O que é que a força e a massa muscular têm a ver com o fígado? Uma investigação da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) veio demonstrar que existe uma relação entre a baixa massa muscular, também conhecida como sarcopenia, e o fígado gordo não alcoólico (NAFLD), a doença hepática mais comum a nível mundial.

“Encontramos evidência de que a baixa força muscular e a baixa massa muscular estão associadas com a doença do fígado gordo não alcoólico e com a gravidade desta doença”, explica Joana Rigor, autora de uma série de trabalhos nesta área.

Conforme esclarece, a perda de massa e de força muscular é um processo associado ao envelhecimento, mas também a uma série de doenças, em particular as doenças inflamatórias. “Tal como o tecido adiposo, o músculo esquelético, como órgão endócrino, produz citocinas específicas, as miocinas, que provocam alterações no fígado, assim como noutros órgãos. Parece existir uma relação entre fígado gordo e o metabolismo muscular”, diz.

De acordo com a investigadora da FMUP, a doença do fígado gordo não alcoólico é “uma preocupação crescente, particularmente nos países mais desenvolvidos, devido à obesidade, à resistência à insulina, à diabetes e aos problemas com o colesterol. Calcula-se que afete atualmente 20 a 30% da população europeia. No entanto, há muito para saber acerca da sua origem, diagnóstico e abordagem.

Rastreamento de doentes é importante

Nesse sentido, outro dos objetivos desta investigação foi validar ferramentas não invasivas para excluir a presença de fibrose avançada na população portuguesa. “A doença do fígado gordo não alcoólico tem aumentado a sua prevalência. Por isso, é importante rastrear os doentes com base na sua gravidade, quer a nível individual, quer no âmbito de programas de referenciação e de seguimento”, apela a investigadora da FMUP.

“Embora a maior parte dos doentes apenas apresente esteatose simples, alguns progridem para fibrose, cirrose e mesmo carcinoma hepatocelular, recorrendo-se classicamente à biópsia para o diagnóstico e determinação do estádio da doença. Estas ferramentas podem agora ser utilizadas na prática clínica, permitindo uma melhor referenciação e seguimento dos doentes”, acrescenta.

Esta investigação tinha ainda com o objetivo compreender a relação entre o fígado gordo não alcoólico e microrganismos intestinais (microbioma) presentes nas pessoas com aquela doença. Na população estudada, tudo indica que existe uma relação entre a redução de Bifidobacterium no intestino e o fígado gordo não alcoólico. Inversamente, sabe-se que a abundância destas bactérias tem sido registada em atletas, parecendo associar-se a uma maior saúde muscular.

“No futuro, uma melhor avaliação da influência dos Bifidobacterium pode permitir a sua utilização como tratamento em pessoas com a doença do fígado gordo não alcoólico e com perda de massa muscular”, indica.

Esta investigação contou com a participação de investigadores da FMUP, do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia – Espinho e do i3S.