Mais do que uma necessidade, torna-se uma urgência e um ato de justiça histórica e social investigar e divulgar a produção artística e intelectual das mulheres que foi intencionalmente esquecida ou desvalorizada durante séculos. É também, claro, um gesto político em si mesmo. O mesmo que, durante três dias, de 30 de junho a 2 de julho, vai juntar mais de 30 oradores em formato presencial – no Auditório da Casa Comum (à Reitora) da Universidade do Porto e na Casa-Museu Abel Salazar (CMAS) – e online, com a missão de trazer à luz as Espessuras da [In]Visibilidade: Espaços, Passos e Ritmos, partilhando atividades de investigação desenvolvidas em Portugal, no Brasil em Espanha e França.

“Detalhes” de uma história esquecida, o seminário…

Entre memória e a imaginação: as mulheres, história alternativa e detalhes esquecidos é o título da conferência de abertura, que ficará a cargo de Ana da Silveira Moura, do LAQV-REQUIMTE da U.Porto. A moderação caberá a Maria de Fátima Lambert, coordenadora do Mestrado Património, Artes e Turismo Cultural e da linha de investigação de Cultura, Arte e Educação — InED (FCT)/ESE-P.Porto.

Durante três dias (ver programa completo), vão estar em cima da mesa temas como as Trajetórias de Resistência nas artes; Bruxas e descolonizações e as Mulheres na Era Digital. Serão também apresentados projetos como o Banco de recursos de artes visuales en el Proyecto Women’s Legacy de Amparo Alonso-Sanz (CREARI, U. Valência), o PORTO FEMME  (International Film Festival XX ELEMENT PROJEC) , o projeto curatorial ‘LA VIE INVISIBLE’ (Centre Photografique D’Île de France, Pontault-Combault) e ainda o projeto artístico Quando EU Grito, Quem Me Ouve?. Marca ainda presença o Coletivo Hera: Curadoria Independente e Inclusiva de Arte Contemporânea no Porto.

Entre os nomes que vão passar pelo seminário destacam-se, entre outros, os de Laura Castro, Diretora Regional de Cultura do Norte,  Pedro Sena-Lino, biógrafo, poeta e ficcionista; Ana Dinger, doutoranda em Estudos de Cultura e coreógrafa, ou Marinela Freitas, docente da Faculdade de Letras da U.Porto (FLUP) e membro da Direção do Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa (ILCML), onde coordena a linha de investigação Intersexualidades.

O primeiro dia do seminário incluirá ainda o lançamento do livro Musas em Ação: personalidades, ideias e obras I, com apresentação de Gabriela Vaz Pinheiro, professora da Faculdade de Belas Artes da U.Porto (FBAUP).

… e o seu contexto

Durante o século XX, os Estudos de Género e os Estudos Feministas dedicaram-se, entre outras coisas, às práticas e teorias artísticas desenhadas, pensadas e geradas por mulheres. Surgiram centros de Investigação específicos; conceberam-se projetos de investigação, eventos científicos, programações culturais e artísticas e as publicações proliferaram nas revistas e volumes específicos. Um conjunto de textos foi produzido, incentivando pesquisas e conjugando autores/as de diversas gerações e nacionalidades, em Portugal, à semelhança do que aconteceu no panorama internacional.

As mulheres-pensadoras-investigadoras-autoras-artistas aprofundaram problemáticas, refletindo as suas convicções, mas, no entanto, questiona-se a extrapolação estereotipada do termo “mulheres-artistas”, “mulheres-…”, entendido como limitativo ou como o reconhecimento de uma obra ou atividade profissional como sendo o reconhecimento da “questão de género”, mais do que pela qualificação em si. As ideias entrecruzaram-se e tomando um corpo plural pela ação de profissionais de várias artes, investigadoras e pensadoras ativas como: Griselda Pollock, Linda Nochlin, Frances Borzello, Hilary Robinson, Catherine de Zegher, Fiona Carson, entre outros nomes.

Recuperar e lançar um novo olhar sobre esse legado é precisamente o objetivo desta terceira edição do seminário das Musas em Ação – Espessuras da [In]Visibilidade: Espaços, Passos e Ritmos, uma iniciativa da Casa Comum da U.Porto e do ILCML, em parceria com o InED (Centro de Investigação e Inovação em Educação) da ESE – Politécnico do Porto.

Com entrada livre, mas sujeita a inscrição prévia, este evento dá continuidade às apresentações iniciadas em outubro de 2019, articulando-se ao Projeto de Investigação InED-FCT: A [In]Visibilidade da Mulher na História: pensamento, ideias e obras.

A exposição 

Ainda no âmbito do seminário, vai inaugurar, no dia 2 de julho, pelas 16h00, na Casa-Museu Abel Salazar (CMAS), a exposição Musas em ação nas viagens, com curadoria de Maria Fátima Lambert .

Vamos recuar um pouco no tempo para conhecer o atelier-escola do Mestre Artur Loureiro. Antigo aluno da Academia Portuense de Belas Artes (precursora da FBAUP), Artur Loureiro (1853-1932) viveu em Paris e frequentou a École des Beaux-Artes, onde foi discípulo de Cabanel. Expôs no Salon parisiense (de 1880 a 1882), ao lado de artistas como Marques de Oliveira, Silva Porto, António Ramalho, Sousa Pinto, Columbano e João Vaz, e na Galeria Goulpil, em Londres.

Paisagem não datada do Mestre Artur Loureiro. Faz parte do acervo da CMAS. (Foto: DR)

Artur Loureiro viveu ainda na Austrália, onde a sua obra obteve reconhecimento internacional, e regressou ao Porto no início do século XX. Na Invicta, criou um atelier-escola, localizado no rés-do-chão na ala esquerda do extinto Palácio de Cristal, que era frequentando por jovens meninas da cidade com aspirações artísticas ou porque a prática correspondia a modelos educacionais de um determinado posicionamento intelectual.

Expostos, nas mesas-vitrines, vamos encontrar ainda recortes de jornais de 1931, o catálogo da 18ª exposição no Palácio de Cristal, desenhos das alunas e elementos gráficos afins. São pequenas incursões até às primeiras “classes” de alunas que não desenvolveram carreiras profissionais artísticas e que representam a mentalidade da época.As paredes vão também expor pinturas das alunas do Mestre Artur Loureiro.

Os visitantes terão ainda cesso a testemunhos, breves apontamentos (desenho), aguarelas e pinturas identificadas no contexto de um microprojeto para o levantamento e estudo de diferentes gerações de alunas-artistas de Mestre Artur Loureiro, integrado no projeto A [in]visibilidade da mulher na História (da Arte) – pensamento, obras e ações  (INED-FCT/ESE-P. Porto).

A abertura da exposição será assinalada com uma conversa que juntará Maria Fátima Lambert, Maria João Vasconcelos, ex-diretora do Museu Nacional de Soares dos Reis, e Susana Barros, Coordenadora Executiva da CMAS.