A Comissão Europeia financiou recentemente com 5.4 milhões de euros um projeto de investigação que tem como objetivo desenvolver a primeira terapia oral genética para a Doença de Crohn, como um tratamento não invasivo, seguro, eficaz e direcionado. Denominado GENEGUT e liderado pela Universidade de Cork, na Irlanda, o projeto conta com um total de nove parceiros europeus. Entre eles inclui-se o Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), que irá receber 400 mil euros para, durante quatro anos, desenvolver um modelo 3D que simule o intestino inflamado desta patologia e possa ser utilizado para testar a eficácia de nanomedicamentos.

A Doença de Crohn (DC), uma das duas principais doenças inflamatórias do intestino, afeta cerca de três milhões de pessoas só na Europa, e tem custos de saúde superiores a cinco mil milhões de euros por ano. Devido ao seu início precoce e a uma evolução inconstante, a DC tem um grande impacto na qualidade de vida dos doentes afetados e na das suas famílias. O mais significativo é o facto de não existir um tratamento eficaz para todos.

Apesar dos avanços em novos moduladores imunitários e tratamentos biológicos, três em cada dez pacientes deixam de responder às terapias, o que faz com que seja urgente encontrar novas soluções terapêuticas.

A implementação da vacinação global para a COVID-19 provou a eficácia das terapias que utilizam o mRNA, pelo que esta equipa europeia pretende utilizar todo o conhecimento já adquirido e comprovado e “transferir a revolucionária tecnologia do mRNA e siRNA para tratar a Doença de Crohn”.

A terapia oral proposta neste projeto combina biomateriais desenhados para a correta encapsulação de RNA terapêutico em nanopartículas com capacidade de superar as barreiras existentes no trato gastrointestinal. O objetivo, explica Bruno Sarmento, que lidera a equipa portuguesa, “é desenvolver um tratamento não invasivo, seguro, eficaz e direcionado baseado em RNA administrado oralmente”.

Para o efeito, “a administração de RNA será possibilitada por uma abordagem combinada onde novos biomateriais, concebidos para ultrapassar as barreiras no trato gastrointestinal, sob a forma de nanopartículas. Desta forma, o RNA irá combater localmente a inflamação no tecido intestinal, evitando efeitos secundários sistémicos”, acrescenta o investigador

O grupo «Nanomedicines & Translational Drug Delivery» do i3S será responsável pela “criação dos primeiros modelos 3D multicelulares de intestino inflamado, que mimetizam a fisiopatologia da DC, a partir de células humanas primárias de doentes com esta patologia”.

Estes modelos, adianta Bruno Sarmento, “incluirão a simulação de fluidos dinâmicos, sensíveis a estímulos, para melhor perceção e validação das nanotecnologias propostas no projeto”. A ideia é também criar e disponibilizar uma biblioteca de novos biomateriais que pode ser utilizada para formular nanopartículas contendo RNA terapêutico (siRNA e mRNA).

Através de uma abordagem centrada no paciente, o GENEGUT reúne uma rede europeia multidisciplinar constituída por nove parceiros de oito países europeus com experiência em desenvolvimento de nanomedicamentos, modelos celulares e modelos pré-clínicos de Doença de Crohn, assim como PMEs e empresas farmacêuticas e duas associações europeias.

Ao i3S, único representante de Portugal, juntam-se ainda a University de Cork (Irlanda), a Bangor University (Reino Unido), a Uppsala Universitet (Suécia), a CarboHyde Zrt (Hungria), a Janssen Pharmaceutica NV (Bélgica), a Lonza Capsules & Health Ingredients – Capsugel France SAS (França), a European Federation of Crohn’s and Ulcerative Colitis Associations (Bélgica), e a Accelopment Schweiz AG (Suíça).