Por fora, tem o aspeto e a textura de um  iogurte “normal”. Por dentro, apresenta um alto teor em ómega-3 graças à inclusão, pioneira, de uma microalga rica em DHA, um ácido gordo bioativo com reconhecidos benefícios para a saúde cardiovascular e neurológica. A informação podia estar no “rótulo” do AURA, o iogurte que nasceu de uma colaboração inédita entre investigadores do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade do Porto (CIIMAR-UP) e do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), e que pode constituir uma alternativa mais sustentável e ecológica às necessidades alimentares da população.

A obtenção de ácidos gordos do tipo ómega-3 na alimentação humana está atualmente dependente, em grande parte, da inclusão de peixe na dieta. Este facto, aliado ao crescimento da população humana (seremos 10 biliões em 2050), gera uma dependência problemática e crescente na sobre-exploração dos recursos piscícolas. A formulação de alimentos ricos em DHA proveniente de fontes alternativas ao peixe representa por isso um benefício para a saúde e um contributo para a sustentabilidade da humanidade no nosso planeta.

Foi precisamente a pensar nisso que a equipa do CIIMAR e do IPMA utilizou, pela primeira vez, a microalga Aurantiochytrium sp. como nutracêutico na preparação de um alimento funcional – neste caso um iogurte – com alto teor de DHA.

Na verdade, este estudo nasce do reconhecimento do extraordinário potencial nutricional do microalga Aurantiochytrium sp., em particular, a sua riqueza em DHA, que atinge  teores de mais de 25 % na biomassa seca. Segundo Narcisa Bandarra,

“Os resultados obtidos mostram que há um potencial de desenvolvimento deste tipo de alimentos funcionais enriquecidos com a microalga Aurantiochytrium sp.”, destaca a investigadora Narcisa Bandarra e líder deste estudo que nasce do reconhecimento do “extraordinário potencial nutricional” da microalga e, em particular, da sua riqueza em DHA, que atinge  teores de mais de 25 % na biomassa seca

Uma fonte de saúde

Publicado recentemente na revista Food & Function, o estudo – intitulado “The development of a novel functional food: bioactive lipids in yogurts enriched with Aurantiochytrium sp. Biomass” – mostrou assim a viabilidade da criação de um alimento funcional inovador preparado a partir de iogurte magro, com características sensoriais aceitáveis e alto teor em DHA, através da incorporação de apenas 2 % p/p da biomassa da microalga Aurantiochytrium sp.

Mas os resultados não se ficam por aqui. O trabalho permitiu ainda avaliar o valor nutricional deste novo alimento e determinar a sua digestibilidade e bioacessibilidade.“A questão decisiva a que se procurou responder foi, no fundo, a viabilidade da utilização de um iogurte funcional enriquecido com biomassa de Aurantiochytrium sp. como uma fonte adequada de DHA e outros bioativos lipídicos”, resume a investigadora do IPMA e do CIIMAR.

A estes objetivos, o estudo responde com resultados muito promissores. Não só o DHA é consistentemente um dos ácidos gordos mais importantes na microalga Aurantiochytrium sp., como o iogurte funcional enriquecido com a biomassa – apelidado de iogurte AURA – apresentou a bioacessibilidade do DHA necessária para cobrir as necessidades do organismo neste nutriente.

O estudo conclui ainda que o consumo diário de 125 ml deste iogurte pode ser recomendado como fonte de uma grande parte dos benefícios de DHA para a saúde humana.

Desafios para o futuro

Apesar de terem demonstrado que a digestibilidade da microalga e a bioacessibilidade dos seus componentes bioativos são substanciais, a equipa do CIIMAR/IPMA acredita, contudo, que ainda existe uma clara margem de progressão.

Segundo os investigadores, um aumento na taxa de incorporação de Aurantiochytrium sp. – de 2 % p/p para 3 % p/p – poderia levar a uma maior ingestão de DHA, ainda que a análise sensorial desaconselhe esta estratégia.

Estudos futuros permitirão compreender a melhor maneira de aumentar a ingestão de DHA com a mesma porção de iogurte através da exploração de formas de atingir maior bioacessibilidade lipídica no novo alimento. Estas poderão incluir a emulsificação da gordura ou o pré-tratamento da biomassa de Aurantiochytrium sp. antes de sua incorporação na formulação do iogurte.