A generalização dos antibióticos, a implementação do SNS e a reforma das maternidades são algumas das razões associadas à quebra da mortalidade materna.

Sabe-se que Portugal apresenta níveis reduzidos de mortalidade materna e que os cuidados de saúde na gravidez melhoraram significativamente nas últimas décadas. Mas, afinal, que distância nos separa das nossas avós? Qual a dimensão do salto qualitativo dado pelos cuidados de saúde na gravidez no nosso país desde o início do século XX?

Diogo Ayres de Campos e João Pedro Neves, docentes e investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) avaliaram, pela primeira vez, a evolução da mortalidade materna em Portugal desde 1929, tendo concluído que este indicador é cerca de 100 vezes menor nos nossos dias. O estudo foi publicado na Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa.

“Há 80 anos atrás, cerca de uma em cada 200 mulheres (500 em cada 100 mil) morria por complicações associadas à gravidez”, explica Diogo Ayres de Campos, obstetra e professor na FMUP. “Atualmente esse valor é cerca de 100 vezes menor (5 em cada 100 mil). Trata-se seguramente de um dos grandes progressos da humanidade, o qual alterou profundamente as expectativas da sociedade sobre os riscos de saúde para a mãe durante a gravidez”, defende o investigador, acrescentando que “é importante que as gerações que apenas conheceram a realidade atual não desvalorizem os progressos atingidos no passado” e que relembrem a “história natural da gravidez quando deixada ao cuidado da natureza”.

O estudo permitiu verificar que houve uma diminuição acentuada da mortalidade materna nas décadas de 1930 e 1940. De acordo com os autores, a queda deveu-se sobretudo à generalização dos antibióticos e ao aparecimento de transfusões sanguíneas seguras. Posteriormente houve um decréscimo progressivo até se atingir um plateau na década de 90, relacionado, provavelmente, com a implementação do Sistema Nacional de Saúde e de um programa de saúde materno-infantil nos anos 80 (que previa um acesso fácil e universal aos cuidados pré-natais, à assistência e às consultas de planeamento familiar), e a reforma das maternidades promovida pelo “pai” do planeamento familiar em Portugal, Albino Aroso.

De salientar que a investigação demonstrou a existência de um desfasamento de cerca de uma década entre a evolução da mortalidade materna em Portugal e em países como os Estados Unidos da América ou o Reino Unido durante quase todo o século XX, que veio a anular-se já nos anos 90.

Note-se que Portugal possui também uma baixíssima mortalidade perinatal, com taxas (3,9‰ em 2011) que nos colocam entre os países do Mundo com melhores cuidados de saúde ao bébé durante a gravidez e nos primeiros dias de vida.