“Existe um desinteresse generalizado da camada jovem pela política, o que se reflete bastante nas taxas de abstenção de voto das últimas décadas em Portugal.” Foi a partir desta constatação que Carolina Couto, Cristiana Couto, Inês Sousa Monteiro e Inês Passos Fernandes, todas elas finalistas do Mestrado Integrado em Bioengenharia da Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP), desenvolveram o projeto Cidadania 5.0, que acaba de conquistar a 1.ª edição do concurso “Do Well Do Good”, promovido pela ShARE-UP, em conjunto com a Porto Business School e a Câmara Municipal do Porto (CMP)

“O objetivo deste projeto é incentivar os jovens da cidade para a tomada de decisão e tentar envolvê-los de uma forma fácil, pouco burocrática e que lhes desperte interesse pelas causas públicas que dizem respeito a todos nós”, apresenta Carolina Couto, capitã da Biothentic, nome da equipa vencedora.

Na prática, o “Cidadania 5.0” assenta, essencialmente, na criação de uma assembleia jovem, de 60 pessoas (30 homens e 30 mulheres, para cumprir a igualdade de género) com idades entre os 16 e 30 anos, eleitos pelas várias escolas selecionadas. A esta assembleia competiria decidir temas (que tanto podem ser um problema existente, como uma lacuna detetada ou uma iniciativa nova que gostariam de ver no terreno) e as respetivas ações específicas a implementar.

“O tema e ações são depois postos a votação numa plataforma digital, que nós criámos, o chamado PassaPorto, que permitirá que todos os jovens da cidade do Porto possam aceder e votar nas ações específicas que queiram ver implementadas”, concretiza a jovem finalista de Bioengenharia.

Com esta estratégia, as estudantes acreditam que conseguirão motivar a participação dos mais jovens na vida da cidade. “Os jovens mobilizam-se por causas em que acreditam e onde vejam que as suas ações vão criar impacto. Mais do que palavras e discussões, gostam de passar para ação e ver resultados”, projetam.

“Um bom resultado seria os jovens participarem nos eventos”

As estudantes terão agora 60 dias para desenhar a aplicação “PassaPorto, em parceria com a ShARE-UP e o Gabinete da Juventude da CMP. “Estes dias vão ser usados para aprofundar as nossas ideias e começar um plano logístico, financeiro e de marketing mais conciso”.

Para dar a conhecer o “PassaPorto” uma das estratégias da equipa é utilizar o Instagram da CMP, já que é a plataforma com perto de 5 mil membros ativos em Portugal, maioritariamente utilizadores jovens. “Também é a aplicação que apresenta maior taxa de crescimento e de engagement, ou seja, com uma maior número de interações por post em relação ao número total de seguidores. Portanto qualquer campanha de divulgação que fizermos terá que obrigatoriamente envolver esta rede social”, admite Carolina Couto.

Mediante os resultados e o investimento que tiverem ainda disponível na altura, disponibilizar a app na Apple e na Google Store é outro patamar que querem alcançar e consideram “essencial”.

“Um bom resultado para nós seria os jovens participarem nos eventos, não só pelas regalias associadas, mas também por demonstrarem um verdadeiro interesse nas temáticas abordadas das atividades e nas iniciativas escolhidas pela assembleia”, vaticinam as jovens.

A influência japonesa

A inspiração para o “Cidadania 5.0” veio de França, numa fase embrionária do projeto: umas pesquisas permitiram identificar um modelo-experiência francês que está neste momento a ser implementado e que assenta sobretudo num convite que é feito a pessoas fora do circuito da política para que participem e intervenham em assembleias onde podem fazer valer as suas opiniões sobre determinados assuntos de âmbito regional e ajudar na tomada de decisões.

O grupo rapidamente se identificou com esta proximidade dos cidadãos com a política, sem ser “a tempo inteiro” e numa perspetiva quase voluntarista e foi uma espécie de ponto de partida para a solução que vieram a criar e que precisava de uma componente tecnológica associada. Optaram por adequar o conceito de Sociedade 5.0, desenvolvido no Japão, e que genericamente funciona como uma proposta  de modelo de organização social em que tecnologias como “big data” e inteligência artificial são usadas para criar soluções com foco nas necessidades humanas.

Neste caso, o desenvolvimento tecnológico iria permitir o voto online e incentivar a participação dos jovem nas atividades da CMP através do conceito de “gamefication”. “Ao permitirmos esta tomada de decisão a partir do mundo digital acreditamos num maior envolvimento dos jovens e tornar esta faixa etária mais interessada e ativa na identificação e resolução de problemas da cidade do Porto!”, acreditam as estudantes de Bioengenharia.

Sair da zona de conforto

A 1ª edição do Do Well Do Good Challenge decorreu virtualmente entre os dias 23 de março e 1 de abril e desafiou os  participantes a encontrarem soluções inovadoras para problemas reais dos jovens do Porto, a partir de um caso de estudo fornecido pela Câmara Municipal do Porto (CMP).

No caso das quatro estudantes da FEUP agora premiadas, a decisão de concorrer surgiu porque era uma forma de estarem mais tempo juntas, neste que é o último ano na faculdade, e porque lhes iria permitir “sair da zona de conforto” e explorar conceitos adquiridos, essencialmente, nas cadeiras de Economia e Gestão, Inovação em Biodesign e Empreendorismo.

Os workshops promovidos pela ShARE fizeram o resto: passaram a ficar familiarizadas com conceitos que até aí desconheciam como Design Thinking, Project Management, Data Collection & Analysis, só para nomear alguns, mas que “fizeram toda a diferença na forma como conseguimos encarar este desafio assente no pensamento criativo, na originalidade e no “think big” mindset”, admite Carolina Couto.

Quanto ao futuro profissional, Inês Passos Fernandes, Cristiana Couto, Inês Sousa Monteiro e Carolina Couto admitem estar preparadas para o mercado de trabalho, ainda que o contexto pandémico que estamos a atravessar possa dificultar um pouco esta nova fase de procura de emprego. Ainda assim estão confiantes no prestígio do curso e reconhecimento da formação da FEUP fora de portas.

“Acreditamos também que este projeto pode impulsionar a nossa entrada, uma vez que é um enorme privilégio trabalhar com entidades como a CMP”, concluem.