A Fundação “la Caixa” selecionou nove projetos portugueses de investigação biomédica de excelência e com elevado impacto social no âmbito da Convocatória CaixaResearch para a Investigação em Saúde 2024, sendo um deles do investigador Tiago Beites, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S). Centrado no tratamento e erradicação da tuberculose, atualmente a doença infeciosa mais mortal, o consórcio liderado por Tiago Beites vai receber um total de quase 700 mil euros, sendo que 543 mil virão para o i3S.

Responsável pela morte de mais de um milhão de pessoas todos os anos, a tuberculose exige um tratamento longo com a toma diária de múltiplos fármacos, que está associado a efeitos adversos graves, o que dificulta a adesão ao tratamento por parte dos doentes. A interrupção do tratamento contribui em grande parte para a mortalidade da doença e promove o desenvolvimento de resistência a antibióticos. A situação é ainda mais grave em países com economias mais frágeis, onde os antibióticos necessários nem sempre estão disponíveis.

Perante esta realidade, explica o investigador do i3S, “o desenvolvimento de estratégias que possam encurtar a duração do tratamento é, portanto, de extrema importância nos esforços para erradicar a tuberculose”.

O Mycobacterium tuberculosis, a bactéria causadora da doença, gera focos de infeção caracterizados pela acumulação de lípidos. Esta característica, adianta Tiago Beites, “impõe uma pressão seletiva para que o M. tuberculosis utilize os lípidos como fontes de carbono e energia. No entanto, alguns lípidos, como os ácidos gordos livres, são também potentes agentes antimicrobianos”.

Uma vez que os investigadores descobriram anteriormente mecanismos utilizados pelo M. tuberculosis para consumir de forma segura os ácidos gordos livres, a equipa deste consórcio, que inclui também o investigador Robert Jansen da Radboud University (Países Baixos), vai “estudar os mecanismos moleculares que medeiam esta adaptação fundamental ao hospedeiro e identificar alvos terapêuticos promissores que possam ser utilizados para o desenvolvimento de novos medicamentos”.

O Mycobacterium tuberculosis, explica Tiago Beites, “tem co-evoluído com os humanos há milénios. Trata-se de um agente patogénico muito bem-sucedido porque evoluiu para enganar o nosso sistema imunitário de formas muito criativas”. Neste projeto, especifica o investigador, “pretendemos aplicar a mesma estratégia, mas no sentido inverso, vamos nós enganar o M. tuberculosis de forma a que a própria dieta se torne tóxica. É uma estratégia que pode validar novos alvos terapêuticos e, num futuro próximo, aumentar as nossas opções de tratamento num esforço para erradicar a tuberculose”.

Os outros vencedores

Para além do projeto do i3S, a convocatória desta sétima edição do CaixaResearch para a Investigação em Saúde distinguiu outros mais oito projetos liderados por instituições científicas portuguesas, em áreas tão diversas como as doenças infeciosas, oncologia, doenças cardiovasculares e metabólicas e neurociências.  Os nove projetos selecionados receberão um apoio superior a 7,6 milhões de euros.

Entre os projetos distinguidos destacam-se trabalhos que visam modular a ação dos linfócitos T e evitar respostas imunitárias hiperativas; compreender melhor o processo de formação de metástases de tumores da mama para as prevenir; desenvolver a deteção precoce de doenças neurodegenerativas; compreender como o parasita que causa a doença do sono consegue invadir os tecidos; ou desenvolver um tratamento para a doença de Machado-Joseph, uma doença neurodegenerativa hereditária rara.

A cerimónia de entrega destes financiamentos decorreu no dia 12 de novembro, em Madrid, e contou com a presença de representantes da Fundação “la Caixa, da presidente do Conselho Diretivo da FCT, Madalena Alves, bem como dos investigadores e investigadoras responsáveis pelos projetos premiados.

Sobre Tiago Beites

Tiago Beites é licenciado em Biologia (2007) e doutorado na mesma área (2013) pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP). Em 2015, iniciou o seu trabalho de pós-doutoramento na biologia fundamental do agente patogénico humano Mycobacterium tuberculosis no laboratório de Sabine Ehrt na Weill Cornell Medicine (Nova Iorque, EUA).

De 2020 a 2023, foi Instrutor e depois Professor Assistente na Weill Cornell Medicine (Nova Iorque, EUA). Em julho de 2023, iniciou uma nova fase da sua carreira como Investigador Auxiliar no i3S.

Atualmente, Tiago Beites coordena uma equipa, cuja investigação tem como objetivo entender a biologia de alvos terapêuticos de agentes patogénicos, com especial foco no M. tuberculosis.

Sobre o Concurso CaixaResearch

Desde a sua criação em 2018, a Fundação “la Caixa” destinou 145.7 milhões de euros a 200 projetos de investigação inovadores com impacto social significativo. Destes, 63 foram liderados por grupos de investigação portugueses. Este é, atualmente, o concurso filantrópico mais importante para investigação das áreas da biomedicina e da saúde em Portugal e Espanha. Um painel de especialistas internacionais avalia meticulosamente as propostas de cada edição, realizando entrevistas com os candidatos pré-selecionados e selecionando os projetos mais promissores.

Para esta edição do concurso foram submetidas 580 propostas, tendo sido selecionados 29 projetos de Portugal e de Espanha, que serão financiados com um total de 25.7 milhões de euros. Este financiamento irá apoiar os estudos científicos ao longo dos próximos três anos.

O Concurso CaixaResearch colabora estreitamente com a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), que nesta edição financia três dos nove projetos portugueses selecionados, contribuindo com quase 2,5 milhões de euros.

Para o diretor-geral da Fundação “la Caixa”, Antonio Vila Bertrán, trata-se da «a dimensão ibérica desta convocatória é uma das suas caraterísticas mais singulares. Estamos muito satisfeitos por promover interações científicas de elevada qualidade entre os dois países».

Os investigadores que pretendam candidatar-se a um financiamento no âmbito desta convocatória de 2025 podem apresentar os seus projetos até 20 de novembro deste ano. Como novidade, nesta edição em curso, as iniciativas centradas em doenças raras pediátricas e em diabetes tipo 1 terão a oportunidade de receber financiamento específico no âmbito de colaborações com a Fundação Breakthrough T1D e com a Fundação de Investigação Sant Joan de Déu, em Espanha.