Uma equipa de investigação internacional, da qual faz parte Albano Beja Pereira, investigador do CIBIO-InBIO – Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéricos da Universidade do Porto e do Centro de Investigação em Produção Agroalimentar Sustentável (GreenUPorto), docente e diretor da Licenciatura em Engenharia Agronómica da Faculdade de Ciências da U.Porto (FCUP), acaba de publicar um estudo na prestigiada revista Science, em que descreve o processo de domesticação e expansão do burro doméstico ao longo da história.
De acordo com o artigo intitulado “The genomic history and global expansion of domestic donkeys”, que merece honras de capa da última edição da revista, os burros “espalharam-se como um fogo selvagem para fora de África há cerca de 4.500 anos, atingindo a Europa e a Ásia num período de apenas alguns séculos”.
Uma descoberta que “demonstra o papel fundamental que os burros desempenharam nas sociedades humanas do passado, especialmente como animais de carga, mobilizando pessoas, cultura e bens”, explica a equipa em comunicado.
Para “rastrear” o processo de domesticação e expansão do burro por todo o mundo, a equipa – composta por 49 cientistas de 37 laboratórios de vários países – recorreu àquele que é o mais extenso e completo painel genómico da espécie alguma vez reunido, com base em 207 amostras contemporâneas e 31 amostras arqueológicas de burro doméstico – incluindo amostras representativas de quatro espécies selvagens de equídeos (zebra, burro selvagem africano e asiático).
Para além de diferenças geográficas notáveis, as “marcas” deixadas no genoma dos burros permitiram determinar o momento da separação entre as diferentes populações.
Num outro artigo publicado na Science, em 2004, Albano Beja Pereira e colegas já tinham identificado o nordeste africano como o local onde teria ocorrido a domesticação do burro, há cerca de 7 mil anos. Neste novo trabalho, os investigadores estimar permitiu que os burros domésticos terão saído de África há pelo menos 4.500 anos, tendo-se expandido rapidamente tanto para o leste na Ásia como para o oeste da Europa num período de tempo máximo de mil anos.
O processo de expansão do burro doméstico não seguiu, contudo, apenas uma direção, tendo regressado a África. Segundo o estudo, os burros já eram trocados entre a Europa e a África no tempo dos romanos, através do Mar Mediterrâneo. Embora essas trocas tenham ocorrido nos dois sentidos ,e continuado após o colapso do Império Romano, elas deixaram a pegada genética mais importante nos burros modernos da África Ocidental.
Os genomas mais antigos revelaram também a presença de linhagens genéticas anteriormente desconhecidas. Uma dessas linhagens foi encontrada no Levante há cerca de 2 mil anos, mas provavelmente habitava uma região geográfica muito maior, pois os investigadores conseguiram identificar vestígios do seu legado genético nos burros modernos em toda a Europa Oriental, Ásia Central e Ásia Oriental.
O estudo agora divulgadora torna ainda clara uma diferença importante entre o burro e o seu parente próximo, o cavalo. “Ao contrário dos cavalos, a consanguinidade em burros não aumentou particularmente nos tempos modernos, o que sugere estratégias reprodutivas semelhantes agora e no passado”, rematam os investigadores.