O projeto Famílias Positivas, Crianças Saudáveis (FPCS), desenvolvido pelas docentes e investigadoras da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da U.Porto (FPCEUP) Catarina Canário e Orlanda Cruz, é um dos novos projetos de investigação aplicada apoiados pela iniciativa Growing Minds da Fundação Calouste de Gulbenkian.
O FPCS será implementado até 2027 com o objetivo de disseminar o Standard Triple P (Programa de Parentalidade Positiva). Na senda de estudos anteriores com este programa, implementados pela FPCEUP com financiamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, o novo projeto aposta numa implementação em maior escala: pretende formar profissionais para que, nos próximos três anos, mais de 200 famílias possam beneficiar da intervenção de forma continuada.
Atualmente, estima-se que 8-14% das crianças e adolescentes do mundo apresentem problemas de saúde mental, sendo que 50% das perturbações mentais nos adultos têm início antes dos 14 anos. No entanto, afirma Orlanda Cruz, “a investigação mostra que existe um conjunto de comportamentos e práticas que promovem o desenvolvimento e o bem-estar das crianças – e que se podem encaixar nesse grande rótulo da Parentalidade Positiva”.
“Há quem diga que toda a parentalidade deveria ser positiva, mas na realidade sabemos que tal não acontece em todas as famílias. O que pretendemos com este projeto é ter uma ferramenta que ajude os pais a lidar de forma eficaz com os desafios que as crianças colocam ao longo do seu desenvolvimento”, acrescenta.
Mais valias da Parentalidade Positiva
O Standard Triple P, explica Catarina Canário, “é um programa de intervenção familiar cognitivo-comportamental, enquadrado na teoria da aprendizagem social, que trabalha a competência parental através da autorregulação. A literatura demonstra que os programas com estas características são particularmente úteis para intervir com famílias que têm crianças com problemas de comportamento, problemas emocionais ou outras características que se revelam mais desafiantes no seu desenvolvimento”.
Por ser “um programa de formato individual”, é também “uma mais-valia como ferramenta para trabalhar com as famílias que são encaminhadas para receber este apoio nos serviços da comunidade, como as que estão envolvidas com serviços de promoção e proteção dos direitos das crianças com medidas de apoio junto dos pais, ou outras famílias expostas a outros fatores de vulnerabilidade, como por exemplo, as que beneficiam de apoio económico e/ou social”, aponta a investigadora.
“Sabemos, através da investigação feita anteriormente na faculdade, que o mesmo programa no formato grupo se mostrou eficaz quando dinamizado com mães beneficiárias de rendimento social de inserção, tendo os resultados demonstrado uma diminuição nos problemas de comportamento da criança, a melhoria das práticas parentais e um aumento da autoeficácia e da rede de apoio social das mães que se mantiveram estáveis até um ano após a intervenção”, conclui.
Medir o impacto social
Originalmente criado na Austrália, o sistema de intervenção Triple P integra diferentes programas que estão amplamente disseminados e têm sido implementados em vários países. Um estudo de avaliação económica realizado com dados australianos mostra que o programa Standard Triple P apresenta custo-efetividade no tratamento de perturbações do comportamento.
Outro estudo, com dados da Suécia, revelou que programas com características semelhantes às do Standard Triple P contribuem para a diminuição dos custos com cuidados de saúde e no setor da educação relacionados com a prevenção de problemas de comportamento em crianças de idade escolar.
Segundo Catarina Canário, “as intervenções parentais baseadas na evidência são dispendiosas, mas são também um investimento nos profissionais, nos serviços e nos apoios que são prestados às famílias. Os profissionais ficam mais empoderados; têm uma ferramenta empiricamente validada, com conteúdos estruturados que os apoia na realização do seu trabalho. E nós, com a nossa investigação, para além de querermos saber que resultados tem quando implementada como forma de cuidado habitual com as famílias que frequentam os serviços da comunidade, queremos ter dados para poder informar a tomada de decisão sabendo: por cada euro que investimos neste programa, qual é o retorno?”
Orlanda Cruz acrescenta que, “no fundo, queremos mudar práticas profissionais: disseminar programas, garantir que são utilizados – e que dão este retorno. Em Portugal, as avaliações económicas tendem a centrar-se muito na Medicina e na Farmácia; há pouca tradição de prática baseada na evidência e da avaliação económica a este nível. E isto é, definitivamente, um dos aspetos inovadores do nosso trabalho.”
A formação dos profissionais dos serviços de apoio à família será levada a cabo no mês de março de 2025, na FPCEUP, e contará com a participação de profissionais dos distritos do Porto, Braga, Vila Real e Santarém.