Se há faceta que é partilhada entre todos os estudantes-atletas que têm participado nesta rubrica, é a “ginástica” que têm de fazer para poder conciliar a vida pessoal com a exigência académica e atividade desportiva.

No caso da Eduarda Portela, a ginástica está presente deste os seis anos de idade, e esta dedicação levaram-na à conquista de múltiplos títulos na sua longa carreira que, entretanto, terminou.

Mas como tudo o que começa tem um fim, e esse fim pode dar início a algo novo, a estudante do 2.º ano da licenciatura em Bioengenharia dedica-se, agora, ensinar uma nova geração que quer chegar ao mais alto nível da Ginástica Acrobática.

Como é que a Ginástica surgiu na tua vida?
Quando era pequena, experimentei vários desportos: dança, karaté, ginástica formativa e natação. Mas aquele de que gostava mesmo era a ginástica. Um ano, na minha escola, houve uma apresentação de ginástica acrobática e lembro-me de ter ficado completamente encantada, só de olhar para o cartaz! Pedi logo aos meus pais para me inscreverem. Desde que comecei, com seis anos, nunca mais larguei a ginástica. Passado algum tempo, acabei por ir para o Acro Clube da Maia.

Para quem não está familiarizado, em que é que consiste a Ginástica Acrobática?
A Ginástica Acrobática é um tipo de ginástica praticada em grupo, podendo ser feita em pares, trios ou quadras. Normalmente, as quadras são compostos apenas por rapazes, enquanto os pares podem ser formados por dois rapazes, duas raparigas ou um de cada género. Já os trios costumam ser constituídos só por raparigas. Dentro da Ginástica Acrobática existem duas categorias principais: equilíbrio e dinâmico. No equilíbrio, realizam-se figuras estáticas que exigem, principalmente, força, estabilidade e controlo. Por outro lado, no dinâmico, fazem-se elementos de voo, como saltos e receções. Para além disso, a ginástica acrobática destaca-se também pela parte artística: todos os exercícios são acompanhados por música e coreografias. É um desporto que exige muita técnica, espírito de equipa e confiança.

Eduarda Portela Taça do Mundo da Maia 2024- finais

Eduarda Portela na Taça do Mundo da Maia, em 2024.

O que é gostas mais na Ginástica Acrobática?
O que mais gosto na Ginástica Acrobática é o espírito de equipa. Gosto especialmente do facto de não haver uma verdadeira competição com outros grupos, mas sim connosco próprios, como se estivéssemos sempre a tentar superar-nos dia após dia e a evoluir cada vez mais.

Esta é uma modalidade que implica uma grande coordenação entre todas as ginastas. Isso facilita ou dificulta a execução dos exercícios?
Na minha opinião, a necessidade de grande coordenação entre todas as ginastas acaba por dificultar a execução dos exercícios. Cada movimento tem de ser feito no momento certo e da forma certa, e basta uma pequena falha para comprometer todo o exercício. A coordenação exige não só técnica, mas também muita atenção e sintonia entre os parceiros.

Apesar disso, é precisamente essa dificuldade que torna a Ginástica Acrobática tão interessante para mim. É um desafio constante, onde é fundamental construir uma boa base técnica logo desde o início, para que, dia após dia, possamos evoluir de forma sólida e segura. Ter uma boa relação com os parceiros é essencial, porque é essa confiança e apoio mútuo que nos permite crescer juntos e atingir os nossos objetivos.

Eduarda Portela Taça do Mundo da Maia 2024

Eduarda Portela na Taça do Mundo da Maia, em 2024.

Apesar de jovem, já tens um currículo competitivo muito interessante, com a conquista e vários títulos nacionais. Qual é o momento mais alto da tua carreira até agora?
Acho que o momento mais alto da minha carreira até agora foi termos ganho, por dois anos consecutivos, a Taça do Mundo da Maia, em 2023 e 2024. Além disso, em 2023, no meu primeiro ano de sénior, ganhámos também o circuito das Taças do Mundo, graças às nossas prestações na Taça do Mundo da Maia, na Bélgica e na Polónia. Foram conquistas muito especiais para nós, porque mostraram todo o trabalho, dedicação e união que temos vindo a construir ao longo do tempo. Para além das conquistas já mencionadas, obtive também duas medalhas de prata no Campeonato da Europa, realizado em Varna, Bulgária, em 2023, e participei no Got Talent Portugal, no ano seguinte, onde chegámos à final.

Esperavas ter este tipo de desempenho quando começaste a carreira de atleta?
Sempre tive esta ambição de querer sempre mais. Desde pequena que estabelecia objetivos altos para mim própria, sempre com a vontade de evoluir e de dar o meu melhor. No entanto, olhando agora para tudo o que já conseguimos alcançar, admito que nunca imaginei chegar tão longe. Cada conquista foi fruto de muito trabalho, dedicação e persistência.

Eduarda Portela - Circuito das taças do mundo

Eduarda Portela no circuito das Taças do Mundo, em 2023.

Até onde esperas chegar na tua carreira desportiva?
Neste momento, o meu foco está mais em ser treinadora, e o meu objetivo é continuar a crescer nesse papel. Quero formar atletas com bons valores, transmitir tudo o que aprendi e, quem sabe, acompanhar os ginastas até ao mais alto nível. Quero continuar a evoluir, agora fora do praticável, mas sempre ligada à ginástica.

Seres treinadora era algo que sempre desejaste? Ou fruto da evolução da tua vida pessoal e profissional?
Sim, sempre gostei de ajudar os outros e de transmitir confiança, para que acreditassem que são capazes de ir mais longe. À medida que fui evoluindo como ginasta, essa paixão foi-se tornando cada vez mais evidente. Por isso, ser treinadora acabou por surgir de forma natural, não era algo que tivesse planeado desde o início, mas foi claramente fruto da minha evolução pessoal e desportiva.

Eduarda Portela Foto treinadora

A equipa orientada por Eduarda Portela.

O que é mais fácil: ser ginasta ou treinadora?
É uma pergunta difícil, na verdade. Por um lado, ser ginasta é exigente, uma vez que, treinava cerca de cinco horas por dia, seis vezes por semana, e conciliar isso com os estudos e a vida social era um grande desafio. Houve muitos dias em que, depois de treinos cansativos, ainda tinha de estudar para testes ou fazer trabalhos. Mas foi através da ginástica que me tornei uma pessoa organizada e aprendi a aproveitar ao máximo o tempo que tinha.

Por outro lado, ser treinadora também tem as suas exigências. Embora agora passe menos horas no clube do que quando era atleta, dar treinos a uma classe de atletas mais novos exige muita atenção e responsabilidade. Tenho de estar sempre alerta ao que me rodeia, porque somos inteiramente responsáveis por eles. Para além de ensinar, é preciso garantir que tudo é feito com segurança, o que implica uma grande concentração e dedicação.

Qual foi a maior alteração nesta passagem de ginasta para treinadora?
A principal mudança foi ter deixado de treinar de repente. Fiz ginástica durante 14 anos e estava habituada a uma rotina muito intensa, pois treinava cerca de cinco horas por dia e, em alguns dias, até treinava antes das aulas, das 6h30 às 8h00. Por isso, parar assim de um momento para o outro foi um grande choque. Acabei por arranjar forma de continuar a treinar, não com a mesma intensidade de quando era ginasta, mas ainda assim mantendo alguma rotina de treino, porque é algo que faz parte de mim.
Eduarda Portela Foto treinadora 1Que ídolos é que tens nesta modalidade?
A minha principal referência sempre foi a Rita Ferreira, que estuda Medicina na FMUP. O motivo pelo qual a admiro é simples: para além de estar sempre muito focada nos seus objetivos, tinha uma garra enorme e uma força de vontade impressionante. Foi uma grande inspiração para mim e acabou por ser também um verdadeiro alicerce ao longo do meu percurso.

Estás a frequentar a licenciatura em Bioengenharia. O que é que mais gostas no curso?
O que mais gosto no curso de Bioengenharia é a ligação entre várias áreas, como a biologia, a engenharia e a medicina. Gosto especialmente do facto de o curso ser muito desafiante, o que me obriga a manter a disciplina e a organização, sendo algo que já vinha da minha vida como ginasta. Sinto que, tal como no desporto, estou constantemente a tentar superar-me e a aprender mais todos os dias.

O que é que te fez escolher a FEUP e a área da Bioengenharia? Sempre foi um objetivo para ti entrar aqui na FEUP?
Escolhi Bioengenharia porque sempre gostei da área da saúde, mas também da parte mais técnica e lógica. Desde o secundário que tinha a FEUP em mente, pela qualidade do ensino e pelas oportunidades que oferece. Entrar aqui tornou-se um objetivo à medida que fui percebendo que este era o caminho certo para mim.
Eduarda Portela 1Encontras algum paralelismo entre a ginástica e Bioengenharia?
Sim, porque ambos exigem muita disciplina e foco. Tal como na ginástica, onde é preciso persistência e atenção ao detalhe para evoluir, em Bioengenharia também é necessária uma dedicação constante para acompanhar os desafios do curso. Além disso, tanto no desporto como na engenharia, a gestão do tempo é essencial para conseguir conciliar tudo.

Como é que é concilias os trabalhos diários com os estudos na FEUP?
Conciliar os trabalhos diários com os estudos na FEUP pode ser complicado, principalmente em épocas de avaliações. No entanto, era ainda mais complicado quando era atleta de alta competição. Nessa altura, treinava muitas horas por semana e tinha de gerir o tempo ao minuto para conseguir estudar, fazer trabalhos e descansar. Agora, embora continue com responsabilidades, consigo organizar-me melhor e adaptar o meu ritmo de estudo sem a mesma pressão física dos treinos intensivos.

O que é que mudarias para poder facilitar esta conciliação?
Acho que o mais importante seria haver maior flexibilidade nos prazos, especialmente em alturas com muitos testes. Ter um apoio mais direcionado para alunos com outras responsabilidades, como o desporto de alto rendimento, ajudaria bastante a gerir tudo sem comprometer o desempenho académico.

Quais é que são os grandes objetivos para a tua vida enquanto desportista e engenheira?
Enquanto desportista, quero continuar ligada à ginástica como treinadora e ajudar a formar novas gerações. Como futura engenheira, o meu objetivo é trabalhar numa área da Bioengenharia onde possa ter impacto real na vida das pessoas. Em ambos os caminhos, quero continuar a crescer e a fazer a diferença.

Eduarda Portela Got talent

Eduarda Portela no Got Talent Portugal, em 2024.