Geologia é muito mais do que divulgação científica. “É o emprego do mundo”. É assim que Maria dos Anjos Ribeiro, diretora da licenciatura em Geologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), começa a descrever uma área e profissão em mudança, neste dia 27 de maio, em que se assinala o Dia do Geólogo.
“A globalização afeta a Geologia se calhar mais do que outras áreas profissionais, porque o trabalho nesta área é igual em qualquer país. Temos muitos geólogos formados na FCUP a trabalhar em várias partes do mundo: na Austrália, no Canadá, no Brasil, nos países nórdicos”, refere a docente..
Esta é apenas uma das mudanças que vê na profissão que, agora, tem de acompanhar as constantes alterações climáticas e que abraça o futuro com a transição digital.
“A Geologia tem agora áreas de intervenção cada vez mais necessárias como a prospeção de água”, detalha Maria dos Anjos Ribeiro. E não tem dúvidas dos desafios: “Vamos continuar a ter de acautelar a dinâmica do nosso planeta que às vezes se vira contra nós”.
Segundo a diretora da licenciatura em Geologia, hoje em dia há dois tipos de geólogos numa profissão com múltiplas áreas de atividade: o geólogo de botas, de trabalho no terreno e recolha de amostras, e o geólogo que atua em muitos outros setores como a ciência de dados. Para Maria dos Anjos Ribeiro, é essencial não “arrumar as botas”, já que continuam a ser necessários “olhos geológicos” para complementar o papel essencial da área digital. “É o futuro”, garante.
É precisamente esse contributo o mote para um evento comemorativo do Dia do Geólogo – promovido pela Associação Portuguesa dos Geólogos e pela Sociedade Geológica de Portugal – que se realiza, esta segunda-feira, no Instituto Geofísico da Universidade do Porto.
“A ciência de dados será muito útil na análise de sondagens, com a construção de modelos tridimensionais mais consistentes e que envolvem uma grande quantidade de dados de um determinado terreno ou depósito. Mostra o que não se viu, mas que sabemos que está lá”, conta.
“Mais do que vulcões, fósseis e minerais”
A paixão pela disciplina de Geologia é o que tem levado muitos alunos do Ensino Secundário a seguir este curso. Mas, diz Maria dos Anjos Ribeiro, não há a ideia da diversidade de áreas nas quais um geólogo pode trabalhar.
Dá o exemplo concreto do metro. Quem o utiliza todos os dias não imagina que, na construção daquela linha, houve muito trabalho de geólogos à superfície e em subsolo. Seja nas sondagens, no projeto de escavação que obedece às características do solo ou na fiscalização, o geólogo acompanha todo o processo destas obras.
Na sua candidatura ao Ensino Superior, Cátia Dias colocou a Geologia “como primeira e única opção”, pelo gosto pela disciplina e pela área do turismo da natureza. Viu-se num curso bem mais abrangente: “com mais do que vulcões, fósseis e minerais” abordados no Ensino Secundário. A geóloga de 32 anos, licenciada e mestre em Geologia pela FCUP, trabalha atualmente na área da prospeção de matérias-primas essenciais para a transição energética, como o lítio.
Na empresa Fortescue, divide o seu tempo entre o trabalho de campo, em Trás-os-Montes, quer no terreno, na amostragem de rochas e cartografia, quer em ações de sensibilização da população relativamente aos projetos a serem desenvolvidos na região.
“As pessoas estranham muito a presença das empresas no terreno e por isso fazemos sessões de esclarecimento para explicar os nossos projetos e o que vamos e estamos autorizados a fazer”, explica.
Já o dia a dia de Renato Rolo é bem diferente: “Na área da geofísica, por exemplo, podemos analisar a resistividade elétrica do solo para perceber a que profundidade se encontra um nível freático e que possa ser um local mais adequado para fazer um furo de água”.
O jovem geólogo de 26 anos formado na FCUP dá um exemplo de um dos trabalhos que acompanhou para a sua dissertação em contexto empresarial no âmbito do mestrado na empresa Sinergeo, onde atualmente trabalha.
Renato começou na geofísica, mas a sua área de atuação é agora a geotecnia/engenharia geotécnica. “Estudamos e avaliamos no terreno as características da resistência do solo e da rocha e assim podemos saber, por exemplo, num determinado local que tipo de tensões pode um edifício exercer sobre o solo ou a rocha”, explica.
Dada a importância da profissão, que se tornou, nas últimas décadas, “complexa e muito diversificada”, a Associação Portuguesa de Geólogos tem este ano a decorrer uma petição para a criação de uma Ordem de Geólogos que prevê a regulamentação da mesma.
A APG destaca a “ligação com outras profissões numa grande variedade de domínios de atividade, nomeadamente, nos sectores das indústrias de construção, extrativa e energética, do ordenamento do território, da gestão ambiental, bem como da prestação de serviços especializados ao Estado e às empresas”.