Um estudo coordenado por Miguel Ricou, investigador do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde e professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), mostra que os psicólogos deverão assumir várias funções indispensáveis no contexto da morte antecipada.

Com base numa revisão sistemática da literatura e de uma revisão da legislação existente em vários países, os investigadores concluíram então que os psicólogos serão fulcrais, por exemplo, no aconselhamento do doente, das famílias e dos profissionais de saúde e na avaliação da competência de quem pede a eutanásia ou o suicídio assistido.

“Os psicólogos devem assumir um papel na avaliação da capacidade dos doentes e da consistência dos seus pedidos de morte antecipada.  A decisão de morrer é irreversível e, por isso, deve corresponder à verdadeira vontade da pessoa. Deve existir o mínimo de enganos possível na avaliação de um pedido de eutanásia e suicídio assistido”, afirma Miguel Ricou.

Segundo o coordenador do estudo, “não faz sentido que quem pede eutanásia não tenha a oportunidade de discutir isso mesmo com alguém especializado em orientar as pessoas nas suas tomadas de decisão”.

Advogados devem ser “advogados dos doentes”

No mesmo trabalho publicado agora no International Journal of Psychology, os investigadores defendem que caberá igualmente aos psicólogos assumir o papel de “advogados dos doentes”, garantindo que as suas necessidades são atendidas.

“Os psicólogos têm uma responsabilidade ética de proteger a autonomia do doente e o seu direito a tomar uma decisão consciente e informada”, continua Miguel Ricou. E sublinha que os psicólogos “devem fazer a ponte entre doentes, familiares e profissionais de saúde e prestar-lhes o apoio necessário em questões emocionais e éticas”.

Para desempenhar todos estes papeis, Miguel Ricou considera que os psicólogos devem fazer investigação na área e receber treino especializado. “É preciso investir em estudos científicos que permitam perceber como as decisões de fim de vida são tomadas e se elas são estáveis ou se variam ao longo do tempo”, salienta.

Finalmente, o especialista em Bioética chama a atenção para a necessidade de conseguir influenciar a discussão da lei sobre eutanásia, de modo a assegurar a existência de equipas interdisciplinares e a efetiva participação dos psicólogos neste contexto.

Despenalização volta ao Parlamento

Atualmente, a eutanásia voluntária é legal na Bélgica, Canadá, Holanda, Luxemburgo, Uruguai e Colômbia e o suicídio assistido pode ser praticado na Suíça, na Alemanha, no estado australiano de Victoria e em oito estados dos EUA.

Em Portugal, a despenalização da morte medicamente assistida (eutanásia e suicídio assistido) foi aprovada na generalidade no dia 20 de fevereiro deste ano, na Assembleia da República (AR), tendo baixado à Comissão de Assuntos Constitucionais para discussão e votação na especialidade.

Nesta quinta-feira, dia 18 de junho, o assunto voltou a estar na agenda do Parlamento, com uma reunião do Grupo de Trabalho “Despenalização da Morte Medicamente Assistida”, da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, e com uma audiência de Ferro Rodrigues à Iniciativa Popular de Referendo “A (des)Penalização da morte a pedido”.

Este artigo tem como primeira autora Sílvia Marina, da FMUP e CINTESIS e conta ainda com os contributos de Tony Wainwright, da Universidade de Exeter, no Reino Unido, e de Miguel Ricou.