Os doentes terão “direito ao esquecimento”, ou seja, à eliminação dos seus dados pessoais de saúde para sempre? Em que circunstâncias ele poderá ser exercido e quais as consequências? Os doentes de COVID-19 também poderão ser abrangidos por este direito?

Num artigo publicado na última edição da Revista Iberoamericana de Bioética, um grupo de investigadores do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde e da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), defende que “não é possível universalizar o direito ao esquecimento sem avaliar as consequências na saúde de indivíduos e populações”.

Para Sílvia Cunha e Miguel Ricou (que coordenou o estudo), a possibilidade de remover dados pessoais de saúde deve ser vista “caso a caso, através de um conjunto de critérios previamente definidos”.

No artigo agora disponibilizado, os autores analisam os possíveis efeitos associados ao “direito ao esquecimento”, que consiste no direito a solicitar a remoção definitiva dos dados de saúde, considerados “dados sensíveis”.

Em causa estão, por um lado, o direito à privacidade e respeito pela confidencialidade de dados pessoais e, por outro, a necessidade de realizar investigação científica e epidemiológica que permita melhorar a qualidade, segurança e eficiência dos serviços de saúde, bem como promover a saúde pública.

“Avaliação caso a caso será sempre a solução ideal”

Este conflito entre interesses individuais e interesses públicos é evidente, por exemplo, no caso de doenças infeciosas, como o VIH/SIDA, a hepatite e mesmo a COVID-19, particularmente no contexto da atual pandemia, mas também no caso de doenças oncológicas, de doenças mentais e de dados genéticos.

“A eliminação dos dados de saúde, particularmente em caso de doença transmissível, é bastante complexa. Será, pois, muito difícil aceitar, nestes casos concretos, o direito universal ao apagamento dos dados”, afirmam os autores.

Para os investigadores da FMUP e do CINTESIS, “a avaliação caso a caso será sempre a solução ideal” e “deverá envolver, preferencialmente, profissionais com competências e experiências distintas na área da saúde”.

De modo a decidir quando “apagar” ou não dados pessoais de saúde, a equipa defende a criação de “procedimentos gerais, baseados em múltiplos critérios”, como “as desvantagens para a investigação, as consequências para a saúde do paciente e os resultados na saúde de outros doentes ou familiares”. Um processo que, dizem, deverá envolver as instituições, os profissionais de saúde e os próprios doentes.