Uma equipa de investigadores do CIBIO-InBIO (Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos, InBIO Laboratório Associado da Universidade do Porto) acaba de descrever uma nova espécie de borboleta noturna da costa sudoeste alentejana. Trata-se de uma espécie com ocorrência muito localizada e potencialmente sob elevado risco de extinção.
A descoberta decorreu durante trabalhos de campo realizados ao longo da costa do sudoeste alentejano, entre Vila Nova de Milfontes e Cabo Sardão, e que tinha como objetivo encontrar borboletas do género Ypsolopha, que em Espanha se alimentam de plantas género Ephedra.
A pesquisa direcionada principalmente para locais com presença Ephedra fragilis subsp. fragilis Desf., a única espécie portuguesa do género, permitiu encontrar quatro adultos e diversas lagartas pequenas e castanhas que posteriormente foram identificadas como sendo uma nova espécie para a fauna portuguesa. Esta foi “batizada” como Ypsolopha milfontensis, em homenagem ao local da descoberta, Vila Nova de Milfontes.
A análise detalhada da sua morfologia e a utilização de dados genéticos obtidos por sequenciação de códigos de barras de ADN permitiu acrescentar uma nova espécie para a ciência, tendo sido esta descoberta publicada na revista internacional SHILAP Revista de lepidopterologia, da Sociedad Hispano-Luso-Americana Lepidopterologia-Shilap.
A nova espécie de borboleta noturna é afim da Ypsolopha rhinolophi, uma espécie descrita em 2019 do norte de Portugal e de França. No entanto, apresenta uma ecologia muito distinta. Enquanto que Ypsolopha rhinolophi se alimenta de Carvalho-negral, a nova espécie, Ypsolopha milfontensis alimenta-se de um arbusto ameaçado endémico do oeste da região mediterrânica e dos arquipélagos da Madeira e Canárias: Ephedra fragilis subsp. fragilis Desf..
Esta planta, conhecida como gestrela ou cornicabra, está classificada com a categoria de ameaça “Vulneravel” na Lista Vermelha de Flora Vascular de Portugal Continental. Ocorre em pequenos núcleos ao longo do litoral do Sudoeste Alentejano, desde Sines à praia de Monte Clérigo e está presente ainda no Barlavento Algarvio, na Ponta da Piedade. A redução das suas populações deve-se principalmente à destruição de habitat pela pressão urbana e turística.

Ephedra fragilis subsp. fragilis é uma das sepécies incluídas na Lista Vermelha de Flora Vascular de Portugal Continental. (Foto: Miguel Porto)
Espécies em risco
Em Portugal pelo menos 381 espécies de flora vascular (cerca de 12%) encontram-se ameaçadas de extinção, assim como 44% dos endemismos. Isto é, 44% das espécies que ocorrem exclusivamente em Portugal encontram-se ameaçadas de extinção.
“O sudoeste alentejano é uma das regiões onde ocorrem mais endemismos de flora ameaçados: por um lado, é uma região de elevada concentração de endemismos, mas por outro, uma região que está sujeita a fortes ameaças como a expansão em larga escala da agricultura intensiva e o desenvolvimento urbano-turístico” refere Miguel Porto, presidente da Sociedade Portuguesa de Botânica e investigador do CIBIO-InBIO.
O desaparecimento destes endemismos implica também a extinção de espécies animais que delas dependem. Os investigadores suspeita, por isso, que a nova espécie de borboleta esteja igualmente em risco de extinção, e alertam para a necessidade de atualizar o mapeamento detalhado das populações da planta hospedeira em Portugal e investigar a ocorrência da espécie de borboleta em cada uma dessas populações. Essa informação permitirá compreender o estatuto de ameaça da nova espécie e permitir a tomada de ações visando a sua conservação.
“Em Portugal sabemos ainda muito pouco sobre a nossa fauna de invertebrados. Seguramente existem várias outras espécies no anonimato, tal como Ypsolopha milfontensis se encontrava até agora, dependentes das diversas espécies endémicas de plantas vasculares de Portugal. É urgente estudar o nosso património natural, para conhecer e preservar” refere a entomóloga Sónia Ferreira, investigadora do CIBIO-InBIO.