A “Valkyrie” deverá chegar a Marte entre 2020 e 2030 (Foto: Mafalda Falcão)

Chama-se Henrique Ferrolho, tem 22 anos, é estudante no 5.º ano do Mestrado Integrado em Engenharia Informática e Computação da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e está a colaborar com a NASA, na Escócia, na programação da “Valkyrie”, um robot humanóide que pretende ajudar os humanos a instalarem-se em Marte.

Tudo começou com uma experiência de ERASMUS+ em Edimburgo. O jovem viseense foi estudar durante um semestre para a School of Informatics, experiência essa que se alargou até à atualidade. A sua estadia prolongada surge de um convite da própria escola, após conclusão da cadeira de robótica, pelo potencial demonstrado. Apesar de não estar nada à espera do convite, aceitou sem hesitar.

A partir daí, e apesar da robótica não ser a sua área de especialização (ironicamente, é a área de formação do seu pai), foi convidado a elaborar a sua tese de mestrado com base na programação de um robot da NASA. Para se ter uma noção da singularidade deste robot, a “Valkyrie”, importa destacar que só existem quatro no mundo (no Massachusetts Institute of Technology (MIT), em Cambridge, Massachusetts, na Universidade de Northeastern, em Boston, nas instalações da NASA e no Edinburgh Center for Robotics) e cada um vale cerca de dois milhões de euros.

E o que tem de tão especial? A “Valkyrie” é do sexo feminino, pesa 136 quilos, mede um metro e 80 centímetros e pretende-se que siga para Marte entre 2020 e 2030, isto numa perspetiva otimista. As universidades e a NASA estão assim a trabalhar em conjunto para melhorar as suas capacidades, para que “Valkyrie” seja capaz de construir estruturas para receber os humanos no planeta vermelho, desempenhando funções semelhantes às dos humanos. Isto porque a missão não envolve apenas o envio de robots humanóides, mas antes precede o envio de uma tripulação de humanos.  Para tirar partido do maior número de potencialidades, serão enviadas várias categorias de robots – rovers, quadrúpedes e humanóides, sendo que  cada robot tem os seus pontos fortes e fracos: os rovers são excelentes a percorrer longas distâncias e explorar; já os quadrúpedes são muito mais flexíveis em termos de mobilidade em terrenos muito rochosos.

A mais valia dos humanóides é precisamente a semelhança com a fisionomia humana. Ambientes como a ISS, ou os habitáculos que se tencionam construir em Marte, são ambientes apertados, com muitos obstáculos e objectos complexos a todo a volta. Afinal de contas, nós construímos esses ambientes a pensar na fisionomia humana, por isso o mais lógico é ter robots parecidos com essa fisionomia, para terem o melhor desempenho possível. É claro que apesar disso, não é necessário restringirmos-nos à forma humana exactamente como ela é – o que eu quero dizer com isto é: apesar de os humanos terem algumas limitações, isso não invalida o uso de robots que consigam, por exemplo, rodar o torso 360 graus. Aliás, isso até aumenta a utilidade dos robots.

E se 2020 ou 2030 parece algo distante, a verdade é que o ritmo de trabalho é bastante acelerado para se conseguir cumprir a meta. Neste trabalho diário, o estudante FEUP conta com a colaboração de Yang Yiming, Wolfgang Merkt e Vladimir Ivan, responsáveis pelo controlo e “motion planning”, quatro estudantes de doutoramento na seção de perceção e ainda com a supervisão de quatro professores. O grupo de trabalho, além de responsável pela programação software do robot, tem também a função de reportar erros e funções a melhorar no hardware, especificamente na questão de avaliação do corpo do robot: desde as articulações dos joelhos, aos calcanhares, pulsos e rotação da cabeça.

Além de ter a oportunidade de programar um robot tão único como a “Valkyrie”, o finalista da FEUP recebeu recentemente outra boa notícia: conquistou a única vaga de doutoramento em robótica na Universidade de Edinburgh para estudantes europeus (apesar de existirem cinco vagas, quatro estão reservadas para estudantes do Reino Unido e apenas uma para estudantes europeus). Este programa doutoral é proporcionado por duas universidades em colaboração – a Heriot-Watt University e a University of Edinburgh – e vai permitir que Henrique fique isento de propinas e receba cerca de 65 mil euros de financiamento para se focar no robot durante os próximos quatro anos.

Com uma breve passagem por Portugal em maio – não só para se focar na escrita da tese de mestrado mas para aproveitar a sua última Queima das Fitas (conta, sorrindo) – Henrique volta em setembro para Edimburgo para começar a próxima fase da sua vida académica: o doutoramento, sempre com o grande objetivo de levar Valquíria até Marte.

Curiosidade

Se na mitologia nórdica as Valquírias são entidades divinas, que servem Odin e que protegem os guerreiros, no caso do robot humanóide, acontece exatamente o contrário, ela é protegida por humanos.