Uma equipa de docentes e investigadores do Instituto de Ciência Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) e do Instituto de Investigação Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto, testou, com sucesso, uma nova metodologia que permite “acelerar” o diagnóstico da amiloidose de transtirretina (ATTR), doença vulgarmente conhecida como Paramiloidose ou ‘doença dos pezinhos’,
A amiloidose de transtirretina (ATTR) é uma doença altamente debilitante e potencialmente fatal, com características muito específicas, as quais combinadas com a sua raridade, dificultam o diagnóstico, o que origina atrasos no início do tratamento adequado.
Esta doença está associada à proteína transtirretina (TTR), que devido a uma mutação, ou a condições do meio, perde a sua estrutura e tem tendência a agregar e formar fibras de amiloide que se depositam em diferentes tecidos e órgãos do corpo. Atualmente, o diagnóstico faz-se por “teste genético para confirmar a mutação na transtirretina e por deteção de depósitos de amiloide” explica Luís Gales, investigador no i3S e docente do departamento de Biologia Molecular do ICBAS, e responsável pelo estudo.
A formação de depósitos de amiloide é, não só, um processo que só pode ser confirmado por métodos muito invasivos, através da realização de uma biópsia de tecidos, mas que para além disso ocorre tardiamente, em estádios avançados da doença.
“A técnica que desenvolvemos permite-nos, através de uma amostra mínima de plasma, cerca de 5 microlitros, analisar as primeiras espécies da cadeia de formação de amiloide, os monómeros de transtirretina, em vez de olhar para os depósitos finais, permitindo-nos assim fazer o diagnóstico mais cedo. A nossa técnica permitiu verificar que pessoas portadoras de mutação causal da doença, mas ainda assintomáticas já apresentam níveis significativamente mais altos de monómeros do que as do grupo controlo, o que abre portas à possibilidade de diagnosticar e tratar a doença mais precocemente”, avança o investigador.
Para além disto, os resultados promissores alcançados com esta investigação podem ser muito úteis, quer no desenvolvimento de novos fármacos, quer na aplicação adequada do tratamento em doentes sob terapia com tafamidis.
“Uma das estratégias mais recentes de tratamento é o tafamidis, um composto que estabiliza a transtirretina (evitando a formação de monómeros que dariam origem aos depósitos de amiloide). Portanto, com esta técnica podemos analisar diretamente o efeito estabilizador do composto e, inclusivamente, perceber antecipadamente qual a dosagem mais indicada para cada doente – a partir de amostras mínimas de plasma de um doente, incubadas com várias dosagens de tafamidis, conseguimos perceber qual a dose ideal para tratamento,ou seja, a necessária para baixarmos a concentração dos monómeros no plasma para os níveis normais”, reforça Luís Gales.
Um diagnóstico precoce, menos invasivo, e ainda a possibilidade de testar novos fármacos e de aperfeiçoar procedimentos para criar uma configuração de diagnóstico mais simplificada, são algumas das “das possibilidades que esta investigação deixa em aberto”, conclui.
O ensaio foi testado em dois grupos de cinco indivíduos cada, um composto por portadores da variante TTR-V30M e o outro por controlos saudáveis, no i3S, e contou ainda com a participação de Maria João Saraiva, Rosário Almeida José Leite e Diogo Costa-Rodrigues.
Sobre a doença
De acordo com a Sociedade Portuguesa de Neurologia, Portugal é “o país com mais casos de amiloidose hereditária por transtirretina”. Uma doença que apesar de rara, conta com 10 mil casos estimados em todo o mundo, sendo que quase metade dos doentes identificados na Europa são portugueses.
A ‘doença dos pezinhos’, descrita pela primeira vez na década de 50, por Corino de Andrade, médico e um dos fundadores do ICBAS, afeta o sistema nervoso central, sendo um dos primeiros sintomas a perda de sensibilidade e de força nos pés, alastrando para todo o corpo.