Nos últimos quatro anos, um projeto liderado pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) dedicou-se ao estudo e à caracterização dos riscos e impacto das atividades de mineração em mar profundo e desenvolveu ferramentas inovadoras, cujo propósito é servir de base à implementação de medidas de mitigação e gestão que minimizem os efeitos negativos nos ecossistemas.
A investigação, que contou também com investigadores do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR-UP), do Instituto Português do Mar e da Atmosfera e do Instituto de Investigação em Ciências do Mar Okeanos, da Universidade dos Açores, realizou-se no âmbito do Deep-Risk.
O trabalho surge numa altura em que há uma pressão cada vez maior para se avançar com estas atividades, em resultado do aumento da procura e do custo de metais para uso industrial, considerados essenciais para a transição energética.
No contexto da União Europeia, Portugal, e em particular a região dos Açores, é considerado um dos locais com recursos minerais, muitos dos quais ocorrem na proximidade de áreas protegidas com elevado valor ecológico, como campos hidrotermais, jardins de corais e agregações de esponjas associados a montes submarinos.
“Com este projeto inovador, quisemos contribuir para colmatar algumas das lacunas mais importantes associadas com a avaliação de risco ambiental da mineração em mar profundo, em particular o risco das plumas de sedimentos que serão produzidas durante a atividade de mineração”, destaca o coordenador do projeto, Miguel Santos, docente da FCUP e investigador do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR-UP).
Efeitos nocivos e /ou letais em todos os grupos estudados
A dispersão de sedimentos durante o processo de mineração é a consequência mais imediata e esperada da mineração de mar profundo. Os investigadores descobriram, no entanto, que a mineração também liberta quantidades elevadas de metais dissolvidos para a coluna de água.
Estas plumas podem espalhar-se por grandes distâncias, conduzidas pelas correntes, afetando, potencialmente, organismos a vários quilómetros do local de mineração.
No início do projeto, em laboratório, os cientistas avaliaram os efeitos de plumas de sedimentos em diversos grupos de organismos tais como esponjas, bivalves e corais de profundidade de água fria, recorrendo a câmaras hiperbáricas que simulam as condições do oceano profundo.
Os resultados que obtiveram apontam para efeitos negativos em todos os grupos estudados. Verificaram, por exemplo, que a existência de pequenas concentrações de partículas de sulfuretos polimetálicos em plumas de sedimentos provenientes de uma potencial exploração mineira em águas profundas provoca efeitos letais nos corais de águas frias.

A existência de pequenas concentrações de partículas de sulfuretos polimetálicos provoca efeitos letais nos corais de águas frias. Foto: Okeanos/Universidade dos Açores
Linhas orientadoras para as atividades de mineração em mar profundo
No âmbito do Deep-Risk, que terminou recentemente, desenvolveram-se também novos modelos hidrodinâmicos e ecológicos para avaliar o comportamento e efeitos das plumas de sedimentos e antecipar a evolução destes ecossistemas na presença de fatores de stress, como os sedimentos resultantes da mineração. Trata-se de modelos numéricos que permitem descrever, com elevada fiabilidade, a dinâmica oceânica nestas regiões, sendo, destacam os investigadores, “fundamentais como ferramenta de suporte à sua exploração sustentável”.
As previsões dos modelos hidrodinâmicos acoplados a modelos ecológicos complementam a avaliação in situ das condições do mar profundo e a consequente caracterização da sua variabilidade, que é “muito difícil e dispendiosa”. A equipa alerta ainda para um dos resultados na sequência destes modelos: “os ecossistemas hidrotermais impactados pelas plumas poderão entrar em colapso, indicando que têm pouca resiliência para ultrapassarem esse impacto”.
Os resultados destas ferramentas inovadoras poderão contribuir para o estabelecimento de linhas orientadoras para as atividades de mineração em mar profundo.
Impacto dos resultados e investigação futura
Os principais resultados do Deep-Risk foram discutidos no âmbito do workshop final que decorreu em dezembro de 2024, nas instalações do IPMA em Lisboa, e espera-se que possam contribuir para a implementação de diretrizes ambientais.
A investigação do Mar Profundo, incluindo o impacto de potenciais fatores de stress, foi identificada na “Estratégia Nacional para o Mar 2021-2030”, como uma área de investigação prioritária em Portugal para o período 2020-2030.
Sendo a Plataforma Continental uma área-chave para futuras atividades, prospeção e exploração, em conformidade com as Diretivas Marinhas da UE para a proteção ambiental e a submissão portuguesa para extensão da plataforma continental, os resultados deste projeto contribuirão para o estabelecimento de instrumentos legais para a gestão sustentável e conservação dos ecossistemas marinhos, incluindo os recursos naturais não vivos de mar profundo.
A equipa do projeto destaca ainda a importância de se continuar a estudar e caracterizar os ecossistemas de mar profundo, em aspetos como a longevidade das espécies, a sua reprodução e dispersão e também os efeitos das plumas de mineração nestes organismos, nomeadamente, no seu metabolismo e no desenvolvimento de ovos e larvas. “Essa incerteza tem de ser diminuída, para que os modelos sejam cada vez mais precisos, e se consigam estabelecer limites e metas ambientais”, destacam os investigadores.
O DEEPRISK – Mineração do mar profundo e alterações climáticas: novas ferramentas de modelação no suporte à gestão de risco ambiental (PTDC/CTA-AMB/7948/2020) contou com financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia.