Ana Aguiar, docente do Departamento de Estudos de Populações do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) e investigadora do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), acaba de receber o “EAPM Conference Award”, atribuído durante a conferência anual da European Association of Psychosomatic Medicine (AEPM), que decorreu, entre os dias 12 e 15 de junho, em Lausanne, na Suíça.
A investigação premiada incidiu sobre a violência por parceiros íntimos (VPI) e teve como objetivo avaliar a violência psicológica e emocional durante a pandemia de Covid-19, tendo em conta características sociodemográficas, sintomas de ansiedade e depressão numa amostra de residentes em Portugal.
Para Ana Aguiar, o “EAPM Conference Award”- que inclui pagamento da inscrição na Conferência EAPM 2024, em Lausanne (Suíça), e as quotas de um ano como membro na European Association of Consultation-Liaison Psychiatry, Psychosomatic Medicine & Integrated Care – representa “um reconhecimento do trabalho que se faz na Saúde Pública em Portugal, considerando os diferentes determinantes individuais, sociais, económicos e de saúde mental, que se podem traduzir em outcomes negativos para os indivíduos a curto e a longo prazo”.
Mais ainda, “este trabalho apresenta resultados que desafiam as perceções da sociedade relativamente à vitimização masculina e apresenta resultados que mostram a coocorrência de sintomas depressivos e ansiosos e uma maior probabilidade de serem vítimas de violência psicológica e emocional”, acrescenta.
Violência em Portugal: Uma realidade preocupante
O estudo distinguido – intitulado de Psychological and emotional violence during COVID-19 among Portuguese residents: a cluster analysis – foi liderado por Raquel Duarte, também docente do Departamento de Estudos de Populações do ICBAS, e resultou da aplicação – entre novembro de 2020 e fevereiro de 2021 – de um questionário anónimo e confidencial a um total de 519 participantes que referiram estar numa relação desde, pelo menos, janeiro de 2020.
Para avaliar as questões da violência, foram utilizadas as questões de screening propostas pela Associação Portuguesa de Apoio à Vítima. Já para avaliar os sintomas de ansiedade e depressão, foi utilizada a versão validada para a população portuguesa da Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HADS).
Verificou-se uma prevalência de 52,2% de vítimas de violência psicológica e emocional, sendo que a maioria dos participantes eram mulheres (78.8%), com idade média de 36,8 anos, a maioria (79%) tinha grau de ensino superior e 59,9% eram casadas/os ou estavam em união de facto.
Como resultados finais, e considerando o modelo de regressão logística ajustado, percebeu-se que as hipóteses de ser vítima de violência psicológica e emocional eram maiores nos participantes mais velhos, que se apresentavam com valores mais altos de sintomas depressivos, e 2,87 maior em homens do que em mulheres. Além disso, também se concluiu, que os participantes que reportaram “suficiente para suprir as necessidades”, na perceção do rendimento familiar, apresentaram menos probabilidades de serem vítimas de violência psicológica e emocional do que os participantes que referiram o rendimento como “confortável”.
Desta forma, verificou-se que os homens tinham maiores probabilidades de sofrer violência psicológica e emocional, desafiando as normas de género. Os indivíduos mais velhos foram as vítimas mais prováveis, desafiando alguma literatura. Os sintomas de depressão associados a uma maior agressão psicológica indicam uma relação bidirecional, exigindo intervenções direcionadas. Uma parte significativa dos casos existia antes da COVID-19, desafiando as suposições sobre o único papel da pandemia no aumento da violência, destacando a natureza persistente da VPI.
O estudo sublinha, ainda, a importância de abordagens multidisciplinares por parte dos profissionais de saúde pública para abordar e prevenir a violência entre parceiros íntimos. Sendo que será crucial desestigmatizar a vitimização masculina, uma vez que as barreiras sociais à denúncia são grandes, bem como, a procura de ajuda.
Para Raquel Duarte, o trabalho “destaca a necessidade urgente de políticas e intervenções multidisciplinares que abordem não só a violência psicológica e emocional, mas também os fatores sociodemográficos e de saúde mental que contribuem para ela”.
Da equipa fazem ainda parte investigadores do ISPUP, do Laboratório para a Investigação Integrativa e Translacional em Saúde Populacional do Porto, da Faculdade de Ciências (FCUP) e da Faculdade de Medicina (FMUP) da U.Porto.