Uma equipa de investigadoras do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP) acaba de publicar, no Journal of Biosocial Science, o primeiro estudo português a avaliar as diferenças de altura entre uma geração e a dos seus pais, descrevendo diferenças em homens e mulheres, separadamente, e a sua relação com fatores socioeconómicos. “Socioeconomic factors and integenerational differences in height of Portuguese adults born in 1990: results from the EPITeen cohort” é o título do trabalho assinado por Berta Valente, sob a supervisão da Joana Araújo, e que contou também com a colaboração de Elisabete Ramos.

A variação da altura dos indivíduos depende de uma complexa interação entre genética e ambiente. Apesar da componente genética ser preponderante, a componente ambiental e social têm também uma influência relevante no crescimento do indivíduo. 

Assim, fatores socioeconómicos – como o nível de escolaridade e tipo de profissão – condicionam atitudes e comportamentos dos pais/cuidadores (por exemplo, alimentação, hábitos tabágicos, acesso aos cuidados de saúde, etc.) o que, por sua vez, pode impedir que os filhos atinjam o crescimento máximo que o seu potencial genético lhes permitia.

Maior diferença de altura entre gerações foi registada em adultos de famílias menos favorecidas

No estudo agora publicado, verificou-se que os adultos nascidos na década de 90 são, em média, mais altos que os seus pais. Em média, as mulheres cresceram mais 1,46 cm em relação às suas mães e os homens cresceram mais 3 cm, comparativamente aos seus pais.

Quando analisado o crescimento entre gerações de acordo com fatores socioeconómicos, concluiu-se que a maior diferença de altura entre filhos-pais e filhas-mães foi registada em adultos provenientes de famílias menos favorecidas, isto é, em que os pais e mães apresentavam níveis de escolaridade inferiores e profissões menos diferenciadas.

Importa dizer ainda que, apesar se ter verificado um crescimento da geração mais nova face à mais velha em ambos os sexos, as mulheres não cresceram tanto como os homens, o que reforça a necessidade de mais estudos que procurem explicar se o menor crescimento encontrado nas mulheres se deve mais a fatores biológicos ou socioeconómicos.

A altura como indicador de saúde e marcador de desigualdades

A altura é considerada um indicador de saúde da população e um marcador de desigualdades socioeconómicas e, por isso, o crescimento dos indivíduos entre gerações está relacionado com o desenvolvimento social e económico.

Este estudo veio ressalvar que, por um lado e como era esperado, em Portugal existiu uma melhoria nas condições de vida ao longo das últimas décadas. Por outro lado, apesar das desigualdades socioeconómicas ainda existentes, os filhos e filhas de famílias menos favorecidas, quando comparadas com os seus pais e mães, parecem ter tido um acesso mais adequado a recursos determinantes para o seu crescimento, o que lhes permitiu atingir uma altura mais próxima à dos filhos e filhas de famílias mais privilegiadas.

“A infância destas duas gerações (pais-filhos) foi marcada por contextos sociais bastante diferentes, principalmente em famílias que viviam condições menos favorecidas. A maioria dos pais dos participantes deste estudo nasceu durante o Estado Novo, nas décadas de 50-60, um período marcado pela elevada prevalência de doenças infeciosas e pela existência de insegurança alimentar nas famílias mais pobres”, explica Berta Valente.

Por outro lado, “os seus filhos nasceram num regime democrático, com acesso ao serviço nacional de saúde e maior acesso ao ensino, onde as escolas desempenhavam um papel ativo na universalidade da educação para a saúde. A título de exemplo, foi por esta altura que se implementou nas escolas o programa nacional de leite escolar, que permitiu às crianças terem acesso frequente a um alimento como o leite, que tem um elevado teor em proteína, um nutriente de extrema importância para o crescimento, particularmente em períodos ou grupos populacionais de maior risco alimentar”” – acrescenta a investigadora no ISPUP e primeira autora do artigo.

As investigadoras esperam agora que o progresso social e económico nacional das últimas décadas consiga resistir ao impacto da pandemia da COVID-19 e ao novo contexto socioeconómico provocado pela Guerra na Ucrânia, para que não se revertam estes importantes ganhos em saúde populacional alcançados nas últimas décadas.