E se cada aluna/o em Portugal pudesse dizer “Eu já conheci um/a cientista”? E se estes pudessem, por sua vez, partilhar a sua experiência no espaço onde deram os primeiros passos do seu percurso académico?… Foi para tornar estes “ses” em realidade que Joana Moscoso, antiga estudante e investigadora da Universidade do Porto, e a sua Native Scientist idealizaram o @ Cientista Regressa à Escola, um programa educativo que visa combater a baixa literacia científica e a desigualdade de acesso à Ciência.

Lançado esta quarta-feira, 8 de setembro, Dia Internacional da Literacia, este novo programa de enriquecimento curricular – que conta com o apoio da U.Porto – assenta numa premissa tão simples quanto inovadora: “dar aos alunas e alunos do 4.º ano de escolaridade a oportunidade, única e inesquecível para muitas/os, de conhecerem e interagirem de perto com um/a cientista“.

Na prática, o foco passa por “aproximar crianças e cientistas, promovendo o regresso destes à sua escola primária, à sala de aula onde aprenderam o ABC e o 1+1 são 2”. Para o efeito, cada cientista participante é desafiado a visitar a sua escola primária durante um dia inteiro e partilhar, de forma lúdica e interativa, conceitos científicos relacionados com o seu trabalho.

“Queremos levar a ciência aos finalistas do 1º ciclo do ensino básico”

Ao criarem este programa, Joana Moscoso e as restantes fundadoras do projeto (Joana Bordalo e Matilde Gonçalves) assumem como objetivos fomentar a literacia e a cultura científica na sociedade portuguesa, aproximando ao mesmo tempo a ciência da sociedade e ancorando o projeto a conceitos tão importantes como a humanização da ciência e a educação circular.

“Há estudos e relatórios que indicam que muitas alunas e alunos perdem o interesse pela ciência ou catalogam a ciência como “difícil” muito cedo no seu percurso escolar, por volta dos 10 e os 12 anos. Por isso, queremos levar a ciência aos finalistas do 1º ciclo do ensino básico”, explica Joana Moscoso,

“O objetivo é que alunas e alunos sintam a utilidade e a relevância da ciência desenvolvida por pessoas que já foram crianças ‘como elas e eles’ e ‘até’ frequentaram a mesma escola”, acrescenta a investigadora e cofundadora da Native Scientist,

O @ Cientista Regressa à Escola surge, de resto, na sequência da expansão da empresa sem fins lucrativos criada em 2013, no Reino Unido, por Joana Moscoso (ver percurso abaixo) e outra investigadora portuguesa. A missão da Native Scientist passa por criar pontes entre crianças e cientistas, reduzir desigualdades e promover o ensino superior.

Como participar?

Para participar no @ Cientista Regressa à Escola, os cientistas interessados terão de fazer investigação em qualquer área do conhecimento, numa instituição científica nacional ou internacional, e ter frequentado o 1º ciclo do Ensino Básico (isto é, a escola primária) em Portugal.

“Uma vez recebidos os registos de cientistas e docentes através do website do programa, o emparelhamento entre cientistas e docentes será feito e comunicado atempadamente por email aos registados. Todas as pessoas inscritas e emparelhadas terão a formação e o apoio logístico necessários à realização das oficinas”, explica Joana Moscoso.

Alicerçado numa lógica de sustentabilidade, o programa junta crianças e cientistas da mesma terra natal e pretende alargar o seu alcance todos os anos até todas as turmas do 4º ano poderem participar anualmente. Para tal, a adesão de cientistas e docentes é essencial. No primeiro ano, o programa pretende contar com a participação de cerca de 750 estudantes e perto de 15 – 30 cientistas e docentes. Com o evoluir do projeto, para chegar a todas as turmas do 4º ano o programa prevê contar com o envolvimento de cerca de 4 mil cientistas anualmente.

Para as três fundadoras do projeto, “são objetivos ambiciosos e arrojados, mas acreditamos que com boas parcerias e com o apoio da sociedade portuguesa os podemos alcançar.”

Sobre Joana Moscoso

Natural de Valença, Joana Moscoso licenciou-se em Biologia pela Faculdade de Ciências da U.Porto (FCUP) em 2007. No último ano do curso partiu para a Universidade de Umeå, na Suécia, onde realizou o estágio final ao abrigo do programa Erasmus. Iniciava assim um percurso internacional que, em 2008, a levaria até à Australian National University, em Camberra (Austrália). Em 2009, ingressou no Imperial College (Londres), onde completou o doutoramento (2013) e se especializou no estudo de bactérias.

Por terras britânicas, Joana Moscoso destacou-se desde cedo na organização de eventos e atividades direcionadas para a divulgação científica no âmbito do MRC Centre for Molecular Bacteriology and Infection, tendo colaborado ainda na PARSUK, uma rede de investigadores e estudantes portugueses no Reino Unido. Em 2013, em conjunto com outra investigadora portuguesa, fundou a «Native Scientist», uma empresa sem fins lucrativos que usa a ciência como veículo para a aprendizagem de línguas e cujo público-alvo são crianças dos 7 aos 12 anos.

(Foto: DR)

Em 2016, e já com vários prémios no currículo (entre os quais o «Microbiology Outreach Award» da Society for General Microbiology, ou o «Estabilished Researcher Prize» da Royal Society of Biology), Joana Moscoso conquistou uma Marie Sklodowoska-Curie individual fellowship que lhe permitiu regressar ao Porto e à Universidade, mais concretamente ao i3S – Instituto de Investigação e Inovação em Saúde. Ali, desenvolveu, durante dois anos, o seu segundo projeto de pós-doutoramento, focado no estudo da bactéria Listeria.

Durante este período, foi reconhecida com o prémio «MIT Innovators Under 35»  – categoria “Humanitarians” – pelo trabalho em comunicação de ciência desenvolvido através da Native Scientist.

Mais recentemente, o percurso de Joana Moscoso está ligado a iniciativas como a Chaperone, uma plataforma de aconselhamento de carreira direcionada especialmente para cientistas da qual é cofundadora, ou as Cartas com Ciência, um projeto internacional de combate às desigualdades na educação em ciência, destinado a crianças e jovens entre os 11 e os 18 anos.