Uma equipa internacional de cientistas acaba de confirmar que existe mesmo um buraco negro supermassivo escondido no centro da Via Láctea. Com o auxílio do GRAVITY – um instrumento desenvolvido por um consórcio internacional, do qual fazem parte investigadores da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (Ciências ULisboa),  integrados no Centro de Astrofísica e Gravitação (CENTRA) – foi possível observar-se nodos de gás a deslocarem-se a velocidades de cerca de 30% da velocidade da luz, numa órbita circular logo a seguir ao horizonte de acontecimentos do buraco negro. É a primeira vez que se observa matéria a orbitar próximo do ponto de não retorno, sendo também as observações mais detalhadas obtidas até à data de matéria a orbitar tão perto de um buraco negro.

“É incrível poder realmente testemunhar material a orbitar um buraco negro a uma velocidade de 30% da velocidade da luz,” refere Oliver Pfuhl, um cientista no Instituto Max Planck de Física Extraterrestre (MPE). ”A extrema sensibilidade do GRAVITY  permitiu-nos observar os processos de acreção em tempo real com um detalhe sem precedentes”, acrescenta o investigador no comunicado oficial do Observatório Europeu do Sul (ESO).

Estas medições foram apenas possíveis graças a uma colaboração internacional e a instrumentação de vanguarda. O instrumento GRAVITY, que tornou possível este trabalho, combina a luz colectada por quatro telescópios do VLT do ESO, criando assim um supertelescópio virtual de 130 metros de diâmetro. Os investigadores portugueses que participam ativamente nesta descoberta são responsáveis pelo desenho, construção e validação da câmara de aquisição do GRAVITY, nomeadamente a equipa liderada por António Amorim (Ciências ULisboa) e Paulo Garcia (FEUP) que é o responsável pelo desenvolvimento do software que efetua as medições em tempo real.

Reinhard Genzel, do MPE em Garching, na Alemanha, e que liderou o estudo, lembra que “este sempre foi um dos nossos projetos de sonho mas não ousávamos imaginar que poderia tornar-se possível tão cedo.” Relativamente à suposição de longa data de que Sagitário A* seria um buraco negro supermassivo, Genzel conclui que “este resultado é uma confirmação retumbante do paradigma do buraco negro supermassivo.”

Este entusiasmo é partilhado por Paulo Garcia, professor da FEUP, até porque  testemunhou em direto o momento em que foi possível confirmar a existência do buraco negro no centro da Via Láctea: “Estive nos telescópios do VLTI em finais de julho, durante 10 noites seguidas, quando se observaram os clarões mais intensos. A minha tarefa era processar os dados recolhidos pelo GRAVITY em paralelo às medições com os telescópios: de 10 em 10 minutos via os pontos de brilho do buraco negro a aumentar e depois a diminuir. Foi bastante excitante, apesar de termos um computador potente havia um desfasamento temporal entre a recolha de dados e as medições, o que aumentou bastante o stress…”

Recorde-se que em julho, com o auxílio do GRAVITY e do SINFONI (outro instrumento montado no VLT), a mesma equipa de investigadores fez medições precisas na altura da passagem da estrela S2 pelo campo gravitacional extremo existente perto de Sagitário A* e revelou, pela primeira vez, os efeitos previstos pela teoria da relatividade geral de Einstein em meios tão extremos. Durante a passagem da S2 foi igualmente observada forte emissão infravermelha.

Este trabalho encontra-se descrito no artigo “Detection of Orbital Motions Near the Last Stable Circular Orbit of the Massive Black Hole SgrA*” submetido pelo grupo de cientistas do GRAVITY, publicada online, na revista Astronomy & Astrophysics na passada semana.