As investigadoras Marta Lopes e Joana Reis, ambas estudantes de doutoramento da Universidade do Porto e a realizarem trabalho de investigação no grupo “Hematopoiesis & Microenvironments” sob orientação do investigador Delfim Duarte no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da U.Porto (i3S), conquistaram recentemente bolsas de viagem no valor de 500 euros, atribuídas pela Associação Europeia de Hematologia, para apresentarem os seus trabalhos no congresso anual da associação, que se realiza em Madrid de 13 a 16 de junho.
As duas jovens cientistas têm centrado a sua investigação no estudo da leucemia mieloide aguda (LMA), um cancro hematológico agressivo provocado pela proliferação descontrolada de células progenitoras mieloides na medula óssea e no sangue. Esta doença apresenta um mau prognóstico e as opções terapêuticas são limitadas, já que a quimioterapia está associada a diversas complicações, nomeadamente infeção e recuperação muito lenta, e o transplante de medula óssea apresenta ainda uma taxa de mortalidade bastante elevada.
Marta Lopes, estudante do Programa Doutoral em Ciências Biomédicas, do Instituto de ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), estudou o papel da transferrina, uma proteína produzida pelo fígado que tem como função transportar o ferro para a medula, baço, fígado e músculos, presente em níveis aumentados aquando do diagnóstico de LMA.
Acontece que a quimioterapia de indução aumenta ainda mais os níveis de ferro, além de estar associada ao aparecimento de ferro livre, que é tóxico para o microambiente da medula óssea e favorece a proliferação bacteriana. A equipa que Marta Lopes integra decidiu então avaliar o impacto da transferrina combinada com quimioterapia na resposta à LMA.
Com recurso a um modelo animal com LMA e a linhas celulares humanas de LMA, a investigadora concluiu que o tratamento combinado de quimioterapia e transferrina diminui o número de células LMA, reduz os níveis de ferro livre tóxico e aumenta a sobrevivência dos ratinhos. Observou também um aumento significativo da sobrevivência dos ratinhos com infeção por E. coli que receberam transferrina.
Estes resultados, explica Marta Sofia Lopes, #são muito importantes e abrem portas a uma potencial nova terapia para a LMA, porque mostram que a combinação de quimioterapia com transferrina apresenta um efeito anti-leucémico e protetor no contexto da infeção#.
Aumentar a taxa de sucesso dos transplantes de medula
Joana Reis, estudante do Programa Doutoral em Biologia Molecular e Celular do ICBAS e da Faculdade de Ciências (FCUP), tem vindo a estudar possíveis determinantes para o sucesso do transplante de medula óssea, utilizado para tratar pacientes com LMA, entre outros. Estes pacientes, devido à quimioterapia ou repetidas transfusões sanguíneas, apresentam frequentemente níveis elevados de ferro em circulação, um fator de mau prognóstico para o transplante.
Uma vez que a sobrecarga de ferro leva à produção de oxidantes, Joana Reis focou-se na possibilidade da expressão de um fator de transcrição envolvido na proteção contra o stress oxidativo, o Nrf2, ser determinante para o sucesso do transplante de medula óssea.
A investigadora verificou então que “ratinhos que não expressam o fator de transcrição têm uma sobrevida muito curta após o transplante quando sobrecarregados com ferro, indicando que a expressão desta proteína é fulcral para o sucesso do transplante”, explica.
A equipa focou-se ainda em tentar perceber qual o tipo celular determinante para a sobrevivência pós-transplante, tendo identificado um tipo de célula de células do estroma, as células estaminais mesenquimatosas.
Este estudo, sublinha Joana Reis, “tem potencial para aumentar a taxa de sucesso dos transplantes, uma vez que existem variantes genéticas do Nrf2 na população, podendo contribuir para a estratificação dos pacientes antes do transplante, recorrendo por exemplo a terapias que permitem eliminar o ferro nos pacientes com risco acrescido, reduzindo assim a mortalidade associada”.