Num levantamento de informação nunca antes feito, e que acaba de ser publicado na revista científica internacional “Frontiers in Marine Science”, investigadores do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade do Porto (CIIMAR-UP) e do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve (CCMAR) usaram a informação de avistamentos de cetáceos nas redes sociais para perceber quais as espécies de golfinhos e baleias que podem ser avistadas na costa Algarvia e ainda quais as mais comuns e as mais raras.

Apesar das muitas décadas de investigação na costa do Algarve, os estudos sobre a biodiversidade de cetáceos nesta zona são esporádicos e, quando existem, incidem numa área restrita ou nalguma espécie em particular. Além disso, a maioria dos estudos existentes continuam a ser publicados na forma de teses ou posters e por isso são de acesso mais limitado à maioria da comunidade científica internacional e ao público em geral.

A acrescentar a este limitado número e tipo de estudos na área, a inexistência de monitorização contínua dificulta também a compreensão sobre a variação da diversidade de cetáceos numa escala temporal alargada.

As redes sociais ao serviço da ciência

Foi com esta perspetiva que a equipa de investigadores do CIIMAR e do CCMAR usou a informação disponibilizada nas contas de Facebook e Instagram das empresas marítimo-turísticas de observação de cetáceos do Algarve para obter informação sobre a biodiversidade de cetáceos ao longo da costa Algarvia.

Os resultados do estudo demonstram que as redes sociais podem ser uma fonte de informação preciosa sobre a biodiversidade de baleias e golfinhos: revelaram no período de 2011 a 2020, 16 espécies diferentes de cetáceos e duas nunca antes descritas para a costa do Algarve, fazendo subir para 24 o número total de espécies que é possível avistar nesta área.

O golfinho-comum foi a espécie mais vezes observada e a baleia-anã foi a espécie de baleia menos rara de entre as cinco espécies de baleias avistadas no Algarve entre 2011 e 2020.

Pedro Morais, investigador da Universidade do Algarve e do Institute of Environment da Florida International University, que liderou este trabalho, evidencia que “não são só os cientistas que trabalham para a conservação das espécies e dos seus ecossistemas. As empresas marítimo-turísticas de observação de cetáceos no Algarve em muito têm contribuído para a educação ambiental na região. Um público informado e consciente sobre a biodiversidade existente na sua região e no seu país serão sempre os elementos da sociedade mais interventivos para a preservação e valorização dessa mesma biodiversidade.”

Para Ester Dias, investigadora do CIIMAR, “a principal motivação para realizar este trabalho foi sabermos que a informação disponível sobre a biodiversidade de cetáceos no Algarve era muito escassa, e com valor reduzido para programas de conservação da natureza.” De facto, até ao momento da publicação do estudo “Harnessing the power of social media to obtain biodiversity data about cetaceans in a poorly monitored area”, sete das 16 espécies avistadas pelas empresas marítimo-turísticas nunca tinham sido descritas numa publicação científica formal.

Apesar da sua utilização na ciência ser ainda uma novidade, os registos colocados no Facebook e no Instagram pelas empresas marítimo-turísticas são uma ferramenta de baixo custo para obter informação sobre a biodiversidade de espécies de cetáceos em zonas que carecem de programas de monitorização continuada ao longo do tempo. Luís Afonso, jovem estudante do programa Blue Young Talent do CIIMAR e também autor deste trabalho, enaltece as possibilidades deste tipo de ferramentas para a ciência. “Deste modo, conseguimos demonstrar a utilidade de algo comum a todos nós, as redes sociais, como uma ferramenta científica que não deve ser subvalorizada”, refere o estudante.

O investigador Pedro Morais remata com entusiasmo a ânsia de saber mais sobre os gigantes do mar Algarvio para promover a sua preservação: “Quando me deixo embalar pelo mar e estuários do Algarve lembro-me da frase “Só conservamos o que amamos, só amamos o que compreendemos, e só compreendemos o que nos ensinaram” (Baba Dioum 1968)”. É paradoxal que saibamos mais sobre as correntes e seres microscópios da costa do Algarve do que sobre estes gigantes do mar. O Algarve é também um paraíso para baleias e golfinhos!”