Nos últimos dias de novembro, milhares de exemplares de indivíduos da espécie Velella velella deram à costa, nas praias de Viana do Castelo, Esposende e Matosinhos, depois de uma semana de clima turbulento nas nossas praias, com ondulação significativa e aviso amarelo numa grande mancha do litoral norte do país. As observações pelos investigadores do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade do Porto (CIIMAR-UP) ajudam a esclarecer a origem deste arrojamento em massa.

A espécie Velella velella, é por vezes conhecida por “Veleiro” ou “Wind-Sailor” e é um Cnidário muito peculiar, que vive na superfície da água. Faz parte da classe dos Hidrozoários, tal como as medusas, mas tem um grupo do qual é a única espécie. Na verdade trata-se de um organismo colonial constituído por pólipos especializados em diferente funções como protecção ou reprodução. A principal característica da espécie Velella velella é o facto de, em vez de viver apenas debaixo de água como as medusas, vive à superfície em parte do seu ciclo de vida, e usar os seus tentáculos que mergulha na água para apanhar alimento. As Velellas são de um azul transparente e crescem até entre 6 e 10 cm mas, e apesar das semelhanças, não são parentes directos das temidas Caravelas-Portuguesas (Physalis physalis).

Ocorrem tipicamente em águas tropicais e temperadas, vivendo em alto mar. Contudo, o mau tempo, as tempestades e as marés turbulentas junto à costa provocam esporadicamente o seu assoreamento nas praias. Foi o que se passou durante a última semana de novembro em vários pontos da nossa costa.

O vento que as permite viajar pela superfície do Oceano é também o motivo que as pode fazer arrojar aos milhares junto às praias. (Fotos: Hugo Santos)

Arrojamento a Norte do País

Observações foram feitas por investigadores do CIIMAR durante sessões de colheitas nas praias em Viana do Castelo, Porto e Galiza mas também pelo público geral na Aguda, e Matosinhos entre o dia 27 e 30 de novembro.

Segundo a investigadora Débora Borges do CIIMAR, os Veleiros” não são urticantes como é o caso das caravelas portuguesas e em princípio não constituem perigo para a população”. E acrescenta algumas curiosidades: “A Velella está equipada com um disco flutuante composto por pequenos tubos de gás concêntricos que servem como bóias, permitindo que flutue”. Do centro do disco destaca-se uma “vela” semicircular composta por quitina que permite que o vento as impele pela superfície do mar.  “Quando as condições do vento assim o permitem, podem arrojar aos milhares junto às praias” refere a investigadora.

Morfologia evolutiva

Sem água, estes organismos desidratam rapidamente perdendo a cor e a massa visceral ficando apenas visível a estrutura quitinosa. Curiosamente, numa altura em que as questões dos plásticos no oceano ocupam as nossas preocupações, muitos podem à partida confundir estes organismos com pequenos plásticos deixados na praia. No entanto, a sua estrutura quitinosa é um material orgânico e não poluente. Sabe-se até que estes arrojamentos têm um papel importante no ciclo do carbono trazendo matéria orgânica e nutrientes do oceano para terra.

Mas um assoreamento desta magnitude não significa o desaparecimento da população! As “velas” destes pequenos veleiros podem estar voltadas a 45º para a direita ou para a esquerda, fazendo-os mover em direcções opostas dependendo do vento e dividindo a sua população em dois. Não se sabe ao certo o motivo por trás deste dimorfismo, mas pode estar associado a uma vantagem evolutiva do organismo de forma a que, numa situação de ventos e tempestades, como a que se assistiu, apenas a parte da população a favor da direcção do vento seja arrojada enquanto que a restante sobrevive sendo impelida para longe das praias.