Financiado pela Comissão Europeia com 800 mil euros, através do programa Twinning, o consórcio europeu «REMODEL», liderado pelo Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), já permitiu dar formação em organóides a mais de 40 investigadores. O projeto, que conta com a participação das universidades de Copenhaga, Wuerzburg e Utrecht, visa dotar a comunidade científica do i3S de competências no desenvolvimento e utilização de organóides em alternativa aos modelos animais.

Coordenado pelos investigadores Anna Olsson, Celso Reis, Cristina Barrias e Margarida Saraiva, o projeto REMODEL combina o conhecimento que existe no i3S nas áreas da bioengenharia, cancro e doenças infecciosas com parceiros que estão na linha da frente no desenvolvimento de sistemas organóides, manipulando-os para fins específicos e validando o seu uso como modelos inovadores.

O objetivo passa assim por capacitar i3S e os seus investigadores através de estadias de curta duração (dois ou três meses) nos laboratórios dos três parceiros europeus do projeto, de cursos científicos que serão ministrados nas quatro instituições que integram o consórcio e trabalhos desenvolvidos no i3S.

O projeto arrancou em novembro de 2019, mas, devido à pandemia, os estágios nos laboratórios europeus ainda não avançaram. Ainda assim, a investigadora Marta Alves da Silva, que está a gerir o projeto, já está a desenvolver organóides, tem dois alunos de mestrado e está a dar apoio a dois alunos de doutoramento do i3S nos seus projetos de investigação.

No âmbito do REMODEL, “também já organizámos dois workshops, nos quais demos formação a mais de quatro dezenas de investigadores, a maioria dos quais do i3S», sublinha a coordenadora do projeto, Anna Olsson. O próximo workshop – «Good Practices in In Vitro Research» – realiza-se em fevereiro e ainda pode inscrever-se aqui.

O REMODEL, acrescenta a investigadora, “representa um passo fundamental do i3S na construção do primeiro Centro 3Rs em Portugal – «Replacement, Reduction and Refinement» de experimentação animal”.

Ainda segundo Anna Olsson, “a utilização de organóides na investigação científica do i3S é uma peça importante neste conceito, a par de outras medidas que já temos em curso de redução, substituição e bem-estar animal: investigação em bioengenharia, o único biotério no país com o selo de qualidade da AAALAC, um curso de experimentação animal credenciado pela FELASA e sermos signatários do Acordo de Transparência na Investigação Animal em Portugal”.

As vantagens de trabalhar com organóides

Um organóide é um conjunto de células de um tecido específico, cultivadas in vitro, e que pode ser usado para estudar um determinado órgão. A cultura de estruturas semelhantes a órgãos humanos, no laboratório, a partir de uma única célula, “abre novas e excitantes perspetivas para estudar o desenvolvimento de tecidos, as suas funções e os mecanismos de doenças que afetem esses órgãos”, explica Marta Alves da Silva, gestora do REMODEL.

Mais importante ainda, acrescenta a investigadora, “abre as portas para uma verdadeira medicina personalizada, onde recorremos a células do paciente para testarmos a terapêutica antes de ser usada, evitando assim efeitos secundários indesejados. Estes modelos 3D são uma ponte entre as culturas in vitro tradicionais (2D) e os modelos animais”.

Para além disso, continua Marta Alves da Silva, “os organóides capacitam os investigadores com modelos mais relevantes in vitro, pois conseguem mimetizar a maioria das funções de um tecido. São usados para replacement de experiências com animais, nomeadamente para desenvolvimento de novos fármacos e também permitem a redução do numero de animais usados na investigação”.

A líder do grupo de investigação «Immunology, Cancer Glycomedicine» do i3S, Salomé Pinho, explica por sua vez que o REMODEL trouxe à sua equipa a possibilidade de “responder a questões relevantes no âmbito da Imunologia, Cancro e GlicoMedicina». Que o diga Mariana Silva, estudante de doutoramento que “tirou benefícios da participação no Workshop de Organóides promovido pela equipa do REMODEL, permitindo-nos iniciar o estabelecimento deste modelo no nosso laboratório, necessário para a realização de uma tarefa específica deste projeto de doutoramento”.

Henrique Nogueira Pinto, que está a fazer o mestrado sob orientação da investigadora Cristina Barrias e co-orientação da gestora do REMODEL, não tem dúvidas sobre as vantagens dos organóides: “Representam uma descoberta notável para a investigação biomédica e constituem sistemas altamente promissores com o potencial de aproximar os modelos in vitro e in vivo“.

Trabalhar com organoides, explica o jovem investigador, “tem sido uma ótima experiência e é um prazer fazer parte de um projeto tão interessante como o REMODEL, que lida com um dos problemas mais importantes na investigação biomédica e reúne investigadores internacionais de elevada qualidade com o objetivo de fazer crescer a investigação em modelos não animais”.

“Considero-me sortudo por ter a oportunidade de desenvolver a minha tese de mestrado sob a alçada do REMODEL, no âmbito do qual estou a trabalhar em hidrogéis definidos para formação precisa de organóides», sublinha Henrique Nogueira Pinto. E remata: “Espero que o outcome do meu trabalho possa ajudar outros investigadores a desenvolver os seus organóides num microambiente mais definido, o que é bastante relevante para melhorar a reprodutibilidade dos resultados e progredir em direção a futuras aplicações clínicas”.