José Bessa (Pessoa)Para José Bessa, uma das mais recentes formas de usufruir do tempo livre é a descontração que encontra nos passeios de mota. Liberdade fora dos cânones é de resto uma das imagens de marca que este investigador do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S) expressa através de conversas com amigos, na agitação dos sítios com muita música, ou mesmo da leitura de um livro, mais recolhida num local inesperado.

Personagem atenta, partilha essas experiências e descobertas com uma leveza e um entusiasmo cativante, o mesmo entusiasmo pela descoberta que imprime ao seu trabalho. O percurso profissional que fez foi sinuoso, tanto quanto a descoberta obriga, apaixonando-se a cada passo por uma nova área ou por algo novo pudesse acrescentar àquilo em que trabalha. O Projeto de doutoramento em Ciências Biomédicas que desenvolveu no Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar (ICBAS) e no Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) da U.Porto usava moscas-da-fruta para explicar como se forma o olho. Mas rapidamente descobriu um outro animal-modelo muito mais desafiante: o peixe-zebra. Nessa altura, mudou-se para Sevilha, para um laboratório onde poderia explorar a epigenética a do desenvolvimento olho em ambos os organismos-modelo e, ao fim de algum tempo, já tinha adicionado à sua linha de interesse mais um órgão, o pâncreas. Começava aqui a desenhar-se aquilo que viria a ser a sua própria linha de investigação. O pâncreas é, afinal, um órgão complexo, pouco estudado e que está na base da Diabetes, doença que muitos consideram a epidemia do séc. XXI.

Volvidos oito anos, em 2013, regressa ao Porto, de onde é natural, com energia renovada e com um portfólio promissor: um conjunto de técnicas inovadoras que desenvolveu; um peixe modelo cujo pâncreas é extremamente parecido com o nosso; e, acima de tudo, com uma mão cheia de ideias. Primeiro no IBMC e depois no i3S, onde lidera o grupo de Desenvolvimento e Regeneração de Vertebrados , pôs as mãos à obra para fazer prova de conceito daquilo que tinha em mente e, em pouco tempo conquista uma das tão desejadas bolsas do European Research Council. A conquista desse financiamento, anunciada este mês, irá garantir ao investigador milhão e meio de euros para levar a cabo investigação de vanguarda durante os próximos cinco anos.

Naturalidade?

Porto.

Idade?

38 anos.

– De que mais gosta na Universidade do Porto?

Das pessoas. Sem duvida que a Universidade do Porto é uma instituição muito dinâmica, multidisciplinar e com um excelente reconhecimento internacional, mas são as pessoas que constroem a Instituição.

– De que menos gosta na Universidade do Porto?

Quando a burocracia ultrapassa o bom senso.

– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto?

Posso dar duas? A primeira estaria diretamente relacionada com investigação e a outra seria mais abstrata. A primeira seria a formação de uma base de dados atualizada de fontes de financiamento para projetos de investigação, contendo datas previstas de abertura de concursos, de modo que os investigadores pudessem programar as suas tarefas com um ano de antecedência.

A segunda seria implementar um programa de intercâmbio de visitas para  investigadores e professores da UP, onde cada um poderia desempenhar um papel de visitante ou anfitrião. Este tipo de iniciativa poderia ajudar a por em contacto áreas afastadas do conhecimento, favorecendo o aparecimento de ideias criativas. Acho que as novas ideias aparecem, mais que nada, pela “recombinação” de ideias preexistentes.

– Como prefere passar os tempos livres?

Atualmente desfruto muito de fazer longas viagens de mota em busca de paisagens bonitas e tranquilas.

– Um livro preferido?


Esta é difícil! Vou ser mais abrangente, vou escolher escritores. Fernando Pessoa em dias de chuva e António Ramos Rosa em dias de sol.

– Um disco/músico preferido?


Um grupo de referência seria The Smashing Pumpkins. Actualmente estou a gostar muito do trabalho dos portugueses Linda Martini.

– Um prato preferido?


Um prato de Rojões acompanhado com um bom vinho maduro tinto.

– Um filme preferido?


Blade Runner, de Ridley Scott. Por varias razões, primeiro porque sou fã de ficção cientifica, depois porque este filme aborda a bioengenharia e finalmente porque depois de toda a ação que se desenrola durante o filme, há o despertar de perguntas muito pertinentes sobre a Consciência.

– Uma viagem de sonho (realizada ou por realizar)?

Como destino, teria de ser algum sitio tranquilo. Bom, relativamente a uma viagem de sonho… vamos sonhar com algo grande e épico, que tal uma viagem até Marte?

– Um objetivo de vida?

Aprender.

– Uma inspiração? (pessoa, livro, situação…)

O poema If de Rudyard Kipling.

– O projeto da sua vida…

Compreender um pouco melhor os mecanismos genéticos que determinam a identidade e função das células num organismo vivo.

-Uma ideia para promover a investigação portuguesa a nível internacional?

Realmente o que está a faltar hoje em dia é mais financiamento e estabilidade para os grupos de investigação. Financiamento e estabilidade têm de andar a par, sem financiamento não se pode desenvolver projetos, sem estabilidade os projetos que se desenvolvem são menos produtivos. Portanto, hoje em dia, o melhor modo de promover a investigação portuguesa a nível internacional será mesmo dar-nos meios para desenvolver projetos excecionais.