E se os resíduos gerados por um dos mais produtivos setores industriais do país pudessem servir para fazer iogurtes, sumos ou gelados mais saudáveis? É nessa possibilidade que vem trabalhando a equipa de investigadores da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) envolvida no Vine&Wine Residues, um projeto que visa conceber alimentos funcionais (produtos alimentares com valor acrescentado e mais benéficos para a saúde) a partir da recuperação de compostos – polifenólicos –  existentes nos resíduos da industria da vinha e do vinho.

Este projeto inovador partiu da constatação de que vários resíduos gerados a partir da produção da vinha e do vinho – nomeadamente a lenha da poda, o engaço e o bagaço de uva – ainda apresentam muitos dos compostos polifenólicos (que derivam do metabolismo secundário das plantas e estão envolvidos no crescimento e na regulação da maturação dos frutos) encontrados no material vegetal original. O objetivo passa então por recuperar estes resíduos e aproveitá-los para criar – através da incorporação de um ou mais ingredientes – novos alimentos funcionais benéficos para a saúde humana.

“Do ponto de vista científico, espera-se contribuir para o “know-how” na área da estabilização de compostos polifenólicos usando diferentes materiais de encapsulação (lenhina, proteínas, polissacáridos, surfactantes e fosfolípidos) para serem usados em matrizes alimentares”, explica Joana Oliveira, investigadora do Departamento de Química e Bioquímica da FCUP (DQB-FCUP) e responsável pelo projeto.

Já em termos tecnológicos, pretende-se que o projeto “leve à conceção de novos produtos com propriedades benéficas para a saúde baseados em polifenóis obtidos a partir de diferentes agro-resíduos e a criação de um plano alternativo para a sua gestão em termos ambientais e económicos”, acrescenta a investigadora, que também faz parte do laboratório associado REQUIMTE LAQV.

Desde o arranque do projeto, os investigadores já conseguiram extrair e caracterizar os compostos fenólicos da lenha da poda, do engaço e do bagaço de uvas. Pelo meio, foi possível transformar quimicamente as antocianinas extraídas do bagaço de uva em pigmentos azuis (designados portisinas e dímeros de piranoantocianina), que podem ser utilizados pela indústria alimentar como corantes, em alternativa às moléculas sintéticas.

Levar as descobertas feitas em laboratório até à indústria produtiva é o grande desafio que se coloca agora à equipa de investigação. Para tal, Joana Oliveira acredita a que o projeto “pode levar ao “up-scale” industrial do processo de síntese de pigmentos naturais derivados das antocianinas que apresentam uma cor azul e que se pretende que sejam usados na industria alimentar como corantes em alternativa às moléculas sintéticas”.

Para além dos oito investigadores do REQUIMTE LAQV do DQB-FCUP, o projeto envolve ainda dois investigadores do REQUIMTE LAQV da Universidade Nova de Lisboa e um da Unidade de Investigação de Química Orgânica, Produtos Naturais e Agroalimentares (QOPNA) da Universidade de Aveiro.