A publicação do número um da Revista PÁ – Poesia & Outras Artes, com originais de autores em “resposta direta” a poemas de Ana Luísa Amaral, assinalou o encerramento, no passado dia 6 de setembro, de um ano de encontros, recitais de poesia e exposições dedicadas à poetisa e antiga docente e investigadora da Faculdade de Letras (FLUP), Figura Eminente da Universidade do Porto 2023/2024.
Com o “ambicioso programa” que recordou o “legado poético, ético e científico de Ana Luísa Amaral”, a academia não só homenageou “uma referência cultural incontornável da literatura e da poesia portuguesa contemporâneas”, como também afirmou “a perenidade do exemplo e a persistência da sua obra literária, ensaística, cidadã, académica e feminista”, afirmou o Reitor da U.Porto, António de Sousa Pereira, durante a cerimónia de encerramento das comemorações da Figura Eminente, realizada no Salão Nobre da Reitoria.
Para trás, fica um ano recheado de eventos, inaugurado a 22 de setembro de 2023, com a assinatura do protocolo de comodato que permitiu à Casa dos Livros | Centro de Estudos da Cultura da U.Porto acolher o acervo (biblioteca e arquivo) da homenageada. “Era o que fazia sentido”, explicou então a filha Rita Amaral.
O espólio agora à guarda da Universidade inclui um vasto acervo deixado pela escritora, “nomeadamente sobre estudos feministas e estudos de género que foi criando ao longo dos anos e que deve servir para outras pessoas”. No mesmo dia, era inaugurado, na Casa dos Livros, o auditório Ana Luísa Amaral.
Outro momento alto do ciclo de homenagens correspondeu à publicação do número zero da Revista PÁ – Poesia & Outras Artes, dedicada à antiga docente e investigadora da FLUP. Já o número um da Revista foi lançado, precisamente, durante a cerimónia de encerramento das comemorações, reunindo originais de vários autores em forma de “resposta” a poemas da escritora.
Ensinar a pensar e a sentir os outros
“Um poema alarga os horizontes dos estudantes de ciências como a física quântica alarga os horizontes dos estudantes de humanidades”, disse Ana Luísa Amaral na oração de sapiência que proferiu, no dia 22 de março de 2022, a propósito do 111º aniversário da Universidade do Porto. “A publicação da alma humana” foi o título que escolheu para esta apresentação durante a qual nos lembrou que a principal função das universidades é “ensinar a pensar”, daí a urgência do cruzamento de saberes ou da “multiplicidade” e “transculturalidade”, como lhes chamou.
Dando continuidade a este espírito de “transculturalidade”, o programa de homenagens integrou um conjunto de exposições, a começar por Queria uma palavra que fosse bússola para todos, mostra documental das várias facetas da homenageada – poeta, tradutora, ensaísta, investigadora, docente e divulgadora cultural.
Seguiram-se Infinitas Galáxias, materializando diálogos interartísticos entre a poesia de Ana Luísa Amaral e a pintura de Constança Araújo Amador e Se paredes me dão a liberdade, com os poemas a servirem de inspiração à ilustradora Helena Rocio Janeiro.
Voltamos ao Dia da Universidade 2022. Importa “pensar”, mas também “sentir os outros”, trazendo para a sala de aula: “os afetos, aquilo que conta na definição do humano e coloca tudo de volta no lugar, organizando a vida interior pessoal e construindo relações entre as pessoas”, acrescentou a antiga docente e investigadora da FLUP durante a referida oração de sapiência. “O poema é escrito, a música é composta, a pintura é terminada, a instalação está pronta, a criação para a coreografia idealizada, precisamos de nos voltar para o outro. Precisamos de partilhar”. Foi o que a U.Porto procurou fazer no último ano.
A arte da desarrumação
O programa das comemorações da Figura Eminente 2023/2024 incluiu também Encontros para Ler Ana Luísa Amaral, com especialistas que aprofundaram a análise sobre a sua obra literária, recitais de piano e poesia, e ainda um espetáculo do Núcleo de Etnografia e Folclore da U.Porto (NEFUP).
“As palavras macias de Ana Luísa Amaral” foi, por sua vez, o título da palestra de Maria Irene Ramalho que pontuou a sessão de encerramento das comemorações da Figura Eminente 2023/2024. Um fim para um novo começo. Como aquele que a poetisa antecipou no Dia da Universidade 2022.
“A poesia desarruma como faz a Física Teórica, por exemplo, ao interrogar o mundo”, sublinhou então. “A interrogação comum à poesia e a algumas das ciências é o desassossego”. O mesmo estado de desassossego “que as escolas deveriam passar aos seus estudantes”.
Também por isso, “queremos continuar a recordar Ana Luísa Amaral”, afirma o Reitor da U.Porto, prometendo manter este legado vivo para todos aqueles que “busquem inspiração no seu exemplo académico, cívico e cultural, ou procurem alimento nas suas palavras – “pequenos sons de espanto” onde, recordando um dos seus poemas, “o justo e o humano se abraçam” .