São fotografias, cartazes, recortes de jornais e capas de vinis de bandas como os GNR, os Taxi e os Trabalhadores do Comércio. Elementos que nos permitem traçar um itinerário do rock português dos anos oitenta. De 8 de abril até 20 de setembro, passa por aí o roteiro de “Uma viagem pelo asfalto” do “rock no Porto nos anos oitenta”, para percorrer a partir da Casa Comum – na Reitoria – da Universidade do Porto. O bilhete é gratuito.

Uma viagem pelo asfalto

Durante a década de 80, a cidade do Porto assistiu ao apogeu das tribos urbanas (dos punks aos rockabillys, passando pelos metaleiros, góticos, urbano-depressivos e skinheads), das fanzines alternativas e das rádios pirata onde se ouviam e descobriam bandas que a agilidade dos dedos permitia gravar em cassete. Assim o gravador estivesse já preparado…

Avançando para uma na sexta-feira à noite, fosse qual fosse o ponto de partida, o mais certo seria, ainda antes dos primeiros raios da manhã, desaguar na zona das Fontaínhas para assistir ao serpentear azul das águas do rio douro, sob a batuta das trocas comerciais da Feira da Vandoma.

Locais como o (Luís) “Armastrondo”, na Ribeira do Porto, ou o “Porto Rock 85”, no Solar da Cruz Vermelha, em Massarelos, eram verdadeiras fontes de pedagogia musical, oferecendo palco e incentivando o surgimento de novas bandas. Numa outra escala, os concertos de maior dimensão ficavam a cargo de espaços como o Pavilhão Infante Sagres, que acolheu concertos de bandas como os Jesus & Mary Chain, Lloyd Coll & The Commotions e Lene Lovich, ou até o Vale Formoso, onde os Psychedelic Furs deram um concerto quase em horário de matiné.

Porto Rock 85. (Foto: Óscar Valério)

Depois da Feira da Vandoma, o circuito (das matinés) diversificava, passando por locais de crescente popularidade, à época, como foi o caso dos Centros Comerciais. De paragem (praticamente) obrigatória, no Dallas, havia o Lá Lá Lá, onde o sabão da casa de banho servia para aprimorar a estrutura capilar, os focos de luz, ainda que à mingua, permitiam continuar a leitura do livro que não se conseguiu abandonar em casa, e se arranjava sempre espaço para erguer os braços e “abrir a pista” ao som de Israel, uma das mais dançáveis músicas dos britânicos Siouxsie and the Banshees.

Subindo a Avenida da Boavista, ao Centro Comercial Brasília, o ponto de encontro seria o Griffon’s (agora com versão revisitada na baixa do Porto), ou então, de regresso ao centro da cidade, o mais certo seria parar no Jimmy’s, à Rua Faria Guimarães, e, mais tarde, descer para a zona da Ribeira e continuar a noite no Aniki (Bobó) e no Meia Cave.

Imagem recolhida no Lá Lá Lá (Foto: Miguel Nogueira)

Onde a busca por uma identidade própria encontrava uma infinidade de possibilidades e a música funciona de veículo de libertação de convenções artísticas, sociais e políticas, estes locais eram plataformas privilegiadas (e partilhadas por todas as tribos urbanas) de descoberta e expansão de horizontes. Sem esquecer ainda a importância de lojas comerciais como a Tubitek que, na ausência de amigos que traziam as novidades de fora do país, eram espaços de aprendizagem e também, diga-se, de maravilhamento e namoro das capas dos discos.

Está tudo aqui! Esta “viagem pelo asfalto” convida a redescobrir uma cidade que “pautada por criadores e ávidos consumidores de pop-rock, de arte e de cultura” encheu o peito de coragem, rasgou o pano puído do provincianismo e partiu à descoberta de si própria. Tribos consumidoras “de liberdade” e “de diferença”, dizem Paula Guerra e David Pontes, os curadores da exposição.

Vindos da asfixia de uma ditadura e com a abertura à europa (CEE). “tudo se tornou possível”. Foram anos de ver crescer “modas, consumos, drogas, noite, prédios, centros comerciais”. Para além do “pop-rock – e seus subgéneros estético-musicais” – multiplicaram-se “novas formas de (des)institucionalizar o acesso e a produção de cultura apelidada de alternativa”. Subculturas de “rebeldes com causas” que ainda hoje “permanecem no nosso lastro imaginativo”.

Sem cânones a insuflar ao medo de errar, predominava o espírito do contributo para fazer surgir algo novo. Dos diferentes cantos da cidade soava o “faz tu mesmo”. Como Rui Reininho cantou, em 1986, “os pós-modernos agarram na angústia /E fazem dela uma outra indústria”.

“Uma viagem pelo asfalto. O rock no Porto nos anos oitenta” inaugura no dia 8 de abril, às 18h30, e ficará patente até 20 de setembro de 2025.

Com entrada livre, a exposição pode ser visitada de segunda a sexta-feira, entre as 10h00 e as 13h00 e das 14h00 às 17h30. Aos sábados, as portas abrem das 15h00 às 18h00.

No website d’O Rock no Porto nos Anos 80, é também possível encontrar álbuns de bandas como Os Entes Queridos, Repórter Estrábico ou Bramassaji, assim como telediscos, testemunhos, vídeos e mais fotografias.