Como é que os epitélios respondem a pressões, preservando a sua forma e funções que se encontram alteradas em várias patologias como o cancro e doenças inflamatórias? Foi com esta questão que o projeto apresentado pela investigadora Mariana Osswald, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), conquistou uma das quatro Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência, atribuídas no ano em que a iniciativa comemora 20 anos. A cientista vai receber 15 mil euros para estudar uma rede de proteínas que regula a forma e as propriedades mecânicas das células – a actomiosina.
Embora o termo epitélio seja pouco conhecido, dá nome a um dos tipos de tecidos estruturais do nosso organismo, que revestem a superfície dos vários órgãos humanos – e animais em geral –, incluindo a pele e os órgãos internos dos vários sistemas do corpo, desde o digestivo ao respiratório.
Segundo explica a investigadora e do i3S e professora auxiliar convidada no Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar (ICBAS), “os epitélios ou tecidos epiteliais formam uma barreira protetora que controla as substâncias que entram e saem do organismo – por exemplo, impedem a perda excessiva de água e a entrada de organismos indesejados (patogénicos) – e desempenham outros importantes papéis, entre os quais o controlo da temperatura e o desenvolvimento do organismo”.
As perturbações de forma ou organização dos epitélios acontecem em inúmeras patologias, incluindo cancro e doenças inflamatórias, pelo que “compreender como os epitélios conseguem responder às forças a que estão sujeitos e manter a sua forma é uma questão fundamental da biologia», explica Mariana Osswald.
“É também um conhecimento essencial para construir os alicerces de futuros estudos que procurem compreender as causas de doenças específicas ou desenhar tratamentos para essas doenças”, acrescenta.
O projeto de Mariana Osswald será desenvolvido no grupo «Epithelial Polarity & Cell Division» do i3S e vai centrar-se especificamente no estudo de uma rede de proteínas que regula a forma e as propriedades mecânicas das células – a actomiosina.
“Queremos investigar como é que as células de um epitélio controlam estas proteínas para se adaptarem e responderem às forças mecânicas. Para isso, vamos recorrer a técnicas inovadoras, incluindo microscopia de super-resolução e ablação de estruturas subcelulares por microcirurgia laser”, projeta a investigadora.

O projeto de Mariana Osswald será desenvolvido no grupo «Epithelial Polarity & Cell Division» do i3S (Foto: DR)
As outras medalhadas
Além de Mariana Osswald, foram contempladas com uma Medalha de Honra L’Oréal as investigadoras: Laetitia Gaspar, do Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra; Cláudia Deus, do Instituto Multidisciplinar de Envelhecimento da Universidade de Coimbra; e Sara Silva Pereira, do Centro de Investigação Biomédica da Universidade Católica Portuguesa.
As quatro investigadoras, já doutoradas e com idades entre os 31 e os 37 anos, foram selecionadas de entre várias dezenas de candidatas pela relevância dos seus projetos apresentados em 2023. A seleção coube a um júri científico presidido por Alexandre Quintanilha, Professor catedrático jubilado do ICBAS, fundador do IBMC e investigador na área da Física.
A cerimónia de entrega das Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência 2024 decorre esta quarta-feira, 5 de junho, às 18h30, no Centro Cultural de Belém. Para além de distinguir as quatro jovens mais promissoras nas áreas das ciências da vida, o evento vai assinalar o 20.º aniversário do programa com uma mesa-redonda sobre a «Ciência há 20 anos, hoje e daqui a duas décadas».
Sobre Mariana Osswald
Mestre em Bioengenharia pela Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP), Mariana Osswald iniciou a sua carreira como investigadora no IBMC, mais precisamente no grupo liderado pelo atual diretor do i3S, Claudio Sunkel. Em 2015, no âmbito do seu doutoramento sobre polaridade celular e divisão celular em tecidos epiteliais, integrou o grupo de Eurico Morais de Sá no IBMC/i3S. Em 2021, foi uma das três investigadoras do i3S distinguidas na 1.ª edição do Prémio Maria de Sousa.
Atualmente, desenvolve investigação de pós-doutoramento no grupo onde fez o doutoramento, com o objetivo de compreender os mecanismos que asseguram a arquitetura e integridade dos tecidos em epitélios proliferativos, e é professora auxiliar convidada no Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar (ICBAS).
Sobre as Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência
O apoio da L´Oréal às mulheres da ciência começou formalmente em 1998, com uma parceria com a UNESCO, que deu origem ao programa L’Oréal-UNESCO For Women em Science, premiando anualmente cinco cientistas consagradas, uma de cada região do mundo. 132 grandes mulheres cientistas foram já premiadas, sete das quais receberam posteriormente um prémio Nobel.
Este programa internacional serviu de inspiração a dezenas de iniciativas locais dirigidas a jovens e mulheres investigadoras, apoiando-as a dar continuidade às suas carreiras científicas e a sensibilizar os decisores – e a sociedade em geral – para uma ciência sem barreiras de género. Foi neste âmbito que nasceram, em 2004, as Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência. A iniciativa nacional distingue, anualmente, cientistas jovens e já doutoradas, com idade até 35 anos (mais um ano por cada filho) e com projetos promissores nas áreas das Ciências, Engenharias e Tecnologias para a Saúde ou para o Ambiente.
“É um orgulho olhar para estas jovens que souberam fazer o seu caminho, que se mantiveram firmes em avançar e que, ao longo destas duas décadas, têm sido um modelo e uma inspiração para muitas outras jovens cientistas. Elas são a prova de que o conhecimento e a ciência não têm género!”, refere Gonçalo Nascimento, Country Coordinator da L’Oréal em Portugal, reiterando o empenho da L’Oréal em continuar a promover uma ciência equitativa e a apoiar as mulheres que a fazem avançar, tanto a nível local como também através das iniciativas internacionais que realiza anualmente.
Desde 2014, já foram reconhecidas 69 jovens investigadoras em Portugal, incluindo nove da Universidade do Porto: Sandra Sousa (IBMC, 2005), Maria José Oliveira (INEB, 2009), Joana Marques (FMUP, 2010), Inês Gonçalves (INEB, 2014), Joana Tavares (IBMC, 2014), Sónia Melo (Ipatimup, 2015), Maria Inês Almeida (i3S, 2017), Joana Caldeira (i3S, 2019) e Andreia Pereira (i3S, 2022).