes, proteger os direitos e liberdades civis e prestar serviços à comunidade onde se insere. Para manter e assegurar estes interesses, é fundamental que os polícias se encontrem no melhor estado possível de saúde física e mental”, enfatiza Mariana Pinto da Costa.

Na verdade, são múltiplas as consequências que o burnout pode ter nos agentes da polícia. Tendências suicidas, comportamentos agressivos, fraca performance, intenção de desistir, dor musculosquelética, doença cardiovascular e sintomas depressivos, são apenas alguns exemplos.

Criar mudanças e implementar intervenções nas organizações policiais com este objetivo pode ser uma tarefa complexa. Trabalhar no sentido de desenvolver estratégias de prevenção e sensibilização parece ser o caminho a seguir.