Miguel Januário, mais conhecido por ± (Mais Menos), Rafi die Erste e Gonçalo Mar são alguns dos artistas com presença confirmada na conferência internacional A arte saiu à rua: a tutela jurídica do graffiti, que vai ter lugar no próximo dia 18 de novembro, quinta-feira, na Faculdade de Direito da U.Porto (U.Porto).

A prática do graffiti movimenta-se numa zona de contágios entre diferentes disciplinas. “Há mais perguntas do que respostas”, reconhece Maria Raquel Guimarães, responsável pela coordenação do evento.

Da Economia ao Direito e da Sociologia ao Marketing, da propriedade intelectual à criminologia e da publicidade à inclusão social, dia 18 de novembro será, então, o dia de lançar todas as dúvidas e procurar pelas respostas.

Artista ou mercenário?

Talvez a imagem da coruja ainda esteja presente na memória de alguns. Aqui e ali, foi surgindo sucessivamente e pontuando as paredes da cidade, ao lado de tantas outras expressões artísticas. A questão é que a intenção do gesto a montante da obra fazia toda a diferença. Através da capa de uma manifestação artística irreverente e alternativa, algum tempo depois percebemos que, afinal, estávamos a assistir à campanha publicitária de uma marca de cerveja.

Camuflada, era apenas mais uma estratégia de Marketing. Ora, estando o mercado publicitário regulamentado e claramente identificado para que o público tenha plena noção de que o que está a ver é, efetivamente, publicidade, como regulamentar esta utilização subversiva da linguagem artística para fins puramente comerciais? Entre uma arte livre e uma arte mercenária: Onde e como se estabelece a fronteira é o título da apresentação de António José Monteiro de Oliveira (ISCAP/CEI) sobre street art e publicidade que, logo às 9h30, dá início ao congresso.

Intervenção de Miguel Januário na cidade de Gaia. (Foto: Egidio Santos / U.Porto)

“Ireis pagar pobre povo, nação doente e mortal”

“Pague leve, leve mente”; “In goods we trust”; “Poupe água, assim podemos jogar golfe”; “Antiga mui gourmet, sem plano social e turística cidade do Porto”; “Ireis pagar pobre povo, nação doente e mortal, leiloai hoje de novo, o ex-valor de Plutogal, entre as lacunas da memória, ó Pátria sente-se atroz, o sortilégio imposto a vós, que há-de reduzir-te à história, às lamas, às lamas, se sobrar terra e sobrar mar, às lamas, às lamas, contra os barões lutar, lutar”… Estas são algumas das intervenções de rua de um artista com assinatura ±. Mais ou menos legal é a apresentação que Miguel Januário irá partilhar durante a tarde de dia 18 de novembro.

Licenciado em Design de Comunicação pela Faculdade de Belas Artes da U.Porto (FBAUP), este artista ativista, mais conhecido por ± (Mais Menos) tem, ao longo do seu percurso, desenvolvido uma reflexão bastante crítica sobre os modelos políticos, económicos e sociais das comunidades onde se insere.

Reconhecido pela forte intervenção urbana, Miguel Januário tem a sua obra espalhada por diversas cidades do Mundo.

Intervenção de Miguel Januário, ou ± (Mais Menos), na cidade do Porto. (Foto: Egidio Santos / U.Porto)

O Direito à cidade

Mais do que refletir questões sociais ou políticas, pode a arte urbana servir para projetar a identidade e unir povos? Nascida no Porto, Rafi die Erste (ou Teresa Rafael) é um nome em ascensão no panorama da arte urbana em Portugal e vem à FDUP falar de inclusão social.

Em parceria com a Delegação da União Europeia em Cabo Verde, a artista trabalhou com raparigas jovens com quem, através da partilha de experiências e a tomada de consciência de questões de identidade e valor-próprio, construiu uma figura feminina que transformou em mural, num bairro da cidade da Praia, marcado por casos de insucesso escolar e gravidez juvenil. Chamou-lhe Projeto Espelho. Vai replica-lo em Portugal, com jovens da cidade da Maia. Referências diferentes vão criar interpretações diferentes da figura feminina. O mesmo processo servirá para que jovens de um lado e do outro discutam maneiras de viver, problemas e formas de os ultrapassar.

A razão prática do graffiti numa leitura da contemporaneidade — estudo de caso: Da teoria à prática | Bairro de Safende, Cabo Verde é o nome da apresentação de Rafi.

Pelo potencial em fixar a identidade de um povo e pela diversidade de usos e abordagens que permite, as propostas de intervenção pública que partem do terreno têm a capacidade de proporcionar às comunidades rurais não só um maior contacto com a arte, mas também uma reflexão sobre como funciona o processo criativo, a que técnicas recorre a sua função em sociedade. Dessacralizar a arte enquanto prática elitista e inacessível foi o caminho seguido em Mogadouro, localidade que faz parte da Rota da Terra Fria Transmontana. Um circuito de 455 quilómetros que atravessa os municípios de Bragança, Miranda do Douro, Mogadouro, Vimioso e Vinhais e que compõem o cotovelo mais a nordeste de Portugal. As máscaras e as festividades a elas associadas foram o elemento utilizado pelo artista Gonçalo Mar para este projeto, que apresenta ainda o desenho de um gaiteiro na fachada de um edifício que se vê da EN 221. BIEN-ÊTRE – Projeto em Mogadouro será apresentado por Gonçalo Mar e Cristina Mateus, docente da FBAUP

Rafi e o Projeto Espelho, em Cabo Verde. (Foto: DR)

Porquê a FDUP?

Há rotas muito variadas para descobrir. Quem percorre as ruas da cidade não tem como não ver. Nem aos mais distraídos escapam às formas, cores e mensagens que saltam das paredes e nos fazem levantar os olhos do chão. Da Rua Alferes Malheiro, perto da Estação da Trindade, à Rua Miguel Bombarda, passando pela escadaria da Rua do Pinheiro (Rota da Trindade), ou da Rua Álvares Cabral à Rua de Vilar passando pela própria Rua dos Bragas, a Faculdade de Direito está, pela sua posição geográfica, “no centro nevrálgico do graffiti”, como nos explica a também docente da FDUP, Maria Raquel Guimarães.

“Arte ou vandalismo? A partir de que momento se trata de uma obra artística? Ao serviço de quem? Como é que o Direito se move nestas fronteiras? Queremos abordar e cruzar “as várias temáticas em torno desta manifestação artística” e perceber “qual poderá ser o papel do Direito”, acrescenta.

A conferência A arte saiu à rua: a tutela jurídica do graffiti é organizada pelo CIJE — Centro de Investigação Jurídico-Económica da FDUP, em parceria com o CEI (Centro de Estudos Interculturais), a UFRGN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil), e a FMP (Fundação Escola Superior do Ministério Público, Rio Grande do Sul, Brasil).

Inscrições e mais informações aqui.