Estudo do ISPUP, publicado na “Acta Médica Portuguesa”.

Um estudo do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), publicado na “Acta Médica Portuguesa”, analisou as opiniões de profissionais em medicina da reprodução relativamente ao anonimato, ao acesso e à partilha de informação no âmbito da doação de gâmetas – uso de óvulos e espermatozoides doados para técnicas de Procriação Medicamente Assistida (PMA) – em Portugal.

Mudanças no contexto legal da doação de gâmetas, como a remoção do anonimato dos dadores em 2018 e o alargamento do acesso a técnicas de PMA por mulheres solteiras e casais de mulheres em 2016, suscitaram uma discussão pública sobre as suas potenciais implicações no SNS, tendo em conta a escassez de recursos humanos e de infraestruturas para fazer face ao aumento da procura de gâmetas. Conhecer as opiniões de todas as partes envolvidas quanto a estas mudanças é fundamental para promover a inclusão e participação nos processos de decisão.

Este trabalho auscultou, em particular, as opiniões de profissionais de saúde – médicos, enfermeiros, embriologistas, biólogos e psicólogos – relativamente a questões como o anonimato dos dadores de gâmetas (pessoas que doam os seus óvulos e espermatozoides a beneficiários), a localização dos centros públicos de gâmetas existentes para que os indivíduos possam doar o seu material genético, a definição de grupos prioritários de beneficiários no acesso a estes tratamentos e a partilha de informação sobre os resultados da doação.

Participaram no estudo 37 profissionais de saúde, através de um questionário online, disponibilizado entre 22 de abril e 21 de julho de 2018 no website da Universidade do Porto.

Os resultados mostram que a maioria dos profissionais concorda com o anonimato dos dadores (64,5%) e com a localização atual dos centros públicos de colheita de gâmetas (67,6%). De realçar que 22,6% são favoráveis a uma dupla via, isto é, uma possibilidade que permite que tanto dadores como beneficiários optem pela doação anónima ou não anónima. Esta possibilidade está, aliás, em vigor em países como a Dinamarca.

Relativamente à questão da prioridade no acesso a gâmetas doados por parte de casais heterossexuais, em detrimento dos homossexuais, 72,7% dos profissionais de saúde do sexo masculino concorda, enquanto 53,8% das profissionais do sexo feminino discorda. Ainda neste tópico, 62,2% discordaram do acesso prioritário por parte de mulheres casadas em relação a solteiras.

Por fim, prevaleceu a ideia de que os dadores não devem ser informados sobre os resultados da doação (por exemplo, se ocorreu ou não uma gravidez a partir do material doado), sobretudo entre os profissionais do sexo masculino (90,9% contra 50,0% das mulheres).

As investigadoras do ISPUP – Susana Silva, Catarina Samorinha e Cláudia de Freitas – apelam ao desenho de enquadramentos político-jurídicos que considerem as expectativas, saberes e inquietações das diferentes partes envolvidas no processo da doação de gâmetas – profissionais de saúde, dadores e beneficiários – e sublinham a importância da participação dos cidadãos nos processos de tomada de decisão.A investigação foi conduzida ao abrigo do projeto “Engaged – Bionetworking e cidadania na doação de gâmetas”, liderado por Susana Silva, investigadora do ISPUP, e financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).

O trabalho designado “Anonimato, Acesso e Partilha de Informação na Doação de Gâmetas em Portugal: Como se Posicionam os Profissionais em Medicina da Reprodução?” é assinado pelas investigadoras Susana Silva, Catarina Samorinha e Cláudia de Freitas.