É a primeira vez que o fenómeno é registado, como destaca a revista Nature: Paulo Garcia, investigador da Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP), mediu as colunas de matéria que formam as “estrelas-bebé”, com a ajuda do GRAVITY, o instrumento mais poderoso alguma vez construído para telescópios terrestres situado no European Southern Observatory (ESO), no Chile. Estas colunas de matéria ligam grandes discos de matéria às estrelas no seu centro. “É nestes discos que se formam planetas. O nosso sistema solar passou por um processo semelhante há 5 mil milhões de anos”, esclarece Paulo Garcia.

Para a comunidade científica, as “estrelas-bebé” acumulam matéria durante a sua infância. Este processo aumenta a massa final das estrelas adultas como o nosso Sol. O mecanismo mais promissor para a acumulação de massa está ligado à magnetização das “estrelas-bebé”. “Grandes arcos de campo magnético ligam a estrela ao disco. É ao longo destes arcos que a matéria cai do disco para a estrela”, admite o professor do Departamento de Engenharia Física da FEUP. O estudo publicado na prestigiada revista Nature ajuda a compreender melhor este fenómeno, assim como os discos que cercam estas “estrelas-bebé” formam planetas.

Mas como se chegou aqui? Paulo Garcia, que é também membro da unidade de investigação CENTRA, efetuou as medições e desvenda um pouco do ambiente que se viveu no deserto do Atacama (Chile), onde se situa o European Southern Observatory: “A missão aos telescópios foi cheia de emoções. Nas noites anteriores à medição as condições meteorológicas estavam complicadas. O pôr-do-sol era espetacular, mas não se conseguia medir. Na noite em que conseguimos, foi uma enorme excitação detetar um sinal. À medida que o tempo passava e acumulávamos mais medições vimos que o sinal era mesmo real e que estava presente em vários telescópios ao mesmo tempo”, relata Paulo Garcia.

Primeiro passo para desvendar formação de estrelas

A “estrela-bebé” que foi estudada é umas das mais próximas do planeta Terra e encontra-se na constelação da Hidra, a maior constelação no céu visível no hemisfério Sul. Uma das autoras do estudo, a cientista Rebeca Garcia Lopez que trabalha no University College de Dublin, na Irlanda, acredita que “esta estrela é especial porque se encontra perto (a apenas 196 anos luz da Terra) e vemos o seu disco de frente. Isto torna-a ideal para estudar como o material flui do disco para a estrela.”

Apesar das escalas serem gigantescas, as colunas têm lugar a distâncias da ordem do raio da estrela (as enormes distâncias a que estes objetos se encontram do planeta Terra obrigam a instrumentação muito precisa). Mercedes Filho, investigadora da FEUP e do CENTRA e co-autora do estudo explica que “a interferometria é uma tecnologia de medição que combina vários telescópios. Na prática cria-se um super-telescópio cujo tamanho é da ordem das separações entre os telescópios. Este super-telescópio permite ver detalhes dezenas de vezes mais finos do que um telescópio isolado.”

António Amorim, cientista da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa que faz parte da equipa do CENTRA, juntamente com Paulo Garcia e Mercedes Filho, admite que apesar destes resultados alcançados, há ainda muita matéria para desvendar: “O telescópio Kepler detetou uma enorme população de planetas muito perto da estrela central, em contraste com o Sistema Solar. Ainda não se sabe como esses planetas se acumularam nessa região. Este estudo parece indicar que o magnetismo estelar contribui para criar uma região que para a migração dos planetas. Futuras medições com o instrumento GRAVITY permitirão explorar mais esta questão em aberto”.