Foi na Alpbach Summer School, iniciativa promovida pela Agência Espacial Europeia (ESA) e pela Austrian Research Promotion Agency, que Vasco Pires, estudante do Mestrado em Engenharia Mecânica da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), deu nas vistas.

A “fascinação pelo setor aeronáutico, espacial e automóvel” levou-o a sonhar mais alto, querendo agarrar a oportunidade “única” de participar no desenvolvimento de uma missão espacial que permita o estudo da dinâmica e transporte de energia na magnetosfera de Marte.

Como único representante da Agência Espacial Portuguesa em Tirol, na Áustria, foi num contexto multicultural e com participantes de universidades europeias e norte-americanas que o estudante da FEUP conseguiu alcançar os prémios de “Best Quality” e “Best Presentation”.

“O projeto alavancado pela minha equipa – a caracterização do campo magnético induzido de Marte e sua resposta dinâmica a ventos solares – tem impacto direto na proteção de futuros habitantes e respetivo equipamento no solo marciano”, apresenta Vasco Pires.

Os ventos solares – partículas com carga elétrica emitidas pelo sol – interagem com o campo magnético da Terra, que por sua vez cria uma barreira de proteção que impede a entrada destas partículas na atmosfera. Este campo magnético é criado pela rotação do núcleo de ferro – a combinação da dinâmica do núcleo interno de ferro com o núcleo externo de magma da Terra.

No caso do campo magnético de Marte, sabe-se que ocorre por via de indução causada pela interação eletromagnética entre os ventos solares (plasma magnetizado) e o próprio planeta. Importa estudá-lo e compreender como é que este campo magnético induzido reage com a presença de ventos solares e se realmente concede proteção suficiente para existir habitabilidade humana em Marte.

“Em Marte, esperam-se mecanismos semelhantes aos da Terra. É relevante compreender as trocas de energia no sistema marciano e, sendo a cauda magnética um dos principais caminhos para iões e outras partículas da atmosfera escaparem, o estudo desta área permite complementar estudos relativamente ao “atmospheric escape” (que se refere à fuga de gases para o meio interestelar, levando à depleção da atmosfera marciana)”, avança o estudante.

Outro conceito com importância para o estudo, afirma Vasco Pires, é o Interplanetary Magnetic Field (IMF), “uma parte do campo magnético do Sol que é transportado para o espaço interplanetário pelos ventos solares. Aqui, este campo encontra uma série de obstáculos pelo caminho – os planetas e outros corpos celestiais”, interagindo com ambos os campos magnéticos.

Para explorar a dinâmica e a interação entre os ventos solares e o IMF, foi necessária a utilização do Solar Wind Observatory (SWO) – um monitor solar em órbita circular, responsável pela caracterização dos ventos solares a montante do planeta e comunicação com a Terra – e de quatro satélites em configuração tetraédrica numa órbita elíptica (Magnetospheric Formation Orbiters – MFO), que possibilitarão o estudo da cauda magnética.

Render do satélite na sua configuração inicial (altura em que os 4 MFO’s se encontram anexados ao satélite inicial).

Com estes instrumentos, é possível juntar a causa – o vento solar – ao efeito – algum tipo de alteração no campo magnético de Marte. “Este planeta não possui um campo magnético intrínseco, sendo os próprios ventos solares a criarem correntes na ionosfera de Marte (zona da atmosfera com partículas eletricamente carregadas e eletrões) e fortalecendo o campo magnético induzido. Daí ser interessante estudar o campo magnético de Marte para diferentes condições de ventos solares”, elucida.

O estudante de Engenharia Mecânica da FEUP dá conta do impacto que esta experiência internacional poderá vir a ter no seu futuro académico e profissional. “Pude estar com tutores com anos de experiência na indústria espacial europeia, obtendo noções das práticas e standards de engenharia utilizados. No final da escola de verão, fui capaz de conceber uma versão preliminar de um satélite e de planear uma missão espacial, uma experiência que certamente me irá possibilitar prosseguir uma carreira no setor espacial.”

A Alpbach Summer School 2022 decorreu neste verão, na Áustria. (Foto: MA Jakob)

A importância da formação

O gosto por esta área de investigação reflete-se nas decisões de Vasco Pires, que atribui uma “enorme transversalidade” à área de engenharia mecânica, permitindo-lhe participar em diversos projetos durante o seu percurso académico.

A European Innovation Academy em 2019 foi um deles, assim como a atribuição de uma bolsa de investigação em 2020 por parte do Instituto de Ciência e Inovação em Engenharia Mecânica e Engenharia Industrial (INEGI).

“Esta bolsa deu-me a oportunidade de desenvolver protótipos médicos e de prevenção epidemiológica utilizando a impressão 3D e a metodologia de design iterativo, colocando à prova alguns dos conhecimentos que adquiri no meu percurso na FEUP”, explica.

Percurso esse enaltecido por quem acompanha o seu trabalho de perto. “As oportunidades existem, há quem as ignore e há quem as aproveite, dignificando o ensino ministrado na FEUP e se enriquecendo com competências que são muito importantes para um futuro de sucesso no mercado global de trabalho. É um privilégio trabalhar com estudantes como o Vasco Pires”, reconhece Jorge Lino, professor no Departamento de Engenharia Mecânica.

Lucas da Silva, Professor Catedrático do mesmo departamento, reitera a opinião, acrescentando, ainda a propósito da Alpbach Summer School: “Esta iniciativa do Vasco é um bom exemplo de como aproveitar as atividades extracurriculares disponíveis para se enriquecer técnica e pessoalmente. Ainda venceu um prémio, o que demonstra bem a qualidade da formação dos nossos alunos”.