Apesar de não serem visíveis a olho nu, as microalgas são organismos extremamente relevantes, não só para o equilíbrio ambiental e dos ecossistemas nos quais vivem, mas também para uma variedade de indústrias que as utilizam como matéria prima. Um estudo realizado por investigadores da equipa Blue biotechnology and Ecotoxicology do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade do Porto (CIIMAR-UP) e da Universidade da Madeira, revela que quando sujeitas à presença de microplásticos, o crescimento e produção de microalgas é significativamente comprometido.

O trabalho intitulado “Microplastics reduce microalgal biomass by decreasing single-cell weight: The barrier towards implementation at scale” e agora publicado na revista científica Science of The Total Environment, foi desenvolvido no âmbito do projeto de mestrado de Ivana Mendonça, sob liderança da investigadora Nereida Cordeiro, do CIIMAR e da Universidade da Madeira. O objetivo passou por examinar a forma como a utilização de águas contaminadas por microplásticos afeta a produção de biomassa de várias espécies de microalgas utilizadas na indústria, e compreender de que maneira esses efeitos influenciam as suas células e metabolitos.

Uma produção comprometida

Os principais resultados do estudo demonstram que a presença de microplásticos na água pode influenciar de forma significativa a produção de biomassa de microalgas a nível industrial.

“A magnitude do impacto parece variar de acordo com o tipo de microalga em questão, mas é de assinalar que todas as espécies analisadas sofreram um prejuízo considerável na produção de biomassa quando sujeitas à presença de microplásticos” esclarece Nereida Cordeiro.

Este prejuízo traduz-se na redução do peso ou no tamanho das células individuais, dois aspetos de elevada relevância para a rentabilidade dos processos industriais nos quais são utilizadas. O estudo demonstra que a redução na produção de biomassa pode atingir 50%, o que pode colocar em risco a viabilidade económica do sector.

Mais ainda, a presença dos microplásticos pode modificar as vias metabólicas das microalgas, incentivando ou inibindo a produção de determinados produtos de importância industrial.

Ação urgente

A presença de microplásticos na água é atualmente indiscutível. Outros estudos mostram que a sua ubiquidade abrange até as águas mais remotas e inabitadas. No entanto, este estudo adota uma perspetiva singular porque demonstra de forma inequívoca o impacto dos microplásticos em temas que se relacionam diretamente com a atividade industrial e com a economia, um aspeto que ainda tem sido pouco explorado pela comunidade científica.

Os resultados alcançados neste estudo são um alerta significativo para a comunidade em geral sobre o perigo que os microplásticos representam, não apenas para a produção de biomassa de microalgas, mas também para a economia das indústrias que delas dependem e para o ambiente pelo seu papel altamente eficiente na conversão do dióxido de carbono em oxigénio. “Este é um tema que merece atenção e ação imediata para minimizar os danos potenciais” acrescenta a investigadora do CIIMAR.

Diante destes resultados alarmantes, os investigadores destacam a urgência em desenvolver métodos inovadores e ecológicos para remediar a contaminação da água. Assim, o grupo de trabalho tem vindo paralelamente a investigar biopolímeros, mais propriamente a celulose bacteriana e os exopolissacarídeos de microalgas e cianobactérias, como materiais floculante de microplásticos para diminuir ou eliminar a contaminação das águas.

Essas pesquisas já começaram a ser publicadas em revistas como a Water Research ou a Chemosphere. A sua implementação levaria à descontaminação das águas usadas na indústria de forma a não comprometer a viabilidade económica das indústrias que utilizam as microalgas como matéria-prima, nem comprometer o relevante papel ambiental que as microalgas têm.

O futuro da investigação

Mas estudos apenas laboratoriais são insuficientes. É necessário ampliar a pesquisa para uma escala industrial para corroborar estes resultados em contextos industriais mais relevantes. Além disso “precisamos compreender os mecanismos moleculares que levam à redução do peso das células individuais e avaliar a manifestação destes efeitos à escala industrial” alerta Nereida Cordeiro.

Este trabalho abre assim caminho para a investigação futura e desenvolvimento de métodos inovadores e ecologicamente eficientes de tratamento de água contra os microplásticos. Uma responsabilidade que a investigadora do CIIMAR assume em nome da comunidade científica: “sinto uma responsabilidade profunda em desvendar e minimizar os efeitos dos microplásticos nas microalgas, ciente de que o futuro da nossa indústria e a harmonia do nosso ecossistema poderão ser profundamente beneficiados com essas descobertas.”