O lince ibérico é o felino mais ameaçado do mundo. (DR: Héctor Garrido/CSIC Andalusia Audiovisual Bank)

Uma equipa de investigadores internacionais liderada por Miguel Araújo, investigador do CIBIO – Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos/InBIO Laboratório Associado, concluiu que os esforços para proteger o felino mais ameaçado do mundo poderão ser comprometidos, caso os efeitos das alterações climáticas não sejam considerados na definição de estratégias de reintrodução da espécie. Estas conclusões foram publicadas recentemente na prestigiada revista internacional Nature Climate Change.

O Lince Ibérico é o felino mais ameaçado do mundo, estimando-se que existam atualmente menos de 300 indivíduos em ambiente natural. Os recentes declínios no número destes animais têm estado associados a reduções acentuadas nas populações regionais da sua principal presa: o coelho-bravo. Estas devem-se, principalmente, a duas doenças que afectam a espécie: a mixomatose e a doença hemorrágica viral. Nos anos 90, tinha-se conhecimento da existência de nove populações de lince ibérico; atualmente, apenas persistem duas na natureza.

Embora a abundância das populações de lince tenha aumentado nos últimos dez anos em resposta à gestão intensiva da espécie, o estudo adverte que as estratégias de conservação em curso poderão garantir apenas algumas décadas de sobrevivência, antes que a espécie desapareça. “O nosso estudo mostra que as alterações climáticas podem levar a um rápido e severo declínio na abundância do lince ibérico nas próximas décadas, e provavelmente à extinção desta espécie na natureza dentro de 50 anos”, refere Damien Fordham, um dos membros desta equipa. De acordo com este investigador, “os atuais esforços de gestão poderão ser inúteis se não tiverem em conta os efeitos combinados das alterações climáticas, uso da terra e abundância de presas na dinâmica populacional do lince ibérico”.

Miguel Araújo explica que  este estudo é o “primeiro a modelar explicitamente interacções tróficas de espécies, tais como predadores e presas, num cenário de alterações climáticas”.  Segundo o investigador, os modelos usados até agora para investigar a forma como as alterações climáticas vão afectar a biodiversidade, “têm sido incapazes de capturar o feedback dinâmico e complexo das interacções que se estabelecem entre espécies. Através do desenvolvimento de novos métodos de previsão, conseguimos, pela primeira vez, simular respostas demográficas de lince ibérico a padrões de abundância de coelho-bravo condicionados por doenças, alterações climáticas e mudanças no ordenamento do território”.

Os resultados da aplicação deste modelo, no entanto, trazem novos motivos de preocupação. “É provável que o habitat no sudoeste da Península Ibérica, onde persistem duas populações de lince ibérico, se torne inóspito para a espécie em meados deste século”. “Naturalmente há incertezas sobre as alterações futuras do clima, especialmente em termos de impactos regionais”, explica Miguel Araújo. “No entanto, se os conservacionistas estão a pedir aos governos para mudar as suas políticas macroeconómicas de forma a mitigar a mudança climática, é difícil entender porque razão ainda é dada uma atenção limitada às alterações climáticas em programas de conservação de espécies. A necessidade de decisões de conservação que tenham em conta o clima encontra-se bem disseminada e deveria fazer parte de uma prática comum”, conclui.