O início de 2021 trouxe a confirmação que há muito se ansiava no Departamento de Engenharia Química da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP): a aprovação, pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), da criação do ALICE – Associate Laboratory for Innovation in Chemical Engineering, o novo Laboratório Associado que resulta da vontade de otimizar sinergias entre as três unidades de investigação já existentes no departamento (LEPABE, LSRE-LCM e CEFT).

Com esta associação, já sedimentada com várias parcerias internas, “tornamo-nos no maior Laboratório Associado Português em Engenharia Química, com uma intervenção muito relevante nas áreas de Engenharia do Ambiente e da Bioengenharia”, adianta Arminda Alves, coordenadora do ALICE, sobre o culminar de uma estratégia iniciada em 2019, quando as três unidades de investigação decidiram avançar para uma candidatura conjunta que lhes permitisse ganhar escala e com isso a possibilidade de aumentar a visibilidade e a projeção internacional há muito reivindicadas.

“O ALICE é mais que uma soma das partes. Junta competências complementares para potenciar uma abordagem integrada dos problemas societais”, continua a professora catedrática da FEUP. E que desafios são estes? “Digamos que a indústria química faz parte do problema mas também da solução”, assegura. Até porque as grandes associações europeias da indústria e da academia ligadas à Engenharia Química já há muito que apontam como as áreas prioritárias onde intervir à escala global a descarbonização das indústrias tradicionais, tornando-as mais eficientes, o que obriga ao redesenho de processos, e a melhoria da eficiência dos recursos, implicando uma  redefinição da engenharia, onde por exemplo a biotecnologia e a nanotecnologia assumem papeis relevantes.

Os 370 investigadores que integram o ALICE e sobretudo os recentes indicadores de performance – que reconhecem alguns dos membros como líderes internacionais nas suas áreas – permitem encarar o futuro com muito entusiasmo e um elevado sentido de responsabilidade.

“Acredito que uma abordagem integrada recorrendo às competências reunidas pelo ALICE e envolvendo o redesenho dos processos industriais, a integração dos conceitos de eficiência, novas alternativas energéticas, conceitos de economia circular e gestão dos recursos, são as chaves do sucesso do desenvolvimento sustentável mundial”, vaticina Arminda Alves.

Indicadores de Performance

Além da excelência na ciência que é a base de sustentação da inovação, o dinamismo na colaboração com as empresas, em particular da região Norte, está refletido nos 45 contratos com a indústria e os 28 projetos ANI em co-promoção celebrados nos últimos cinco anos pelo LEPABE, LSRE-LCM e CEFT da FEUP. Na parceria com associações, duas assumem particular destaque: a APQuímica, a maior associação de empresas do sector e instituições, responsável pelo Cluster de Competitividade da Petroquímica, Química Industrial e Refinação e a ARCP – Associação Rede de Competências de Polímeros cuja direção técnica está a cargo de um membro integrado do ALICE.

Quanto à vertente de inovação e transferência de tecnologia, das 25 famílias de patentes registadas nos últimos cinco anos, importa destacar a patente vendida pelo valor mais elevado – 5 milhões de euros – em Portugal  (em células solares) e a patente NETMIX atualmente em uso pela GALP (via Colab NET4CO2). E a participação em 4 Colabs – NET4CO2, VG COLAB, MORE e BIOREF (os dois primeiros ao nível da criação e direção técnica).

São 20 anos de investigação e com resultados ao mais alto nível que se traduzem nos 44 milhões de euros « de financiamento captado para a Faculdade de Engenharia nos últimos anos pelas três unidades que compõem o ALICE. Destes, 5 milhões resultam de projetos europeus (13 deles liderados pela FEUP). Mais recentemente, o consórcio viu aprovadas mais cinco candidaturas ao Projetos Integrados da CCDR-N, correspondentes a um financiamento global de cerca de 1,5 milhões de euros. Uma vez mais, o ALICE sobressai: dos 15 projetos de investigação da U.Porto (12 dos quais de cariz multidisciplinar) aprovados, três são liderados pelo consórcio.

Ainda nos indicadores de performance, importa realçar que alguns dos membros e grupos do ALICE são reconhecidos como líderes internacionais nas suas áreas. Há uma posição consolidada em todos os rankings na área de Engenharia Química, ocupando o primeiro lugar a nível nacional, no top-20 europeu e no top-100 mundial. O último ranking da Universidade de Stanford, reconhecendo os top 2% investigadores do mundo nas suas áreas, coloca 20 investigadores do Departamento de Engenharia Química da FEUP na lista dos mais influentes/citados a nível mundial.

“Temos de facto um track-record impressionante atendendo à nossa relativa dimensão reduzida em termos de professores universitários que ao mesmo tempo aliam a atividade de formação com a atividade científica e tecnológica, e ainda de gestão. Também julgamos que partilhamos estes valores de elevada exigência com os mais jovens e a prova é que estes, mesmo com posições não permanentes, já figuram nos rankings internacionais”, assegura Arminda Alves.

A aposta nas carreiras científicas

Na génese de todo este trabalho estão as pessoas e a qualidade do trabalho que desenvolvem diariamente nos laboratórios da Faculdade de Engenharia. E para conseguir corresponder à elevada competitividade internacional da engenharia química é fundamental garantir condições para que as novas gerações possam evoluir. É um dos objetivos para os próximos anos na gestão do ALICE: a estabilização e promoção do emprego e carreiras científicas o que permitirá de forma sustentável o desenvolvimento das linhas estratégicas definidas para o novo Laboratório Associado. E isso passará necessariamente pela contratação de investigadores doutorados de forma permanente.

Até 2017, o número total de 120 investigadores doutorados manteve-se relativamente estável, com grande preponderância dos bolseiros de pós-doutoramento. Iniciou-se depois a transição das bolsas de pós-doutoramento para contratos de investigadores. Contudo, é de salientar o número significativo de investigadores doutorados com contratos temporários há mais de cinco anos: 42.  Destes, 13 têm contratos há mais de 10 anos e podem ver agora a sua situação contratual melhorada e estabilizada.

Arminda Alves acredita que esta aposta vai certamente proporcionar a concretização de outro grande objetivo do ALICE, a “criação de uma plataforma tecnológica de serviços na área da engenharia química, biológica e ambiental”, através de uma infraestrutura já planeada para os novos edifícios da FEUP.

Esta estrutura irá consolidar a atividade que as unidades de investigação do DEQ têm vindo a registar como crescente e relevante para a competitividade nacional do tecido empresarial, a disponibilização de uma forma rápida e eficaz de serviços para a indústria da região norte, permitindo: promover a interface com a indústria; desenvolver equipamentos e soluções para testes à escala piloto; prestar serviços analíticos de elevada complexidade; e realizar consultoria científica e técnica em áreas de ponta.

A internacionalização da investigação

O maior laboratório associado em engenharia química em Portugal pretende contribuir para o conhecimento científico e para o desenvolvimento de processos e produtos inovadores de uma forma sustentável e eficiente.

Para isso, o ALICE estará organizado em cinco linhas temáticas alinhadas com os grandes desafios societais que funcionam de modo transversal: a Indústria Química e os seus grandes desafios relacionados com a descarbonização da indústria, a intensificação, a modelação e simulação dos processos; a Bioindústria, onde se agrupa a biotecnologia alimentar e marinha, bem como os biofilmes; os Materiais, com foco estratégico nos materiais de carbono, os polímeros de base natural e as micro e nanoestruturas de aplicação cosmética, nas áreas da saúde e alimentar; a Energia, envolvendo as apostas estratégicas nacionais de eficiência energética e conforto térmico com destaque para a conversão e armazenamento de energia de fontes renováveis, e a produção e armazenamento de hidrogénio verde; o Ambiente, que abrange a monitorização e avaliação de risco de compostos emergentes, os tratamentos avançados de águas e correntes gasosas e os resíduos e recursos endógenos.

Na opinião de Arminda Alves, o Programa Horizonte 2020, permitirá enquadrar estes desafios societais em áreas do ALICE onde existe já um reconhecimento internacional e participação em redes, nas 5«cinco missões – adaptação às alterações climáticas;  cancro;  oceanos, mares e águas costeiras e interiores saudáveis; cidades inteligentes com impacto neutro no clima;  e saúde dos solos e alimentação. Mas surge agora “uma janela de oportunidade através das colaborações existentes com as empresas que se vão candidatar ao Plano de Recuperação e Resiliência, no domínio da transição climática, em que nós felizmente temos intervenção e reconhecimento nacional nos eixos prioritários: Eficiência Energética e Renováveis, Descarbonização e Bioeconomia e Mobilidade Sustentável”, perspetiva a professora catedrática da FEUP.

“Nos últimos cinco anos asseguramos um financiamento de projetos europeus de 5,1 milhões de euros. Pretendemos crescer mais contidamente nos próximos cinco anos, devido às consequências da pandemia na economia (apontamos para 6,1 milhões de euros), e depois de termos a atividade sedimentada crescer mais significativamente nos próximos 10 anos.”

Os membros do ALICE

Dos 370 investigadores que integram o ALICE, cerca de 90% desenvolvem a atividade nas três unidades de investigação que compõem o Departamento de Engenharia Química da FEUP.

O CEFT, liderado pelo docente da FEUP João Campos, é uma unidade de investigação transversal, contando também com investigadores do Departamento de Engenharia Mecânica da faculdade.

O LEPABE, liderado por Arminda Alves, inclui membros integrados dos Politécnicos do Porto, e de Viseu e do Departamento de Engenharia Metalúrgica e Materiais da FEUP.

O LSRE-LCM, que já era Laboratório Associado, liderado por Madalena Dias, numa estratégia de cooperação transregional tem um polo no Instituto Politécnico de Leiria, que age neste Laboratório Associado como instituição de acolhimento parceira.

Os responsáveis pelo ALICE salientam ainda o apoio da Universidade do Porto e do Instituto Politécnico de Leiria, bem como da Faculdade de Engenharia em todo o processo de candidatura.