A baixa participação política dos emigrantes em Portugal está a limitar a sua integração social e a favorecer os discursos populistas anti-imigração. Esta é a principal conclusão da análise do Flash nº 2 de 2025 da Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP). Este trabalho do Gabinete de Estudos Económicos, Empresariais e de Políticas Públicas (G3E2P) da FEP destaca que o potencial político dos estrangeiros residentes é elevado em Portugal, uma vez que todos podem naturalizar-se após cinco anos de residência, alcançando direitos políticos quase equivalentes aos cidadãos nativos, e em muitos casos podem votar bastante antes, após recenseamento (ver análise Flash).
“A participação dos imigrantes na vida política deve ser incentivada pelos partidos políticos no seu recrutamento e no apelo ao recenseamento e exercício do direito de voto”, afirma Óscar Afonso, diretor da Faculdade de Economia. “Tal reforçaria a democracia e a integração dos imigrantes, reduzindo o espaço do populismo e estimulando o desenvolvimento económico sustentado”. Segundo o diretor da FEP, “a abertura dos partidos à diversidade social e à representação política de imigrantes pode impulsionar novas abordagens de políticas públicas, favorecendo uma sociedade mais inclusiva, coesa e inovadora”.
Óscar Afonso sublinha que “políticos e deputados estrangeiros integrados na sociedade portuguesa podem desenhar políticas de integração de imigrantes mais efetivas, por conhecerem melhor os problemas reais dessas comunidades”. O economista conclui que “Portugal tem uma oportunidade para liderar na integração política de imigrantes e mostrar à Europa como os países podem promover um desenvolvimento mais harmonioso”.
Em 2023, mais de um milhão de estrangeiros residiam em Portugal – a maioria oriundos de países fora da União Europeia, com o Brasil à cabeça –, num total de 185 nacionalidades de origem. No entanto, no final de 2024 apenas 34.165 estavam recenseados (3,3% dos estrangeiros residentes e 0,3% do total de recenseados), um número que incluirá os 16.985 estrangeiros residentes que adquiriram nacionalidade portuguesa e direitos políticos amplos. Isto porque, nesse caso, o recenseamento deverá ser automático, enquanto para os demais estrangeiros residentes é voluntário, exigindo esforço adicional e interesse, consoante as possibilidades de participação eleitoral, que até são bastantes no nosso país.
Estes números são evidenciados no referido estudo da FEP, onde se revela ainda que a aquisição de nacionalidade se faz, predominantemente, pela via da naturalização (peso de 78,8% em 2023), que pode ser obtida após cinco anos de permanência no país. A maioria dos estrangeiros que adquirem a nossa nacionalidade reside no exterior (59% do total ou 24.408 em 2023), tal como nos naturalizados (60%). “A saída para o exterior dos estrangeiros que adquirem a nacionalidade portuguesa, nomeadamente via naturalização, evidencia as dificuldades de retenção e integração dos imigrantes, comprometendo o potencial político e económico do país”, afirma Óscar Afonso, diretor da FEP e um dos autores da análise Flash.
Segundo outro autor do Flash n.º 2 de 2025 da FEP, Nuno Torres, responsável do G3E2P, “após a aquisição de nacionalidade, incluindo pela forma mais corrente da naturalização, os estrangeiros residentes ganham direitos políticos quase plenos, podendo votar em todas as eleições, filiar-se em partidos políticos e aceder a cargos eletivos, salvo o de Presidente da República, reservado pela nossa Constituição a portugueses de origem – a única exceção prevista ao princípio da igualdade aplicado ao ‘território de origem’. Ou seja, um estrangeiro com nacionalidade portuguesa pode ser deputado e até primeiro-ministro ou presidente da Assembleia da República. Além disso, após três anos ou menos, já é possível votar em certas eleições, dependendo do país de origem e dos acordos em vigor”.
10% de residentes estrangeiros podiam eleger 23 deputados
O Flash mostra que os cidadãos residentes de outros países da União Europeia podem votar nas eleições europeias e autárquicas logo após se recensearem, enquanto os brasileiros e cabo-verdianos podem votar nas autárquicas passados dois anos e os cidadãos de mais dez países (com acordos de reciprocidade) após três anos. No caso dos cidadãos brasileiros, passados três anos de residência podem requerer o Estatuto de Igualdade de Direitos Políticos, consagrado no Tratado de Porto Seguro, o que lhes dá acesso a direitos políticos como se tivessem já adquirido a nacionalidade. No entanto, os poucos dados existentes sugerem um baixo interesse em pedir esse estatuto.
A análise do G3E2P revela também que a participação eleitoral autodeclarada de estrangeiros com nacionalidade portuguesa foi de apenas 64% entre 2012 e 2020, um dos valores mais baixos na OCDE e inferior à média da UE (73%). A participação dos portugueses nativos é maior (74%), mas está abaixo da média europeia (cerca de 80%), revelando uma cultura de reduzido envolvimento político que se refletirá nos estrangeiros. “Ou seja, apesar de um potencial elevado de participação política do milhão de estrangeiros cá residentes, é de supor que os poucos recenseados tenham ainda menos interesse em votar que os nativos, até porque o seu exemplo não é bom”, afirma Nuno Torres. “Isso reforça a necessidade de estratégias mais eficazes para aumentar o envolvimento político em geral e dos imigrantes em particular”.
A filiação dos imigrantes nos partidos políticos portugueses é marginal ou inexistente, à semelhança do que sucede no resto da Europa, refere o estudo da FEP. Se os partidos políticos recrutassem ativamente imigrantes para representar os cerca de 10% de residentes estrangeiros, então 23 deputados eleitos seriam de origem estrangeira (com direitos políticos), distribuídos pelos principais partidos (8 no PSD e no PS, 5 no Chega e 1 na IL e no BE).