Joana Caldeira quer utilizar uma tecnologia inovadora para potenciar as atuais terapias regenerativas com células estaminais. (Foto: i3S)

Será possível regenerar os discos intervertebrais de quem sofre de dor lombar crónica, através de um processo pioneiro que conjuga uma tecnologia inovadora e as terapias com células estaminais? A investigadora Joana Caldeira, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S/INEB) da Universidade do Porto, está convicta que sim e foi com este projeto que acaba de ser distinguida com uma das quatro “Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência” atribuídas este ano pela gigante multinacional de cosméticos.

Joana Caldeira quer utilizar a tecnologia de edição genética CRISPR (CRISPR/Cas9) – uma espécie de processador de texto no ADN, que permite manipular as células – para reativar genes típicos do microambiente fetal, e deste modo potenciar as atuais terapias regenerativas com células estaminais. “Com esta tecnologia revolucionária poderemos criar uma envolvente acolhedora para as células estaminais utilizadas nas terapias de regeneração do disco, o que promoverá o seu alojamento e sobrevivência no local pretendido”, explica a investigadora do  grupo «Microenvironments for New Therapies» do i3S.

«Tanto pelo processo natural de envelhecimento como por traumas diversos ou por predisposição genética, a dor lombar causada pela degeneração dos discos intervertebrais tem um pesado impacto socioeconómico, devido às dores e incapacidade provocadas e ao absentismo laboral e aos custos terapêuticos que lhes estão associados”, sublinha Joana Caldeira. Os números e as terapias existentes demonstram a urgência de se encontrar novas soluções: mais de 70% da população mundial é afetada por dor lombar causada pela degeneração dos discos intervertebrais e os tratamentos atuais não são eficazes a longo prazo.

Um tratamento eficaz nesta área permitiria beneficiar milhões de pessoas, reduzindo o número de anos vividos com incapacidade, tanto mais que, no caso da doença degenerativa do disco, estes anos ultrapassam em média os registados em doenças como a SIDA, a tuberculose e o cancro de pulmão. Da mesma forma, ajudaria a diminuir perdas globais anuais que, segundo indica a investigadora, deverão rondar os 150 mil milhões de euros por ano, em parte decorrentes de cerca de 150 milhões de dias de baixa médica.

A concretização deste projeto, batizado como CRISPR4DISC, “será um passo significativo na melhoria das já promissoras terapias com células estaminais e abrirá portas para a primeira terapia regenerativa do disco intervertebral baseada na tecnologia CRISPR. Os resultados obtidos criarão as bases de ensaios clínicos pioneiros para inverter a realidade atual”, refere a investigadora.

Recorde-se que, no ano passado, este mesmo projeto já tinha sido distinguido pela Eurospine (Spine Society of Europe – Sociedade Europeia da Coluna) com um financiamento de 25 mil euros.

Investigadoras, doutoradas e com idades entre os 30 e os 35 anos

Nesta 15.ª edição das Medalhas L’Óreal foram também distinguidas as investigadoras Patrícia Costa Reis, pediatra no Hospital de Santa Maria e professora na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, com um projeto de investigação sobre lúpus; Joana Cabral, investigadora no Instituto da Vida e da Saúde na Universidade do Minho, que se propõe estudar as redes cerebrais; e Diana Madeira, investigadora no CESAM/ECOMARE da Universidade de Aveiro, com um projeto sobre a vida nos oceanos.

As quatro jovens investigadoras, já doutoradas e com idades entre os 30 e os 35 anos, foram selecionadas entre mais de 70 candidatas por um júri científico, presidido por Alexandre Quintanilha. Cada uma é reconhecida com um prémio individual de 15 mil euros, que visa apoiá-la na sua pesquisa e motivá-la a prosseguir estudos relevantes nas áreas da saúde e ambiente, assim como inspirar uma ciência e uma sociedade mais inclusiva e equitativa.

«Portugal está a fazer um percurso positivo na igualdade de oportunidades e no reconhecimento das mulheres na área da ciência, porém há ainda muito por fazer sobretudo nos lugares de topo. Este Prémio reconhece o mérito e a importância dessas jovens cientistas e serve de incentivo para continuarem a fazer ciência com qualidade», refere Cátia Martins, CEO da L’Oréal Portugal. A L’Oréal, por seu lado, sublinha aquela responsável, «continuará a dar o seu contributo, em Portugal e nos mais de 120 países onde está presente, para desafiar mentalidades e promover a igualdade de género na ciência».

Foi para promover esta mudança na ciência que nasceu a iniciativa portuguesa, há já 15 anos, promovida pela L’Oréal numa parceria com a Comissão Nacional da UNESCO e com a Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Em Portugal já foram financiadas 49 jovens investigadoras. O mesmo objetivo tinha levado à constituição de uma parceria global entre a L’Oréal – através da sua Fundação – e a UNESCO que, há 21 anos, esteve na génese do programa For Women in Science.

A cerimónia para entrega dos prémios decorre esta quarta-feira, no Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa.